Vistos gold. Investidores pagam 500 mil euros e esperam três meses por reunião
Sindicato e advogados garantem que a entrada de estrangeiros interessados no programa está a ser bloqueada
Um estrangeiro que queira investir em Portugal ao abrigo do programa conhecido como vistos gold tem de esperar pelo menos três meses para conseguir ter uma reunião no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. E quando chegar esse momento já tem de ter efetuado um investimento de, no mínimo, 500 mil euros num imóvel, pois é uma das condições exigidas para poder pedir uma autorização de residência para atividade de investimento (ARI).
Uma situação que se agravou desde maio e que estará relacionada com o facto de o SEF não permitir com regularidade reservar vagas para os interessados entregarem os documentos necessários ao início do processo.

Os advogados ouvidos pelo DN garantiram que quando tentam agendar a ida aos serviços de Lisboa do SEF - o mais problemático do país - a resposta que ouvem na linha de atendimento é que "a agenda de novembro ainda não está aberta". Ou seja, até esse mês nenhum natural de um país fora da União Europeia que se mostre interessado em investir em Portugal conseguirá ser recebido para dar início ao processo de pedido de autorização de residência. E como todo o processo deve levar pelo menos mais três meses, pelo menos, nunca terá a autorização em menos de meio ano.
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Este tempo de espera é contestado pelos advogados e pelo Sindicato dos Funcionários do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Todos estão de acordo que a situação está relacionada com a falta de pessoal e com uma tentativa de o serviço "fazer crer que não há atrasos [no tratamento dos processos], pois não há marcações", disse ao DN Manuela Niza Ribeiro, presidente do sindicato, frisando que devem "existir uns quatro mil processos pendentes".
Esta dirigente garantiu que os problemas com os agendamentos começaram "há dois ou três meses". Por coincidência foi quando terminou o trabalho do Grupo Extraordinário de Recuperação de Pendências que "contribuiu para regular o processamento das ARI e das renovações", como frisou em resposta ao DN fonte oficial do SEF. Explicando que os inspetores que fizeram parte da equipa estão colocados "no aeroporto de Lisboa desde abril/junho".
Segundo dados do SEF, nos primeiros sete meses do ano (até 31 de julho) foram concedidas 1041 ARI e o valor do investimento foi de 656 226 116,72 euros, mais 14,8% do que os 57 1511 345,63 euros registados em igual período de 2016. No mês passado, o investimento resultante dos vistos gold, atingiu os59 779 968,88 euros, uma descida de 2,8% face a igual mês do ano passado (61 552 086 euros).
Na resposta enviada ao DN, o SEF confirma que "os agendamentos para atendimento no SEF de investidores e familiares no âmbito de primeiro pedido de ARI ou renovação, na área de Lisboa, que é a área de maior pressão, o tempo máximo de esperar para atendimento é de cerca de dois meses e meio, havendo outros locais no país onde é imediato".
"Está com três meses de delay. Há um ano as coisas fluíam. Se calhar não estava preparado para o sucesso que o programa teve", disse ao DN o advogado Eduardo Hilário. Opinião idêntica tem Marta Martins: "Em maio consegui fazer uma marcação para julho e desde aí nunca mais consegui vaga. Reduziram para metade o número de vagas e há mais de três semanas que não fazem agendamentos." Para a advogada o atraso podia ser reduzido se o SEF autorizasse a que os processos pudessem ser iniciados fora da área onde o investimento foi feito.
"No Porto e no Algarve há vagas, mas não deixam ir lá. No SEF a competência territorial não acabou", frisou. " A lei diz que pode pedir a renovação do cartão [de residência] até 30 dias antes de caducar. Nunca acontece. E mexe com a liberdade das pessoas", acrescentou.
Serviço a piorar
Os advogados concordam que o atendimento está pior do que há um ano, seja pela falta de pessoal - "Lisboa tem 25 guichets e só 12 estão ocupados", recorda Marta Martins. Ou uma consequência do processo judicial que envolve o ex-diretor--geral do SEF, Manuel Palos (acusado de corrupção passiva e prevaricação num processo que também envolve o ex-ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, o presidente do Instituto de Registos e Notariado, António Figueiredo, e a ex-secretária-geral do Ministério da Justiça, Maria Antónia Anes). "Tudo ficou mais burocrático", salientou Eduardo Hilário.
Há outro ponto em que os advogados e a presidente do sindicato concordam: o atraso no agendamento para iniciar o processo faz que potenciais interessados deixem de o ser. ""Alguma vez um investidor vai esperar até novembro? Estão a afastar as pessoas", frisa Marta Martins. "Acha que quem vai pagar um milhão de euros pelo processo se vai sujeitar a isto?", acrescenta Eduardo Hilário. Recorde-se que Espanha, Malta, Chipre , por exemplo, são fortes concorrentes de Portugal nesta "luta".
Já o SEF garantiu que até ao final do ano tem previsto "aumentar a criação de atendimentos especializados para diversas áreas", onde se incluem as ARI.