Imigrantes
O receio das diásporas, seja de que origem for, é uma realidade perene. Mesmo quando o mundo perdeu dimensão e se reduziu à aldeia global. Hoje, a cultura dominante é global, procura dissolver diferenças e identidades, mas está ainda longe de ter imposto uma uniformização.
O mundo vive numa espécie de convite permanente à comunhão, uma espécie de "united colors" em que tudo se compra e vende, mas nem por isso o imigrante deixa de ser visto como inimigo, uma ameaça. O imigrante é, regra geral, um mal necessário, alguém que resiste à assimilação e que, no presente ou no futuro, quererá "roubar" empregos ou minar a solidariedade nacional. Mesmo que o imigrante se ocupe quase tão-só daquilo que os nacionais não querem fazer... Legais ou ilegais, os imigrantes são imprescindíveis, mas nem por isso desejáveis.
As nossas sociedades envelheceram, já lá vai o babyboom e os especialistas reflectem agora sobre o alcance do seniorenboom. Falta juventude na Europa Ocidental e nos EUA e faltam ainda mais oportunidades de trabalho para uma imensa massa humana que na América Latina ou em África luta pela sobrevivência. O desequilíbrio global é evidente e antigo. As gerações de imigrantes não se integraram suficientemente nos novos mundos. O multiculturalismo, uma espécie de tapete colorido em que cada identidade convivia harmoniosamente em fatias paralelas, não passou de uma ilusão. Culturas e etnias nem sempre se toleram, por vezes interpenetram-se, mas tendem a acantonar-se em guetos explosivos. Desemprego e terrorismo apenas têm acentuado as dificuldades de integração.
O Senado dos EUA vai recomeçar a discussão das leis da imigração. No horizonte está a ameaça de uma greve geral no dia 1 de Maio. Num país moldado e construído por imigrantes europeus tenta--se agora pôr ordem no fluxo migratório hispânico. Todos os anos entram ilegalmente nos EUA, através da fronteira com o México, mais de meio milhão de ávidos de bem-estar que se juntam aos quase 12 milhões de indocumentados. Expulsar milhões de ilegais ou penalizar outros tantos durante os próximos anos introduziu na América uma clivagem que põe a nu um mal-estar que o 11 de Setembro aprofundou.
A marcha da globalização é contraditória: tanto aproxima como separa, destrói fronteiras e levanta barreiras. Bush quer construir um muro com 1120 quilómetros na fronteira com o México.
De futuro, os fluxos migratórios para o Ocidente serão mais selectivos. A economia e a segurança a isso obrigam. Quotas, títulos de residência e passaportes entrarão em hasta pública. Não se vislumbra que a cidadania global seja o fim da História. Muitos continuarão imigrantes durante gerações. Diáspora ameaçada e ameaçadora. A colisão de identidades parece o destino permanente do Homem.