Insucesso escolar
O que é o défice de atenção?
O défice de atenção corresponde à incapacidade de um indivíduo se manter atento ou concentrado numa tarefa ou actividade (como, por exemplo, estudar), expresso por alguns dos seguintes comportamentos: frequentemente, não prestam atenção aos pormenores e cometem erros na escola ou em outras actividades por desatenção ou descuido; têm dificuldade em manter a atenção durante as tarefas ou jogos; muitas vezes, parecem não ouvir o que se lhes diz, mesmo quando interpelados de uma forma directa; com frequência, não seguem instruções e não terminam os trabalhos escolares, as tarefas caseiras ou os deveres profissionais (a causa não é um comportamento opositivo ou a incompreensão das instruções); poderão ter uma manifesta dificuldade na organização de tarefas e de actividades; frequentemente evitam, não gostam ou são relutantes em iniciar tarefas que requeiram concentração (como trabalhos escolares, em casa ou na escola); muitas vezes, perdem objectos importantes ou imprescindíveis a um adequado desempenho em tarefas ou em jogos (brinquedos, livros, material escolar); não raras vezes distraem-se facilmente com estímulos desinteressantes e irrelevantes; amiúde esquecem-se de executar as tarefas diárias comuns que tinham assumido realizar.
Como se faz o diagnóstico?
O défice de atenção é uma perturbação comportamental. O diagnóstico só poderá ser formulado por um médico: pediatra, pediatra do desenvolvimento, neuropediatra, pedopsiquiatra ou, nos casos de adultos, pelo psiquiatra ou neurologista. O diagnóstico é estritamente clínico, isto é, baseado numa interpretação e valorização dos sintomas e sinais, embora possa ter utilidade a realização de determinados testes ou instrumentos afins.
A que sinais pais e professores devem estar atentos?
Os pais e professores devem estar atentos a manifestações subjectivas de défice de atenção (a criança está muito desatenta, «sempre no ar»; e sobretudo às consequências do défice de atenção - dificuldades de aprendizagem, insucesso escolar, comportamentos potencialmente perigosos como atravessar descuidadamente uma rua ou deixar o fogão aceso).
Tem cura? Qual é o tratamento?
Numa larga maioria dos casos há uma evolução positiva, muito embora possam persistir manifestações residuais. A terapêutica assenta, basicamente, na prescrição de um fármaco – o metilfenidato [ver caixa] – e em programas estruturados para o controlo da atenção, a executar nos diversos ambientes em que o défice de atenção se manifesta: domicílio, escola, associação recreativa.
Que efeitos tem na vida escolar, social e familiar da criança?
O efeito mais comum na vida das crianças e adolescentes é o insucesso escolar («a criança embora esteja fisicamente dentro da sala de aula, na realidade não está lá com a cabeça»). O défice de atenção é, pois, uma causa importantíssima de insucesso escolar, não motivado por dificuldades cognitivas e é facilmente resolúvel. Na etiologia do insucesso escolar, expresso pela adopção de medidas especiais no âmbito da educação, que podem chegar, entre outras opções, à retenção no mesmo ano da escolaridade, e, consequentemente, a um ciclo vicioso de insucesso pessoal e social, contam-se inúmeras variáveis, incluídas, por questões de ordem prática, em quatro grandes grupos:
> variáveis orgânicas (por exemplo, a anemia, o hipotiroidismo, o saturnismo, as doenças genéticas, as doenças crónicas do foro cardíaco, reumatológico, hematológico, neurológico, pneumológico, gastrenterológico, endocrinológico;
> variáveis desenvolvimentais (por exemplo, o défice de atenção, as perturbações específicas da linguagem, o estado-limite do funcionamento cognitivo, as perturbações do espectro do autismo, as perturbações específicas da aprendizagem (que correspondem a défices cognitivos específicos), como a dislexia, a disgrafia e a discalculia, as perturbações da coordenação motora);
> variáveis comportamentais e emocionais (por exemplo, a ansiedade, o humor deprimido, a irrequietude excessiva, a impulsividade, as alterações do sono, as perturbações da relação, as perturbações do comportamento alimentar, as perturbações de oposição e da conduta);
> variáveis familiares, escolares, sociais e culturais (por exemplo, o baixo índice sociocultural, a pobreza, as baixas expectativas educativas, a inadequação pedagógica).
Escolas, famílias e instituições de saúde estão preparadas parta detectar e lidar com o défice de atenção?
A preparação dos pais e dos diferentes agentes educativos é muito variável. Há locais do país onde todos estão muito atentos (é o caso da região das Caldas da Rainha, fruto de uma boa formação e divulgação da perturbação) e há outras onde se desconhece, de todo, a problemática.
As crianças que sofrem de défice de atenção podem ter uma vida «normal»?
Se o défice de atenção for tratado correctamente, podem ter uma vida absolutamente normal e com sucesso pessoal, escolar e profissional.
Em Portugal, quantas pessoas sofrem de défice de atenção?
Não há estatísticas sobre esta perturbação no nosso país. Relativamente ao défice de atenção gerador de problemas significativos, os números internacionais apontam para uma prevalência nas idades pediátricas superior a cinco por cento.
O QUE É A ATENÇÃO?
Atenção é a capacidade cognitiva complexa de seleccionar e de focalizar um estímulo sensorial particular num dado momento. Se não fosse essa capacidade selectiva da atenção, a quantidade de informações não seleccionadas seria tão grande e desorganizada, que nenhuma actividade se tornaria possível. A atenção deverá permitir a capacidade de reagir aos estímulos do meio; a capacidade de sustentar o foco da consciência nesse determinado estímulo, enquanto isso é necessário em face de um determinado fim; a capacidade de filtrar outros estímulos simultâneos e perturbadores, por serem menos significativos; a capacidade de dividir o foco da consciência de tal forma a manter-se receptivo a outros estímulos igualmente significativos;
a capacidade de remover o foco de um determinado estímulo quando surge outro mais significativo.
O QUE É O METILFENIDATO?
É um fármaco psicoestimulante, do grupo das anfetaminas, que actua ao nível do sistema nervoso central, aumentando a atenção e a concentração e reduzindo os comportamentos impulsivos.
É uma substância utilizada há mais de sessenta anos com eficácia cientificamente comprovada nos casos de défice de atenção.
O metilfenidato é um potente inibidor da recaptação de alguns neurotransmissores (como a dopamina) ao nível do cérebro. As crianças com défice de atenção têm uma diminuição da dopamina cerebral. O metilfenidato repõe os seus valores, para que as células responsáveis pela concentração possam funcionar. Desta forma, o fármaco eleva o nível de alerta do sistema nervoso central e incrementa os mecanismos excitatórios do cérebro resultando numa melhor concentração.
Efeitos secundários
A toma de metilfenidato pode ter efeitos secundários. A redução de apetite e a insónia são os principais efeitos colaterais desta substância. Salientam-se, também, dores abdominais e de cabeça, que desaparecem habitualmente após a primeira ou segunda semana de terapêutica. Algumas crianças podem ficar excessivamente sonolentas e outras mais irrequietas ou irritáveis. O ajustamento da dose diminui estes sintomas. Não estão descritos efeitos secundários a longo prazo que possam ser atribuídos ao medicamento (nomeadamente ao nível do crescimento).
Sabe-se, actualmente, que em crianças e adolescentes com perturbação de hiperactividade e défice de atenção existe um maior risco de ocorrência de problemas de abuso/dependência de drogas, sobretudo no final da adolescência. No entanto, está demonstrado que, quando eficazmente tratados, designadamente com metilfenidato, o número de casos de abusos de substâncias e de comportamentos anti-sociais destes jovens diminui, já que os mesmos poderão abandonar o círculo vicioso de insucesso e de problemas pessoais, familiares, escolares e sociais.
O metilfenidato não provoca dependência.
Eficácia do tratamento
É o fármaco mais eficaz no tratamento do défice de atenção, alcançando oitenta por cento de sucesso. Na maioria dos casos, é utilizado em crianças em idade escolar, mas é eficaz em todas as idades. O medicamento pode ser suspenso em qualquer altura sem necessidade de redução da dose. Existem vários nomes comerciais para esta substância química.