Serviços mínimos "atiram responsabilidade excessiva" para cima dos diretores de escolas
Obrigatoriedade de assegurar refeições e manter o apoio a alunos com necessidades educativas especiais preocupam dirigentes que questionam legalidade da decisão do Tribunal Arbitral. Pais encaram com "tranquilidade" a medida.
Num dia em que prosseguem as greves por distrito em força, desta vez em Portalegre, o início dos serviços mínimos, amanhã, é motivo de discussão numa reunião do Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (S.T.O.P) que vai unir centenas de comissões de greve de todo o país.
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Com encontro marcado com o Ministério da Educação para o dia 2 de fevereiro, o S.T.O.P assegura que o a obrigação de serviços mínimos "é ilegal e inconstitucional, porque viola o direito fundamental dos trabalhadores à greve".
No mesmo sentido, António Garcia Pereira, advogado e especialista em Direito do Trabalho que tem dado aconselhamento jurídico ao S.T.O.P, refere que "se os serviços mínimos são decretados fora do período legal, que é antes do início da greve, isso é manifestamente ilegal". Apesar disso, o tribunal arbitral decidiu que a partir de 1 de fevereiro serão impostos serviços mínimos e quem não cumprir pode vir a sofrer sanções.
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"Em teoria, a desobediência pode consubstanciar uma infração disciplinar - em último caso o despedimento -, se a definição dos serviços mínimos for legal", explica Garcia Pereira, que faz questão de recordar vários acórdãos que apenas reconheceram a ilegalidade dos serviços mínimos passados meses ou até anos do facto. "Não temos meios jurisdicionais eficazes e que respondam em tempo útil para fazer face a serviços mínimos ilegais".
E quem decide quem pode ou não fazer greve? De acordo com uma circular enviada na sexta-feira passada pela Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (DGEstE), essa missão fica a cargo dos diretores das escolas. Garcia Pereira explica que, legalmente, a definição de quem deve ou não cumprir os serviços mínimos cabe, em primeiro lugar, aos sindicatos que convocam a greve, e em segundo lugar, ao empregador público. "Deveria ser o Ministério da Educação a definir, porque está-se a atirar para cima dos diretores dos estabelecimentos uma responsabilidade excessiva", argumenta, ao acusar o Governo de "lançar fatores de divisão entre os professores e os diretores, enquanto o ministério e o ministro da Educação saem pela porta baixa".
Uma das cartadas do Governo tem sido o argumento, já utilizado pelo ministro da Educação, João Costa, de que a greve tem tido um "impacto mínimo para os professores e impacto máximo para os encarregados de educação", alegando haver casos de pais em risco de perder o emprego. Uma acusação que não convence professores, nem sindicatos, que insistem no direito à greve. "O mesmo Governo, que se tem estado literalmente nas tintas para os milhares de alunos que vão para a escola com carências gravíssimas, de repente está muito preocupado e a culpa é dos professores em luta", ironiza o advogado. "Isto é uma manobra, pura e simplesmente, de intoxicação da opinião pública"
"Uma classe maltratada"
Enquanto para uns os serviços mínimos são vistos como um alívio, para outros esta nova medida significa apenas uma sobrecarga nas responsabilidades e um adiamento do entendimento entre o ministério e os professores.
Manuel António Pereira, presidente da Associação Nacional dos Dirigentes Escolares (ANDE), defende que o Governo deveria "trabalhar para dar respostas" em vez de "tentar encontrar soluções para adiar" a resolução dos problemas dos docentes - "a classe maltratada".
"Quando o Governo não consegue resolver um problema, atira com a responsabilidade para cima dos diretores. Se correr bem, é mérito do ministério que encontrou uma solução, e se correr mal a culpa é dos diretores que não fizeram o que tinham de fazer. É uma tradição que já acontece há muito tempo. O Ministério da Educação em vez de ouvir os profissionais da educação, preferiu declarar serviços mínimos que vão ao encontro dos interesses dos encarregados de educação", explica. Além disso, o dirigente considera que os serviços mínimos "põem em causa alguns direitos constitucionais como o direito à greve", nomeadamente para os assistentes operacionais (que são insuficientes em muitas escolas) e professores de Educação Especial.
"A definição de serviços mínimos deve sempre respeitar os princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade. Neste caso, quando se obriga a que praticamente todos os profissionais da Educação Especial tenham que estar na escola para acompanhar os alunos, os princípios são postos em causa. Na prática, os serviços mínimos para esses profissionais são os serviços máximos", testemunha.
Por outro lado, Mariana Carvalho, presidente da CONFAP (Confederação Nacional das Associações de Pais), defende que "os serviços mínimos são equilibrados e essenciais para assegurar um clima de tranquilidade e segurança para as famílias, especialmente as mais vulneráveis". Isto porque ainda que os serviços mínimos não obriguem à realização de aulas, ajudam no sentido em que os pais já têm onde deixar os filhos e pelo menos uma refeição diária é assegurada.
Docentes
De acordo com o Tribunal Arbitral, os professores terão de assegurar, a partir de amanhã, apoios a alunos sinalizados pela CPCJ, crianças e jovens integradas na educação inclusiva e alunos em "especial perigo de abandono escolar".
Não docentes
O pessoal não docente terá de garantir o serviço de portaria e vigilância aos alunos dentro do espaço escolar, assim como a disponibilização de refeições (quando o refeitório não está concessionado).
Meios
Para o cumprimento dos serviços mínimos, as escolas devem disponibilizar 1 docente por apoio, de acordo com a especialidade, bem como um mínimo de 1 trabalhador para o serviço de portaria, 3 trabalhadores para o refeitório e 1 trabalhador para vigilância e segurança dos alunos.
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