Greve. Saúde será dos setores mais afetados com exames, consultas e cirurgias adiados
Dia 18, sexta-feira. A Administração Pública estará em greve e um dos setores mais afetados deverá ser o da Saúde, já que um dos sindicatos dos médicos, outro dos enfermeiros e dos técnicos de diagnóstico se juntaram a esta paralisação. O único sindicato independente que não se associou representa os técnicos de auxiliares da saúde, mas o presidente Paulo Carvalho entende que deverá haver profissionais a aderir, porque "a insatisfação da classe é grande".
Ao todo, e só no Serviço Nacional de Saúde (SNS), são mais de 145 mil os trabalhadores abrangidos pelos vários pré-avisos de greve emitidos, em primeiro lugar, pela Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública, estrutura que integra a CGTP-IN, e depois pelos sindicatos das classes.
Quem está no terreno prevê "uma adesão elevada" e "muitas consultas, exames de diagnóstico e cirurgias a serem adiadas". O presidente do Sindicato Nacional dos Técnicos Superiores de Diagnóstico e Terapêutica, Luís Dupont, disse mesmo ao DN que "basta os nossos técnicos fazerem greve para que toda a atividade programada fique comprometida nos hospitais, desde consultas a cirurgias", o mesmo acontecerá se administrativos, médicos, enfermeiros e técnicos auxiliares fizerem o mesmo.
Importa relembrar que só a classe de enfermagem integra quase 40 mil profissionais no SNS, de acordo com os últimos dados oficiais, a dos médicos cerca de 30 mil, a dos técnicos de diagnóstico mais de oito mil e a dos auxiliares de saúde cerca de 31 mil, segundo dados do seu sindicato. Mas as situações de urgência e de emergência estão salvaguardadas pelos serviços mínimos.
A verdade é que a insatisfação nos vários setores é grande e esta é a primeira paralisação geral com que a nova equipa ministerial da Saúde, liderada por Manuel Pizarro, vai ter de lidar. Embora, e desde que entrou em funções, em setembro, já tenha sentido vários protestos de algumas classes, nomeadamente da dos enfermeiros, que ontem iniciou uma paralisação de quatro dias (17, 18, 22 e 23), da dos farmacêuticos que terminou esta semana uma paralisação histórica, dividida entre os dias 25 e 26 de outubro e 15 e 16 de novembro, e já com críticas ao "silêncio desta equipa e deste governo"; da dos técnicos de emergência que mantém desde o início deste mês greve às horas extraordinárias e dos técnicos de diagnóstico e terapêutica, que além do protesto de amanhã já anunciaram também greves às horas extraordinárias e concentrações em frente a vários hospitais para o fim de novembro.
O setor da Saúde está em ebulição. Todas as classes profissionais se queixam do mesmo: condições de trabalho no SNS, progressão nas carreiras ou da não-existência de carreiras e das grelhas salariais. Aliás, uma das razões que levaram estes sindicatos a aderirem à greve tem mesmo a ver com as remunerações e com a falta de medidas de incentivo que levem à fixação de profissionais no SNS.
O presidente do Sindicato Independente dos Técnicos Auxiliares de Saúde, Paulo Carvalho, explicou ao DN que esta estrutura não se associou ao protesto porque é, "precisamente, independente. Não integramos nem CGTP-IN nem UGT", mas reconhece que a "classe sofre dos mesmos problemas de falta de recursos humanos, dificuldade em recrutar e de fixar profissionais, porque não é fácil fixar quem ganha praticamente o ordenado mínimo". A única notícia boa e que também os levou a não se associarem à paralisação "é acreditarmos que o sr. primeiro-ministro cumprirá a sua palavra e que até ao final do ano a nossa carreira será aprovada. Estava tudo a ser tratado com o anterior ministério e esperamos que o novo gabinete siga em frente, apesar de já termos enviado três emails e de ainda não termos obtido resposta para qualquer reunião".
Destaquedestaque146 mil profissionais no SNS. Só enfermeiros são 39 913, segundo dados da Pordata, médicos 30 484, Técnicos de Diagnóstico 8068 e 31 000 auxiliares.
Do lado dos médicos e dos enfermeiros, os sindicatos que se juntaram ao protesto também acreditam que a "adesão será elevada", já que "a insatisfação é enorme e transversal a todas as áreas da saúde". Ao DN, Guadalupe Simões, do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), que ontem esteve em frente ao Ministério da Saúde para entregar um documento com o que ainda falta fazer para se reparar as injustiças na classe, diz mesmo: "Esperamos que a adesão à greve tenha a expressão do que é a insatisfação na classe."
E, no caso dos enfermeiros esta sexta-feira é o segundo dia de paralisação, já que o SEP antes da convocação da Frente Comum já tinha avançado para uma greve de três dias, por considerar que não tem havido "evolução nas negociações com a tutela no sentido de se repor os retroativos a todos os enfermeiros", apesar de, reconhece a dirigente, se ter conseguido alguns avanços na última reunião, nomeadamente no que respeita à contabilização dos pontos de avaliação de desempenho, independentemente da função que ocupam ou do ano de progressão na carreira, mas só para enfermeiros especialistas e gestores.
A Federação Nacional dos Médicos (FNAM), pela voz do vice-presidente João Proença, explica que decidiu juntar-se ao protesto, porque "os problemas que hoje existem são os mesmos para todos os profissionais do SNS, desde as grelhas salariais às condições de trabalho", defendendo que "todos precisamos de melhores condições de trabalho e de melhores ordenados para haver uma saúde mais condigna".
O dirigente sindical refere ainda que esta realidade tem levado muitos a saírem do setor público para outras áreas e que este "não é só um problema médico, é transversal a todas as áreas. Aliás, a falta de recursos humanos está bem patente nos serviços de urgência dos hospitais".
A greve decretada pela Frente Comum tem por base a proposta de atualização salarial apresentada pelo Governo que considera não dar "resposta imediata à perda de poder de compra verificada em 2022 e que, em 2023, aprofundará o empobrecimento dos trabalhadores da Administração Pública". A estrutura defende o aumento real dos salários de 10%, com um mínimo de 100 euros, considerando que "o governo tem tempo, espaço e meios orçamentais para dar resposta aos problemas dos trabalhadores", embora a proposta apresentada pelo governo foi aceite pelas estruturas sindicais que integram a UGT.
Para todas as áreas, os serviços mínimos estão definidos e serão cumpridos. No caso dos enfermeiros, houve unidades que pediram esclarecimentos sobre estes ao Tribunal Arbitral Administrativo, que decidiu que estes são fixados pelo número de profissionais nos turnos da manhã, da tarde e da noite num determinado serviço no fim de semana anterior aos dias de greve.
Segundo explicou Guadalupe Simões isto significa que "se um serviço esteve a funcionar com quatro enfermeiros durante a manhã, três à tarde e dois à noite são estes que têm de estar presentes nos serviços mínimos", o que implica mais enfermeiros do que aqueles que o sindicato considera necessários e que anteriormente eram aceites. "Normalmente, em serviços mínimos havia dois enfermeiros por turno".
O DN sabe que no terreno também há enfermeiros que consideram quatro dias de greve "excessivo" e até "muito penalizador para os ordenados", mas, os mesmos, dizem estar disponíveis para parar "esta semana e a próxima", porque é preciso que se faça alguma coisa a bem da situação dos enfermeiros e do SNS", afirmaram-nos.
Destaquedestaque733 771 Trabalhadores nos vários setores da Administração Pública, desde a Saúde, Educação, Justiça, Finanças, Segurança Social, Administração Local, Administração Interna, Defesa, etc.
Para os médicos, e de acordo com o pré-aviso da FNAM, todos os profissionais do "setor público, com contrato de trabalho em funções públicas ou contrato individual de trabalho, estejam ou não sindicalizados, podem aderir à greve".
Além das medidas reivindicadas pela Frente Comum, a FNAM, que critica o facto de a nova equipa ministerial ter atirado a primeira reunião negocial com a classe para o final do mês de novembro, dia 28, perante todos os constrangimentos que têm existido nas unidades de saúde, avança no seu pré-aviso com outras exigências, como: "A revisão da metodologia de progressão na carreira, com extinção imediata do SIADAP para os médicos, a redução do tempo normal de trabalho no Serviço de Urgência das 18 para as 12 horas, o redimensionamento da lista de utentes dos médicos de família e a criação do estatuto de desgaste rápido, risco e penosidade acrescidos para os médicos, como a reformulação dos incentivos à fixação de médicos em zonas e especialidades carenciadas, a revisão do Regime do Internato Médico e a definição de um conjunto de medidas que combata a existência de médicos indiferenciados e sem acesso à formação médica especializada."
O pré-aviso de greve da FNAM envolve "todos os serviços de saúde dependentes do Ministério da Saúde (designadamente hospitais e centros de saúde), como do Ministérios do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, da Educação, da Economia, da Justiça, das Secretarias Regionais da Saúde das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, bem como, em geral, quaisquer entidades públicas ou privadas que tenham médicos ao seu serviço, independentemente do grau, função ou vínculo".
No documento, o sindicato define que os serviços mínimos têm de ser assegurados nas áreas da quimioterapia e radioterapia, diálise, urgência interna, dispensa de medicamentos de uso exclusivamente hospitalar, Imunohemoterapia com ligação aos dadores de sangue, recolha de órgãos e transplantes, cuidados paliativos em internamento, bem como em situações de punção folicular que, por determinação médica, deve ser realizada em mulheres cujo procedimento de procriação medicamente assistida tenha sido iniciado no SNS. O Sindicato Independente dos Médicos não aderiu ao protesto por achar que não é o momento, pois há um processo negocial a decorrer, mas manifestou "compreensão e solidariedade" para com os motivos que levam a esta ação.