Sete faculdades privadas vão fechar: "O Instituto é a nossa casa, a nossa família"

À preocupação dos alunos de verem a sua faculdade encerrada compulsivamente e às incertezas quanto ao futuro, junta-se outra realidade: o facto de gostarem muito do ambiente do Instituto Superior de Comunicação Empresarial e do tipo de ensino prático e de proximidade com os professores. Ao todo, já há sete instituições que não tiveram acreditação para abrir
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Foi uma noite praticamente em claro a trocar mensagens num grupo do WhatsApp: quase às duas da manhã de segunda-feira os alunos do Instituto Superior de Comunicação Empresarial (ISCEM) receberam um mail da proprietária, Regina Campos Moreira, a dizer que a faculdade não reabriria em setembro, por ordem do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior por não cumprir vários requisitos legais, nomeadamente a qualidade do corpo docente.

Para alguns alunos foi uma surpresa total - desconheciam por completo que há cerca de um ano o ISCEM já tinha sido reprovado pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), mas continuou de portas abertas porque houve recurso da instituição e uma providência cautelar que entretanto foi julgada improcedente.

Para outros, era a confirmação de uns zum-zuns que se iam ouvindo nos corredores - "O ISCEM vai fechar" - mas que foram esquecidos quando a direção foi assumida há uns meses por Natália Teixeira, que substituiu Regina Moreira nestas funções.

Foi "estranho" receber um email quase às duas da manhã a dar conta do encerramento compulsivo da faculdade, sobretudo para quem já está no segundo ano do curso de Comunicação Empresarial e garante que escolheu o ISCEM porque lhe agradava a sua reputação e ensino de excelência - "basta fazer uma pesquisa e ver as pessoas que já formou".

António (nome fictício porque a maioria dos estudantes combinou não se identificar até haver informação mais concreta sobre o futuro dos alunos) conta que até podia ter ido para uma pública, garante que tinha nota para isso, mas preferiu aquela faculdade privada - onde paga cerca de 370 euros mensais - porque se diz testemunha da qualidade e do tipo de ensino que permite uma grande proximidade entre os alunos e os professores.

"Estou preparado para enfrentar as questões do marketing e de e gestão e isso deve-se ao profissionalismo dos professores", exemplifica.


Mas apesar de tudo, das críticas positivas que faz ao ISCEM, este estudante de 21 anos entende que seria importante haver algo escrito, algo mais concreto, sobre o que os espera. "Importa salvaguardar os nossos direitos", refere, acrescentado que "a quem compete devia dar certezas aos alunos".

"Queremos é estudar e concluir a nossa formação. Estamos em julho e o ano letivo começa em setembro." Uma nota do ministério de Manuel Heitor refere que estão a ser desenvolvidos contactos com o Institutos Politécnico de Lisboa e de Setúbal para receberem os alunos do ISCEM. O ISCTE também estará a entrar nesta equação.

Faculdades que vão fechar ainda à espera do despacho

Foram vários os alunos que se deslocaram ao edifício do Príncipe Real, em Lisboa, onde funciona o ISCEM. E para alguns "foi reconfortante" ter os funcionários a recebê-los, a responder às dúvidas com a informação que detinham - e que passa sobretudo pelo facto do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior garantir lugar a cada aluno em cursos ministrados por estabelecimento de ensino superior públicos, conforme estabelece a lei em caso de encerramentos compulsivos.

No entanto, as instituições que não receberam acreditação da A3ES ainda não foram notificadas com o despacho ministerial de encerramento. Além do ISCEM, o DN noticiou segunda-feira o fecho da ESTAL - Escola Superior de Tecnologias e Artes de Lisboa. O Observador noticia esta terça-feira que estão na calha mais cinco encerramentos compulsivos, já confirmados ao DN pela A3ES: a Escola Superior de Educação Jean Piaget e o Conservatório Superior de Música (ambos em Gaia), a Escola Superior de Educação Almeida Garrett, a Escola Superior Artística de Guimarães e o Instituto Superior de Novas Profissões, em Lisboa.

Destas, segundo o jornal Público, quatro vão continuar a funcionar por mais dois anos, para permitir aos respetivos alunos terminarem os cursos: são elas o Instituto Superior de Novas Profissões e a Escola Superior de Educação Almeida Garrett, em Lisboa, a Escola Superior de Educação Jean Piaget de Arcozelo, em Vila Nova de Gaia, e a Escola Superior Artística de Guimarães.

A perspetiva de ir frequentar uma universidade pública - com a poupança que isso acarreta por deixar de pagar cerca de 370 euros de mensalidade - não entusiasma António. À pergunta "preferia ficar no ISCEM?" responde: "São ensinos diferentes. Aqui temos mais proximidade, mais contacto com as empresas, através dos ateliers e dos estágios.

Quando viu o mail a dizer que a sua vida de estudante poderia sofrer uma reviravolta, Manuel (também nome fictício), ao princípio, nem acreditou. A mudança de diretora tinha trazido uma lufada de ar fresco ao instituto. E garante que, ao contrário do que refere a Agência de Acreditação, "nada se pode apontar ao corpo docente" "Os professores ajudam-nos imenso, temos os contactos deles, dão-nos ajuda para os estágios, para os empregos..."

Manuel, aluno de Comunicação Empresarial, valoriza sobretudo o ambiente do ISCEM. "A faculdade é ótima, é uma família. O ISCEM é a nossa casa. A prova disso foi o que aconteceu esta segunda-feira, em que os telefones estavam todos a tocar e toda a gente, funcionários, alunos e professores, atenderam as chamadas a dar a informação disponível", adianta.

Houve um momento de grande emoção, a chegada da diretora, Natália Teixeira, que tentou tranquilizar toda a gente, mas que acabaria a chorar. "Toda a gente a abraçou e lhe disse que ela não tem culpa nenhuma, que se matou a trabalhar". As palavras de Manuel já não são tão simpáticas quando fala da presidente e proprietária do ISCEM: "À dra Regina Moreira podem pô-la no lixo. O problema está nela, que só quer encher os bolsos, não nos professores."

Ao contrário de António, Manuel não tinha nota para entrar numa pública. A possibilidade de ser agora colocado na Escola Superior de Comunicação do Politécnico de Lisboa causa-lhe uma dualidade de emoções: por um lado é a faculdade com que sempre sonhou, mas, por outro, apaixonou-se pelo ISCEM, pelo ambiente que ali se vive e pelo ensino prático que, diz, o prepara melhor para o mundo laboral.

O facto de poder a vir poupar cerca de 3000 euros em propinas anuais deixa-o satisfeito, não nega. "Não sou um menino mimado, trabalho todos os dias para pagar este balúrdio, mas sei que vou sair do ISCEM." E isso entristece-o e muito.

Rodrigo (nome fictício) também faz questão de destacar o modelo de ensino. "É brutal, é diferente, é prático, de grande proximidade." Mais: "O ambiente do ISCEM é único, fantástico, é quase uma família."

Razões para o encerramento compulsivo

Nas várias motivos que levaram a Agência de Acreditação do Ensino Superior a não acreditar o ISCEM está o facto de várias funções serem desempenhadas pela mesma pessoa - desde a presidência da entidade instituidora até à direção, presidência do Conselho Técnico-Científico e presidência do Conselho Pedagógico. Esta situação, garantem os alunos, foi alterada com a subida de Natália Teixeira à direção.

O corpo docente é um dos principais problemas apontados ao Instituto Superior de Comunicação Empresarial. Além da carga horária elevada, a A3ES diz que dos 22 docentes, apenas apenas seis estão a tempo integral e destes, apenas três são doutorados, nenhum em Marketing, área científica em que se situam os quatro ciclos de estudos oferecidos pelo instituto".

Quanto à política de recrutamento de novos alunos, é referido que se resume ao "passa palavra". É dado o exemplo dos mestrados, com apenas quatro alunos, "um dos maiores constrangimentos do ISCEM".

A A3ES também não identificou medidas de combate ao abandono e ao insucesso escolar.

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