Tolerância

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A proibição do véu islâmico nas escolas francesas e, mais recentemente, os assassinatos na Holanda de personalidades críticas do Islão e a colocação fora da lei de um partido extremista de direita na Bélgica trouxeram para a ribalta a velha questão da tolerância face a quem não partilha dos nossos valores - a começar pela própria tolerância. Em breve teremos esse problema entre nós.

Sempre se debateu até que ponto se pode dar liberdade aos inimigos da liberdade. Hitler chegou ao poder através de eleições - e depois acabou com elas. Mas há um novo risco. Se os fundamentalistas islâmicos querem destruir a nossa civilização, estaremos afinal a fazer--lhes a vontade violando, nós próprios, valores de liberdade, tole- rância e respeito pelos direitos humanos, para nos defendermos dessa ameaça. É o caso do tratamento dos suspeitos de terrorismo pelos americanos.

E há a novidade das sociedades multiculturais, que cada vez mais são as nossas na Europa. Respeitar as pessoas implica, também, respeitar as culturas que, em alguma medida, constituem a identidade dessas pessoas. Há uma dimensão colectiva na identidade individual. Não é solução forçar comunidades de outras culturas que vivem nas nossas sociedades a serem iguais a nós. O que fazer, porém, quando essas culturas são antiliberais, anti-pluralistas e, no seu interior, não respeitam a autonomia pessoal? Os liberais que defendem o Estado neutro face às várias concepções de vida ficam aqui desarmados. Contra o relativismo ético e cultural, importa lembrar que não podemos abdicar de alguns princípios substantivos, e não apenas processuais, da nossa cultura, por muito que nos acusem de eurocentrismo ou de imperialismo cultural. A tolerância é algo excelente, mas tem limites. Não há Estados neutros.

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