Scolari

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Não é preciso utilizar muitas palavras para sublinhar as paixões que o futebol mobiliza em boa parte do mundo. O futebol é capaz de quase tudo: alegria sem par, desilusões traumáticas, irracionalidades de gestão, mobilizações nacionais que a política ou a cultura raramente conseguem, popularidade de verdadeiros heróis, mas também violência incontrolável, às vezes trágica. Não admira pois que a hipótese de Luiz Felipe Scolari escolher outro destino para a sua carreira tenha motivado tamanha agitação neste país de futebol.

Scolari chegou a Portugal com uma aura inultrapassável. Tinha sido campeão do mundo com o Brasil e vinha desafiado a fazer do Euro 2004 uma festa portuguesa. O país discutia o preço dos estádios, duvidava da capacidade para os construir a tempo e duvidava ainda mais da sua utilidade futura. Duvidava enquanto não os construía. Depois acreditou que podia ser campeão. E quase foi. O brasileiro Scolari afirmou-se não só como líder de uma equipa de futebol que jogou o campeonato do primeiro ao último minuto, mas também como condutor ímpar de massas lusas. Basta lembrar as bandeiras nacionais que se agitaram de norte a sul e a empatia social que resistiu às suas mais polémicas decisões e declarações.

O profissional Scolari tem um contrato que termina no final do Mundial da Alemanha. Sem sinais de futuro por parte da sua empregadora Federação Portuguesa de Futebol, fez contas à vida e pensou em garantir desde já a continuação da sua carreira em Inglaterra. Legítimo para um assalariado, insuportável para as hostes de um país que já se imaginava a ser treinado por um homem comprometido com um adversário.

Não é difícil perceber que este gaúcho bem-disposto que se apegou a Portugal, que gosta da nossa comida e dos muitos dias de sol, prefira continuar entre nós. Scolari não tem que prestar provas para justificar um novo contrato. Se os ingleses o procuram antes de saber do seu sucesso ou insucesso no próximo Mundial, porque é que a Federação Portuguesa não pode definir-se desde já?

Nem que seja para apaziguar as hostes, Scolari e Madaíl fizeram bem em aproximar posições. As emoções deste Portugal de futebol não suportam hesitações e "traições", por mais legítimas que sejam. Qual insegurança social, qual crise, é o futebol que nos move. Mais dia menos dia, como dizia Millôr Fernandes, quem sabe se o milagre brasileiro não chega até nós: "Um país todo de jogadores e técnicos de futebol..."

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