Mudar a forma como olhamos para os políticos? Vai haver uma app para isso

Nem todos podem ser deputados à Assembleia da República, mas com um smartphone e uma nova aplicação recentemente disponível no mercado, todos podem votar nas iniciativas que são discutidas no parlamento. A ideia é informar os cidadãos e aproximá-los da política. E dos políticos.
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E se pudesse estar sempre atento à agenda da Assembleia da República de forma prática e descomplicada? E se pudesse votar nos projetos-lei em discussão no parlamento, saber o que cada deputado disse sobre cada assunto e, ao fim do dia, comparar os votos dos parlamentares com as suas próprias escolhas? Saber quem votou ao seu lado, quem se absteve, quem votou no sentido oposto.

É isso - não só, mas também - que já pode agora fazer graças ao meuParlamento.pt. A aplicação, desenvolvida por três investigadores do Porto, venceu a segunda edição do prémio Arquivo.pt, promovido pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) para projetos que recorram à informação histórica preservada online - neste caso, as iniciativas legislativas levadas a cabo na Assembleia da República no passado.

Por enquanto apenas se pode utilizar o meuParlamento.pt para consultar medidas discutidas na Assembleia da República em anos anteriores, saber como votaram os deputados, que argumentos usaram e que propostas estiveram em cima da mesa. "Nós nem nos lembramos nem sabemos o que foi decidido na semana passada, quanto mais no ano passado" diz Nuno Moniz, coordenador do projeto. "Mas desta forma podemos recordar. E ficar a saber mais. E aproximarmo-nos do que se decide e de quem decide."

Os investigadores, porém, não pretendem ficar por aqui. "Em setembro queremos começar a trabalhar em tempo real. Para que a pessoa depois de almoço possa receber uma notificação que diga "isto vai ser votado hoje à tarde. Como votaria?" Depois, no final do dia, recebe o resultado final e fica a saber quem foram os deputados que votaram como se fosse o próprio." E recebe também, esperam os investigadores, o diálogo, as intervenções, etc. Para o professor da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e especialista em inteligência artificial, esta é uma nova forma de lidar com o parlamento e com a política. E, por conseguinte, pode ser uma nova forma de participação cívica, uma maneira diferente de exercer a cidadania. "No futuro queremos que seja possível, através da aplicação, que as pessoas enviem e-mails aos autores das propostas."

Num tempo de fake news, com a ascensão do discurso populista, a informação abordada de forma superficial e um grande divórcio entre cidadãos e políticos, uma aplicação com estas características poderá ajudar a conter esta separação, contribuindo para uma melhor informação dos primeiros e uma maior responsabilização dos segundos. É pelo menos essa a esperança de Nuno Moniz, Arian Pasquali e Tomás Amaro. "Desenvolvemos esta ideia com o objetivo de aproximar os cidadãos das decisões tomadas no Parlamento e de dar a conhecer toda a informação necessária para contextualizar esses dados", escreveram os autores na descrição sumária do projeto candidato aos prémios Arquivo.pt. Se tudo correr bem em Portugal, esperam depois internacionalizar o modelo para estar disponível noutros países e associado a outros parlamentos nacionais.

Com o primeiro lugar alcançado na iniciativa, os criadores da aplicação, já disponível na AppStore (iOS) e na PlayStore (Android), receberam dez mil euros que vão utilizar para redesign e para suportar custos de estrutura. A cerimónia de entrega dos prémios (pela mão do primeiro ministro António Costa) decorreu na segunda-feira no Centro de Congressos de Lisboa, inserida no Ciência 2019, o encontro anual de investigadores portugueses.

O prémio Arquivo.pt foi lançado no ano passado, para promover o site com o mesmo nome, da responsabilidade da FCT. Foram recebidas 24 candidaturas elegíveis, de áreas tão distintas como tecnologia, saúde, comunicação, design, política ou cidadania. Depois de pré-analisadas por um grupo de peritos, coube ao júri do prémio - constituído por Teresa Salema (presidente da Fundação Portuguesa das Comunicações), Sandra Isabel Correia (empresária), João Castro (diretor do Digital Business Knowledge da Nova SBE) e Paulo Farinha (chefe de redação da DN Ócio e DN Life) - eleger os três projetos vencedores: além do meuParlamento.pt, foram também premiados o Revisionista, um site que permite identificar as sucessivas alterações feitas a artigos de comunicação social publicados na internet (da autoria de Flávio Martins e André Mourão, investigadores da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa); e um levantamento de discursos públicos sobre violência em privado e o seu tratamento na comunicação social (da autoria da psicóloga Zélia de Macedo Teixeira). As candidaturas para a edição de 2020 do prémio Arquivo.pt - abertas ao público em geral - arrancam oficialmente no dia 2 de janeiro e terminam na primeira semana de maio. O primeiro classificado recebe.

Arquivo.pt: preservar agora para consultar depois

Com gigabytes de páginas armazenadas, algumas datadas de 1996, o Arquivo.pt foi lançado em 2008 e procura preservar a memória web em Portugal, para garantir que a informação não se perde num mundo tão rápido e efémero - ao contrário do que habitualmente acontece com oitenta por cento dos conteúdos que estão online. "Os utilizadores podem fazer verdadeiras viagens no tempo e ter a perspetiva do que se falava num determinado momento da nossa história recente, até pela leitura das caixas de comentários da época", diz João Gomes, Diretor Área de Serviços Avançados da FCT. O arquivo.pt armazena milhares de sites portugueses que já não estão online atualmente, garantindo a preservação da memória web nacional para consulta de investigadores académicos, empresários, curiosos e público em geral. Saiba mais aqui.

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