Coerência
José Sócrates não gostou que, em 24 de Novembro, eu tenha aqui considerado oportunista a sua oposição à descida do IRS, depois de o PS tanto haver criticado a obsessão do défice atribuída a Manuela Ferreira Leite. Como vêm aí eleições, Sócrates tem agora oportunidade para mostrar que fui injusto, anunciando as medidas que tomará, se for governo, para reduzir o défice das contas públicas.
Em primeiro lugar, claro, terá de anular a descida do IRS. Depois, e mais importante, deverá revelar onde vai cortar na despesa. É que, mesmo com a tal obsessão (o Orçamento de 2004 é de Ferreira Leite), a despesa corrente está a subir 6 %, muito mais do que o produto. E o PS fala de desorçamentação, logo o aumento real da despesa ainda é maior. Manter as Scut sem portagens não ajuda. O mesmo se diga de repor benefícios fiscais aos PPR (beneficiando sobretudo os bancos). Ou de incentivos para tudo, desde os bombeiros, artistas e escritores até investimentos no interior.
Ou será que o PS espera resolver o problema do défice pelo lado da receita fiscal? Se a economia portuguesa crescesse a 5 ou 6 % talvez fosse possível. Mas os próximos anos serão de crescimento lento, na melhor das hipóteses. E resta saber se J. Sócrates se empenhará mesmo na luta contra a fuga aos impostos, que Bagão Félix esboçou. Os socialistas costumam ser sensíveis aos lobbies económicos.
Aguardo com expectativa que o PS se mostre coerente com a preocupação orçamental manifestada antes da dissolução do Parlamento. Seria excelente para o país. Mas, para que os portugueses possam votar em consciência, Sócrates tem de dizer como vai baixar o défice sem vender património e quem o vai fazer - qual o nome do ministro das Finanças de um eventual governo do PS. Só assim será credível.