Uma brasileira e os seus dois amores: Portugal e chocolate
Brunch Com Bruna Vaz, master franchise da Leonidas em Portugal.
Um infeliz incidente impede-nos de nos encontrarmos na loja com que se estreou "a empreender", na vida que escolheu para viver em Portugal. Mas mesmo com a tristeza de ver a sua primeira loja Leonidas desaparecer em cinzas - "o motor dos frigoríficos sobreaqueceu... perdemos tudo", diz ainda com a tristeza a surgir-lhe nos olhos -, Bruna não é de se ater a desgraças e rapidamente se volta a entusiasmar. "Mas vamos abrir agora, na próxima semana, com tudo novo e bonitinho!"
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Conversamos na loja de uma das suas franchisadas, a espreitar a Avenida da Liberdade, e Carol preparou-nos um brunch à medida da rubrica: torradas e croissants, waffles, fruta e iogurte; eu não dispenso o café duplo, mas a master franchise, como não podia deixar de ser, opta pela estrela da casa, uma caneca de chocolate quente cujo aroma se espalha pelo ar, convencendo facilmente os outros presentes a seguir-lhe o exemplo.
Os chocolates são o negócio de Bruna, mas também a sua paixão. Uma de duas, que lhe mudaram a vida, conforme me conta esta jurista que há sete anos trocou o Brasil por Portugal. "E não tenho vontade nenhuma de voltar", apressa-se a dizer, confirmando que é aqui que quer viver, trabalhar e envelhecer. "Sou portuguesa por casamento", explica, ainda que sublinhe que foi ela a grande impulsionadora da mudança para o lado de cá do Atlântico e pela escolha de Lisboa - os pais do marido são açorianos, mas vivem em Badajoz, e Harian andou um pouco por toda a parte, desde Santa Catarina, onde se conheceram, à Arábia Saudita, de onde acabou por sair em 2021 para se juntar ao negócio que já é da família.
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Bruna Vaz nasceu numa família com tradição no Direito - o avô era juiz -, e ainda que os pais tenham saltado essa vocação (o pai era gerente do HSBC e a mãe secretária na companhia de eletricidade de Florianópolis, onde viviam), ela própria nunca teve dúvidas quanto ao futuro. "Desde pequena, gostava muito de falar, de defender causas, queria muito fazer Direito e dar aulas", conta-me.
O planeamento da carreira era detalhado ao ponto de acabar a licenciatura em fevereiro e avançar de imediato para uma pós-graduação em Laboral, enquanto dava aulas nas universidades federais, o que acabou por conduzi-la ao Direito de Família. "Nessa altura, tínhamos associação com um escritório que prestava serviços pro bono e eram os meus alunos que faziam o trabalho, e muitos casos eram dessa área, então acabei por me especializar no ramo", explica.
Foi essa a estrada que a trouxe a Portugal, antecipando os exames da formação em dois meses para aqui chegar a tempo de arrancar o Mestrado no ano letivo europeu. E foi amor à primeira vista. "Cheguei em 2016 e fiquei apaixonada por Portugal."
Ao Mestrado seguiu-se o Doutoramento e as aulas na Clássica, a dar três pós-graduações. Pelo caminho já passara, com o marido, a trabalhar na área da construção civil, por Estanha e Namíbia. Mas a vontade de aqui enterrar as suas raízes fez-se mais forte quando se viu com dois filhos, Miguel e Bernardo, de 1 e 3 anos, e a invadiu a vontade de lhes dar uma vida imersa na cultura europeia que a apaixonava, uma vida segura e com condições que não podia garantir noutras partes do mundo, incluindo o seu Brasil natal.
A vontade de ficar foi o impulso que bastou para procurar "uma oportunidade onde pudesse empreender". Estudou o dossier, concluiu que queria enveredar pela área alimentar, mas fora da restauração - "não era a minha praia" - e teve uma epifania ao lembrar-se dos chocolates Leonidas, que a apaixonavam. "Já conhecia a marca e apreciava muito a qualidade destes chocolates, e o seu custo-benefício era o ingrediente que encaixava perfeitamente num país como Portugal, porque dentro do chocolate de alta qualidade (100% manteiga de cacau, sem conservantes nem aditivos, sem gorduras extra), é o mais barato. Outras marcas custam mais de 100 euros/kg, enquanto nesta são 47 euros/kg com alta qualidade."
Em menos de nada, convencia o irmão mais velho, polícia no Brasil, a tornar-se seu sócio numa loja Leonidas que abriu no Campo Pequeno em 2019. Oito meses depois, o responsável por Portugal estava a passar-lhe a pasta da Leonidas - o que a obrigou a pôr as aulas de Direito na gaveta. E em três anos a gerir a marca como master franchise Bruna praticamente triplicava o negócio. Com uma pandemia pelo meio, recorde-se, durante a qual foram inauguradas 15 lojas.
Triplicar o negócio em pandemia
"Em junho 2019, quando os belgas me aceitaram como nova master no país, havia oito lojas. Desde então abri 21, metade na grande Lisboa e as outras espalhadas pelo país, do Algarve a Braga. Foi muito trabalho, mas é gratificante este processo de consolidação da marca, que ainda estou a fazer. Há muito território onde quero dar a conhecer a Leonidas", explica, confessando que a sede até já lhe propôs expandir-se a Espanha, mas Bruna prefere dar passos mais pequenos e consistentes. O que justifica então tantas lojas em tão pouco tempo?
"A pandemia levou muita gente a mudar de vida", esclarece. "Houve muitos filhos de portugueses emigrados que quiseram vir para cá e abrir alguma coisa sua. E as lojas são mesmo um negócio de famílias, a que cada uma traz o seu ADN." A esta onde tomamos o brunch, por exemplo, a franchisada que a gere trouxe a sua experiência de eventos, da sua anterior vida. Outras ficam-se pelos bombons e cafetaria. Cada uma tem uma identidade que é passada por quem a gere e Bruna garante que é essa a riqueza da marca: o cuidado com que selecionam e compõem os bombons na vitrina, o carinho com que fazem os laços, a dedicação com que todos os dias chegam à loja e recebem os clientes. Razão pela qual, aliás, não aceita franchisados que queiram apenas investir, sem estar presentes.
A própria Bruna, além da empresa em que gere os franchisados, tem uma segunda em que é ela própria a franchisada, com espaços no Campo Pequeno, em Campo de Ourique, na Praça de Espanha, em Telheiras e dois a Sul - e que gere com o marido (que se dedica mais ao trabalho de escritório e logística) e os dois irmãos mais novos (a irmã tem a cargo as duas lojas no Algarve, o irmão é ponta de lança nos armazéns). Um negócio de família, portanto. .
A coleção do chocolate
Hoje a vida de Bruna Vaz divide-se em dois períodos distintos. "Na época alta do chocolate, não tenho tempo, por isso, entre outubro e janeiro não faço entrevistas a candidatos a franchisados", explica. Fora desses meses, tem cerca de dez entrevistas por semana com pessoas que querem abrir lojas. Mas não se queixa do ritmo - o que lhe dá dores de cabeça é a parte do negócio que não consegue controlar. "As transportadoras que trazem o produto, isso é o mais difícil", confessa, explicando que o cronograma da casa-mãe tem de ser cumprido à risca e por isso já optou por contratar motorista e camião, de forma a melhor controlar todo o processo de distribuição.
É que até há uma época para o chocolate. "Em junho, depois da convenção anual em Bruxelas, reunimos todos os franchisados para lançar o calendário do ano, com a coleção de chocolate, o packaging, as novidades. Tem tudo muito planeamento."
A fazer 40 anos em março, Bruna come chocolates todos os dias - não por obrigação profissional, mas por puro prazer. "O chocolate faz bem", vinca, a rir. Vai provando o que aparece de novo, testa até os mais exóticos, que lhe chegam de fora - como o de recheio de leite de camelo que o marido lhe trouxe quando vivia na Arábia Saudita -, mas tem um favorito, que revela sem hesitações: a pérola de framboesa (com recheio de ganache da dita).
E qual é o best-seller da marca? "Aqui são os orangettes, farripas de laranja cobertas de chocolate; e também o floranger, que tem flor de laranjeira. A laranja está sempre muito presente nos campeões de vendas em Portugal. Mas os preferidos da marca a nível mundial são os manons café, que têm um creme de manteiga de café com praliné; são os preferidos de belgas, franceses, luxemburgueses e holandeses, que representam, 80% das vendas." Mas com Portugal a ganhar espaço entre os 50 países onde a Leonidas está presente, talvez Bruna ainda venha a afirmar as suas escolhas no catálogo. Até porque o seu projeto de vida é continuar a trabalhar a expansão e a consolidação por cá. E se o marido até gostaria de voltar à Namíbia, Bruna e os filhos, hoje com 10 e 8 anos, nem querem ouvir falar em viver noutro lugar, ainda que viajar continue a ser um dos programas preferidos da família. "Mas isso é em férias; de resto, prefiro receber aqui a minha família e amigos."
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