Realidade virtual pode ajudar toxicodependentes a reduzir consumo. Há 55 novas drogas na Europa
Recriar ambientes virtuais de consumo de droga de forma a ensinar os consumidores a combater a vontade e usar o sistema de geolocalização para ajudar quem consome a encontrar postos de troca de seringas. Estas são duas propostas do Observatório Europeu da Droga e Toxicodependência (EMCDDA) apresentadas esta manhã e que podem ajudar os serviços de saúde a lidar com os problemas relacionados com a droga.
No seu Relatório Europeu sobre Drogas 2019: Tendências e Evoluções divulgado esta quinta-feira em Bruxelas, o EMCDDA chama também a atenção para o aumento do tráfico e o consumo de cocaína no continente europeu tal como o facto de o consumo de heroína estar a provocar uma subida do número de pessoas a necessitar de tratamento.
Outro dos pontos que merece realce no documento é o cada vez maior número de novas substâncias psicoativas (NSP) que o Observatório tem detetado: no ano passado foram 55, o que eleva para 730 as NSP que esta entidade monitoriza. São ainda divulgadas estatísticas que indicam a apreensão de mais de um milhão de drogas ilícitas anualmente, que 96 milhões de adultos (dos 15 aos 64 anos) no conjunto dos países da União Europeia, mais a Turquia e a Noruega, já experimentaram uma droga ilegal ao longo da vida e que cerca de 1,2 milhões de pessoas recebem anualmente tratamento por problemas relacionados com o consumo de estupefacientes.
Citado no documento, o Comissário Europeu responsável pela Migração, Assuntos Interno e Cidadania, Dimitris Avramopoulos, refere que este documento "mostra a natureza complexa do fenómeno da droga na Europa. As drogas continuam a ser uma ameaça multifacetada e em constante evolução".
O tráfico e consumo de cocaína continuam a ser um dos grandes problemas nesta área a nível europeu e apesar de as apreensões continuarem a subir - em 2017 foram reportadas 104 mil apreensões, correspondendo a 140,4 toneladas) quando em 2016 tinham sido 98 mil (70,9 toneladas) - esta droga está cada vez mais disponível e em melhor qualidade.
A justificar tal oferta estão as vendas e compras através das redes sociais, na darknet e as novas tendências de mercado com a implementação de call centers que dispõem de estafetas para entregar rapidamente a droga encomendada por telefone.
À subida do consumo - as estimativas apontam para 2,6 milhões de jovens adultos (15-34 anos) - está associado o aumento de pessoas a necessitar tratamento com os dados mais recentes a indicarem uma média anual de 73 mil toxicodependentes a iniciarem tratamento por ano.
De acordo com o relatório o opiáceo mais comum no mercado Europeu ainda é a heroína. A prová-lo está o facto de as autoridades policias europeias terem apreendido 5,4 toneladas deste estupefaciente em 2017 - a que se deve juntar as 17,4 toneladas detetadas na Turquia.
Entre os alertas deixados no documento está a preocupação com o possível aumento do consumo de opiáceos - já uma epidemia nos EUA e Canadá - em particular dos sintéticos como o fentanilo [opioide que é utilizado como uma medicação para a dor] e os seus derivados. É, todavia, frisado que na Europa esta questão ainda não é de molde a preocupar as autoridades. Apesar de os derivados de fentanilo serem a maioria dos 49 novos opiáceos sintéticos monitorizados pelo EMCDDA.
No ano passado manteve-se a liderança da canábis como a droga mais consumida na Europa, produto que também está a obrigar os países a uma adaptação ao mercado do tráfico. "A criação de mercados legais de canábis para consumo recreativo fora da UE está a impulsionar a inovação em termos de desenvolvimento do produto (por exemplo e-líquidos, produtos comestíveis e concentrados) alguns dos quais começam a surgir no mercado europeu, onde colocam novos desafios em matéria de deteção e controlo de drogas", sublinha-se no Relatório Europeu sobre Drogas 2019: Tendências e Evoluções. Documento onde se reconhece o papel cada vez mais preponderante da Europa na produção de drogas sintéticas, nomeadamente de metanfetaminas, na República Checa e países vizinhos.
O relatório do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência defende ainda o recurso às novas tecnologias como forma de ajudar os consumidores. Defende o documento que as aplicações móveis podem ser usadas com o objetivo de divulgar informação e de ajuda à recuperação (com aplicações de autoajuda). Um outro exemplo apresentado é a utilização da geolocalização para ajudar os consumidores de drogas injetáveis a encontrar pontos de troca de seringas.
É ainda explicado que está a ser estudado "o uso de tecnologias de realidade virtual (óculos de realidade virtual) para recriar ambientes relacionados com o consumo de drogas, com vista a induzir o desejo de consumir e ensinar os doentes a combater esse desejo".
A aposta nas novas tecnologias, ainda deficiente, tem como "alvo" os jovens, reconhece o Observatório: "Um grande número de aplicações de saúde móvel desenvolvidas na Europa centra-se na divulgação de informações sobre a redução de danos dirigidas aos jovens utilizadores, em particular aos que frequentam festas. Embora atualmente estejam disponíveis muitas aplicações de saúde móvel, um estudo recente do EMCDDA concluiu que muitas têm padrões de qualidade deficiente e suscitam preocupações relativamente à proteção de dados e à avaliação", conclui.