Crianças e Jovens. Só em 2018 foram comunicadas mais de 39 mil situações de perigo
O retrato está feito. E não é bonito, apesar de ser um pouco menos grave do que em 2017. Mesmo assim, mais de 39 mil crianças foram sinalizadas em situação de perigo em 2018. As situações mais graves dizem respeito a negligência, 31,2%, e a violência doméstica, 22,7%.
De acordo com a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção da Criança e Jovens (CNPDPCJ) o número de situações de crianças em perigo tem-se mantido estável nos últimos três anos, mas "é preciso não esquecer que nos últimos dez anos o número de comunicações de situações de perigo aumentou 25%. Ao todo, mais de 10 mil.
O ano de 2018 foi aquele em que, segundo o relatório de atividade da CNPDPCJ, se registou um aumento de situações de abandono. De acordo com o documento, publicado a 22 de maio, deste universo de 39 053 situações de perigo, 1,4% tiveram como motivo o abandono. Ou seja, mais de 500 situações, sendo que pelo menos dez visavam bebés ou recém-nascidos.
O abandono volta a preocupar a sociedade portuguesa, sobretudo depois de ter sido divulgado o caso do bebé recém-nascido deixado num caixote do lixo na Av. Infante D. Henrique, em Lisboa, junto à discoteca Lux-Frágil.
A criança, do sexo masculino, foi levada para o Hospital D. Estefânia pelos técnicos do INEM que o recolheram, onde está internado, aguardando agora a decisão do tribunal sobre o seu encaminhamento. O Ministério Público abriu um inquérito e a Polícia Judiciária investiga para se tentar chegar ao paradeiro da progenitora.
Segundo afirmou ao DN Dulce Rocha, presidente do Instituto de Apoio à Criança (IAC), as situações de abandono estão normalmente associadas à pobreza, isolamento e desespero. E nalgumas trata-se mesmo de um padrão de repetição: o agente que abandona também já viveu o abandono. Perante a sociedade civil e a lei não há desculpabilização. O abandono pode configurar um crime punido pelo código penal de um a cinco anos de prisão.
O certo é que, anualmente, continuam a ser muitas as crianças que veem os seus direitos violados pelos próprios progenitores e familiares. O relatório CNPDPCJ regista 39 053 situações de perigo comunicadas, menos 240 do que no ano anterior, e a maioria referente a crianças e jovens do sexo masculino, 21 138 (54 % do total). O sexo feminino registou 17 915 situações (46 %).
O escalão etário mais representado é o dos 11-14 anos, que corresponde a 24,6 % do total, seguido do escalão dos 15-17 anos (24,4 %). As comunicações de perigo referente a crianças dos 0-5 anos representam 22,2 % do total.
De acordo com a Convenção sobre os Direitos da Criança da ONU, que a 21 deste mês faz 30 anos, cabe aos Estados protegerem as crianças contra todas as formas de maus-tratos exercidas sobre elas. Em Portugal, essa responsabilidade é obrigação de toda a sociedade, qualquer pessoa que tenha conhecimento de uma criança exposta a uma situação de perigo deve comunicá-la.