Liberdade

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Nestes dias em que 16 jornalistas se sentam no banco dos réus devido a um incompreensível processo, mais se en-tende como está o jornalismo debaixo de fogo cerrado.

A recente aprovação da proposta governamental para alteração do Esta-tuto do Jornalista, com os votos favoráveis do PCP e BE e a oposição do PSD, veio agravar de forma insustentável os mecanismos de escrutínio administrativo sobre os jornalistas.

Os jornalistas não estão acima da lei, mas já respondem disciplinarmente perante a respectiva autoridade patronal, perante os tribunais em termos cíveis e penais, são escrutinados pelo mercado, são fiscalizados pela Entidade Regula- dora da Comunicação, e pela lei penal em matéria de violação do segredo de justiça. Agora, como se faltasse uma cerejinha no topo do bolo, a Comissão da Carteira Profissional vai também ficar com incomensuráveis poderes disciplinares.

Nos termos do Estatuto, a Comissão da Carteira vai constituir-se como uma espécie de "superpolícia" de todo o jornalismo que se pretenda mais investigativo, podendo, em função de queixa ou de acção própria, aplicar multas entre os 100 e os 10 mil euros. Do que estamos a falar? De uma enorme latitude interpretativa em relação a algumas das faltas que já são escrutinadas pelos tribunais, como por exemplo o formular de acusações sem provas e o não respeito pela presunção de inocência. Uma violação deste princípio já pode ser fortemente punida pelos tribunais, mas ao acrescentar-lhe uma coima que pode ir até aos 10 mil euros o Governo está a criar um expediente duplamente punitivo, arremessável contra um jornalista por pura e fácil manipulação da lei. A partir de agora, quem se queira atirar a um jornalista pode fazê-lo da seguinte forma: massacrando com exigência de direito de resposta e ameaçando com participações à Entidade Reguladora; apresentando queixa na Comissão da Carteira e, ao mesmo tempo, nos tribunais. No fim, a soma das multas pode ser esmagadora, com dezenas de idas a tribunal, à comissão, à entidade, os requerimentos, as declarações, os interrogatórios, as videoconferências infinitas e nula a vontade de fazer um jornalismo que não seja de pura transcrição do que debitam as imensas fontes organizadas. Se há combate que os jornalistas deviam abraçar, é este. Se há causa que justifica uma defesa acérrima da liberdade de expressão e informação, é esta. Mas não é assim, já que o ruído que predomina é o do silêncio...

Esta direcção editorial encerra hoje uma etapa na vida do DN. Sai com a consciência imodesta de ter contribuído para acrescentar qualidade e credibilidade ao jornal. Aos leitores, a quem se destinou este trabalho, o nosso agradecimento.

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