As contas do turismo foram sempre a somar em 2023, ultrapassando todos os máximos históricos registados no setor. A procura recorde aliada ao aumento dos preços deu aos alojamentos do país receitas 40% acima do pré-pandemia. Os proveitos totais do alojamento turístico em 2023 - que somam ao alojamento outros gastos inerentes à estada dos turistas como restauração, lavandaria entre outros serviços - dispararam para seis mil milhões de euros (+20,1 face a 2022), de acordo com os resultados preliminares divulgados ontem pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)..Não restam grandes dúvidas de que o turismo é, neste momento, um dos motores da economia portuguesa. “O turismo é obviamente bom para o país, torna o país aberto, cria emprego e contribui para o equilíbrio da balança comercial”, diz ao DN o economista Paulo Coimbra. Os proveitos de aposento, que dizem respeito às receitas amealhadas com as dormidas, cresceram para 4,6 mil milhões de euros, um avanço homólogo de 21,3% e uma subida de 43% face a 2019..Nunca houve tantos turistas a fazer férias em Portugal.Os bons resultados fizeram-se à boleia de dois fatores: por um lado, nunca houve tanto turistas a visitar Portugal, o que se traduziu numa subida do número de hóspedes para 30 milhões (+13,3%) que foram responsáveis por 77,2 milhões de dormidas (+10,7%). Por outro, o aumento dos preços ajudou a impulsionar as contas. Entre janeiro e dezembro de 2023 pernoitar num alojamento turístico do país pesou mais 15,4% no bolso tendo o rendimento médio por quarto disponível (RevPAR) atingido os 64,8 euros. O rendimento médio por quarto ocupado (ADR) atingiu os 113,1 (+9,2%). E foram os estrangeiros os principais responsáveis por pagar a fatura, com um peso de 70% nas dormidas realizadas no pais, totalizando 53,8 milhões (+14,9%). Já as dormidas do mercado interno cresceram 2,1%, para um total de 23,4 milhões..Ainda assim, esta economia baseada no turismo pode ter “pés de barro”, avisa Paulo Coimbra. “Resulta no perigo tremendo a que fica exposto o empresário, ou o país, que decide ter um negócio monotemático. Porque isto também é uma questão de moda internacional. Agora temos muito turismo mas não tínhamos em 2000. E nessa altura Portugal era um país tão encantador como agora”. .Os riscos associados a um negócio “de modas”.O economista Paulo Coimbra acrescenta: “Há uma parte importante deste afluxo de turismo que é moda. E que resulta muito das guerras no Médio Oriente. Se a situação geopolítica muda, o país que tem este volume colossal de recursos produtivos alocados ao turismo vai sofrer com desemprego e com a contração da economia”. Olhando para o mapa nacional, Lisboa e a ilha da Madeira lideram no fator preço. Pernoitar na capital custou, em média, 110,9 euros por noite, seguindo-se a Madeira com um ADR de 98,5 euros. Os maiores crescimentos neste indicador registaram-se nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira (+14,3% em ambas) e em Lisboa (+12,2%)..No balanço global às contas, os Açores, Lisboa e o Norte foram as regiões cujas receitas tiveram um maior crescimento. “No conjunto do ano de 2023, os maiores crescimentos nos proveitos totais e de aposento ocorreram na RA Açores (+25,9% e +27,7%), na AM Lisboa (+24,5% e +25,7%) e no Norte (+24,2% e +25,5%, respetivamente). Comparando com 2019, os maiores aumentos nos proveitos totais e de aposento verificaram-se nas regiões autónomas (RA Açores com +60,3% e +62,3%, respetivamente, e a RA Madeira com +60,2% e +72,3%)”, refere o gabinete de estatística. .Analisando as dormidas, o município de Lisboa concentrou 19,6% do total, atingindo 15,1 milhões dormidas (+13,6%), seguindo-se Albufeira, com um peso de 10,1%, totalizando 7,8 milhões de dormidas em 2023 (+9%), o Funchal com uma quota de 8,1% totalizando 6,2 milhões de dormidas (+8,8%) e o Porto com 5,9 milhões de dormidas (+21,9%), representando 7,6% do total nacional..Turismo faz subir preços da habitação nas grandes cidades.Contudo, a grande quantidade de imóveis alocados ao turismo também representam, segundo o economista Paulo Coimbra, num efeito pernicioso para a economia e que se sente no bolso dos portugueses, todos os meses. “Se o turismo serviu para equilibrar a balança comercial do país, os serviços sobretudo nas grandes cidades, trazem as dificuldades que todos conhecem”, começa por dizer este especialista. E acrescenta: “Por exemplo, as dificuldades de habitação. As principais cidades do país disponibilizam uma parte importante da sua habitação a esta atividade. Isso depois tem reflexo na vida de todos os dias, como o preço extraordinário das casas é muito resultado desta quantidade extraordinária de turismo”..Por isso, apesar da oportunidade que o turismo representa em termos de equilíbrio das contas públicas, para Paulo Coimbra é preciso olhar para o tema sobre várias perspetivas. “As avaliações têm de ser mistas, porque há vantagens e desvantagens. Na quantidade em que estamos a receber o turismo, atualmente, não é só uma coisa boa para o país. O país precisa de requalificar a sua estrutura produtiva e de deslocar parte da sua atividade para produtos e serviços de alto valor acrescentado. Precisamos de deixar de servir cafés para produzir tecnologia de ponta”..Imigrantes fazem o trabalho que os portugueses não querem.Aliás, o economista aponta os baixos salários e a grande qualificação das novas gerações de portugueses como outra das questões a ponderar. “Temos hoje muito turismo porque a partir de 2010/2011 a nossa economia empobreceu do ponto de vista industrial e porque somos uma economia de salários baixos. Isto permite que os turistas venham para o nosso país e possam consumir e estar cá a preços baixíssimos. Tudo isto resulta de mão de obra barata e pouquíssimo qualificada”. Esta mão de obra é, muitas vezes, vinda de outros países. “Há mão de obra estrangeira, sobretudo com serviços mais inqualificados: para fazer camas, para servir pequenos-almoços, essas coisas. Até porque temos, em Portugal, uma geração altamente qualificada e que está a emigrar, para trabalhar nas suas áreas de estudos, no estrangeiro”..Os recordes históricos do turismo no ano ano passado, em receitas, dormidas e hóspedes, também se fizeram sentir nos aeroportos nacionais, a principal porta de entrada no país de turistas estrangeiros. Em 2023, estas infraestruturas receberam 67,5 milhões de passageiros, um aumento de 18,9% face a 2022 e um avanço de 12,3% em comparação com o pré-pandemia, revelam as estatísticas rápidas divulgadas esta quarta-feira, 14, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE). .Também o número de aviões a chegar a Portugal cresceu 12%, tendo aterrado nas infraestruturas aeroportuárias nacionais um total de 234 mil aeronaves em voos comerciais (+7% relativamente a 2019). Já movimento de carga e correio “foi semelhante ao ano anterior, atingindo 223 mil toneladas”..Aeroporto do Porto cresce e atinge 15 milhões de passageiros.Olhando para as infraestruturas, o aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, liderou tendo sido responsável por movimentar 49,8% do total de passageiros do país, ou seja, 33,6 milhões, correspondendo a crescimentos de 19,1% e 7,9%, face a 2022 e 2019, respetivamente. Contudo, e considerando a capacidade limitada de expansão da Portela, é a Norte que os números mais crescem. O aeroporto do Porto, que atingiu os 15 milhões de passageiros movimentados, foi o que registou maior crescimento a nível nacional tanto face a 2022 (+20,3%) como a 2019 (+16%). Já Faro totalizou 9,6 milhões de passageiros movimentados (+18% face a 2022 e +7% em comparação com 2019)..Maioria vem do Reino Unido.A ocupar o top cinco dos principais países de origem e de destino dos voos estão o Reino Unido, França, Espanha, Alemanha e Itália. O Reino Unido manteve-se o principal país de origem e de destino dos voos, registando crescimentos de 16,5% no número de passageiros desembarcados e 16,9% no número de passageiros embarcados. França e Espanha ocuparam a 2ª e a 3ª posição. Alemanha, apesar de ter registado os menores crescimentos, em ambos os sentidos, manteve a 4.ª posição. Itália ocupou a 5.ª posição e registou os maiores crescimentos (+31,2% e +31,0% no número de passageiros desembarcados e embarcados, respetivamente)”, detalha o gabinete de estatística. . Com Rute Simão/DV