Serviço militar não é obrigatório, mas há 4660 objetores de consciência
Motivos de ordem religiosa, moral, humanística ou filosófica são invocados para, por exemplo, não ir ao Dia da Defesa Nacional. Na última década, os pedidos aumentaram.
Desde que o serviço militar obrigatório (SMO) deixou de existir e foi criado o Dia da Defesa Nacional [ambos em 2004] foi atribuído, desde 2005, o estatuto de objetor de consciência a 4660 "cidadãos maiores de 18 anos" por motivos de ordem religiosa, moral, humanística ou filosófica". Do total de 5010 requerimentos, 350 não foram aceites por "documentos em falta e/ou fundamentos que suportam o pedido".
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Os dados revelados ao DN pelo Instituto Português do Desporto e da Juventude (IPDJ), que assegura o planeamento, organização e coordenação de todos os assuntos relativos à obtenção do estatuto que é conferido pela Comissão Nacional de Objeção de Consciência, mostram que em 17 anos, 2016 foi aquele em que mais estatutos foram concedidos (464), seguido de 2018 (444) e de 2020 (438). Excetuando 2010, ano em que 338 requerimentos de objeção de consciência foram atribuídos, até 2011 a média dos pedidos rondava os 70. A partir daí o valor subiu e a média ultrapassa os 380.
Este ano, "até à presente data", já foram atribuídos 88 estatutos, o que faz pressupor que 2022 deverá ter um número final próximo da média da última década.
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A concessão deste estatuto - cujo Dia Internacional se celebra este domingo - impede quem o recebe de "trabalhar no fabrico, reparação ou comércio de armas de qualquer natureza ou no fabrico e comércio das respetivas munições, nem trabalhar em investigação científica relacionada com essas atividades ou qualquer outra atividade que exija o uso e porte de arma de qualquer natureza; ser titular de licença administrativa de detenção, uso e porte de arma de qualquer natureza; e ser titular de autorização de uso e porte de arma de defesa quando, por lei, tal autorização seja inerente à função pública ou privada que exerça".
Caso haja a renúncia "efetivada" da "objeção de consciência", antes dos 35 anos, estas inibições desaparecem, mas fica o requerente "sujeito/a ao cumprimento dos deveres militares".
O âmbito da objeção de consciência é de tal forma lato que a legislação existente, que começa em 1985 apesar de a Constituição de 1976 já estipular que "os objetores de consciência prestarão serviço militar não-armado ou serviço cívico adequado à sua situação", está dispersa por diplomas como a Lei da Educação Sexual ou a Interrupção Voluntária da Gravidez e até pelos códigos deontológicos de algumas profissões.

Paulo Otero, constitucionalista, que considera a "objeção de consciência um direito fundamental", no artigo que em breve será publicado em livro [Temas de Ética - Reflexões e Desafios, coordenado por Bagão Félix, Pedro Afonso, Victor Gil e Paulo Otero], explica que "ao invés do que sucede no direito de resistência, [na objeção de consciência] não existe uma necessária invalidade do dever jurídico ou da norma que estabelece esse dever jurídico e face ao qual incide a objeção de consciência: são razões subjetivas, resultantes de convicções morais, religiosas e filosóficas integrantes dos ditames da consciência individual - e não fundamentos tendencialmente objetivos de inconstitucionalidade ou de ilegalidade que, sendo consideradas atentatórias de direitos fundamentais, tal como sucede no direito de resistência - alicerçam a objeção de consciência", uma diferença que faz toda a diferença.

Apesar de legalmente a objeção de consciência ter surgido por questões militares e de consagrada, nomeadamente, na Convenção Europeia dos Direitos do Homem e na Declaração Universal Universal dos Direitos Humanos tem sido na área da saúde que a a questão se tem colocado de forma mais mediática.
Porém, se atentarmos ao número de objetores de consciência desde 2016 [98] tendo em conta, por exemplo, o total de enfermeiros [80 379] facilmente se percebe a reduzida dimensão. O total recuando a antes de 2016 deverá rondar os 300. No caso dos médicos, não foi possível até a hora de fecho desta edição obter dados atualizados. Os mais recentes apontam para mais de 1300 médicos, mas relacionados com as interrupções de gravidez.