Queixas contra médicos e enfermeiros aumentam há três anos

Queixas contra médicos e enfermeiros aumentam há três anos

Em 2023, a Ordem dos Médicos recebeu 2027 queixas contra profissionais, mais 20% que em 2022. E a dos Enfermeiros 650 (mais 60%). As primeiras resultaram em 13 condenações, as segundas em oito suspensões. Os bastonários atribuem isto à falta de profissionais, às condições de trabalho e aos utentes estarem informados.
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As queixas contra médicos e enfermeiros têm aumentado nos últimos três anos. Isto mesmo provam os dados divulgados nesta semana pelas ordens que representam as duas classes. Do lado dos médicos, o bastonário Carlos Cortes justifica este aumento, em primeiro lugar, como algo “natural”, porque também há mais profissionais a exercerem. “Todos os anos temos mais 2000 a 2500 novas inscrições na Ordem”, disse. Do lado dos enfermeiros, Luís Barreira aponta, pelo contrário, “a falta de profissionais “.

Mas ambos concordam que as queixas também estão relacionadas com o sistema. Ou seja, com as condições em que se trabalha no Serviço Nacional de Saúde (SNS) e com o facto de os utentes também estarem mais conscientes dos seus direitos. Luís Barreira afirma mesmo que o aumento de queixas em relação aos enfermeiros tem a ver com “a degradação dos serviços, o que pode pôr em causa a qualidade e a segurança dos cuidados prestados”.


De acordo com os dados divulgados, o aumento de queixas na classe médica foi da ordem dos 20% comparativamente ao ano de 2022. Os conselhos disciplinares das três Seções Regionais (Norte, Centro e Sul) receberam um total de 2027 queixas em 2023, de 1682 em 2022 e de 1338 em 2021.

Mas o bastonário Carlos Cortes faz questão de destacar à Lusa que, apesar de ter havido um aumento no número de queixas, o número de condenações de profissionais com pena de suspensão ou expulsão baixou. No último ano, foram condenados 13 médicos, menos 15 do que em 2022 (28) e menos 9 face a 2021 (22).


Em relação aos enfermeiros, a Ordem recebeu 650 queixas em 2023 (mais cerca de 60% que no ano anterior), das quais resultaram 242 procedimentos disciplinares. Em 2022, registou 407 queixas das quais resultaram 260 procedimentos disciplinares e, em 2021, 392 queixas e 246 procedimentos disciplinares.

Quanto a sanções, estas têm vindo a aumentar também. No ano passado, foram suspensos oito enfermeiros, em 2022 houve uma suspensão e uma expulsão e, em 2021, houve três expulsões. À Lusa, o bastonário da classe recorda que o último relatório tornado público pelo Ministério da Saúde apontava para uma escassez de cerca de 14 mil enfermeiros no SNS, uma situação que leva “ao incumprimento das dotações seguras e que põe em causa a qualidade e a segurança dos cuidados prestados”.

À falta de profissionais, acresce-se ainda “a carga horária a que estão sujeitos, porque, muitas vezes, para colmatar a escassez estrutural que existe de enfermeiros, há um recurso permanente ao trabalho extraordinário”, reforça Luís Barreira. O que, argumenta, “além de ser ilegal, contribui, de facto, para o aumento do risco de erro e para a própria insegurança nos cuidados”.


Talvez a isto se deva também o facto de 10 mil enfermeiros terem “submetido à Ordem escusas de responsabilidade”. No fundo, argumenta, “estão a dizer que os próprios serviços se encontram em rutura e que o número de profissionais é manifestamente insuficiente para garantir os cuidados de saúde de qualidade e segurança”.

A maioria destes profissionais, segundo o bastonário, diz “sentir-se muitas vezes em sofrimento ético e, portanto, acredito claramente que os enfermeiros, que também são profissionais de relação próxima das pessoas, estão mais sujeitos a este tipo de queixas e reclamações”.


O bastonário dos médicos também concorda que “os problemas do SNS têm impacto sobre as queixas apresentadas”, referindo que “muitas vezes quem dá a cara são os médicos e, mesmo que a maioria das situações reportadas não tenham diretamente a ver com os médicos, a insatisfação dos doentes, dos seus familiares, dos seus acompanhantes em relação ao sistema traduz-se numa queixa contra o profissional que encontra nos serviços”.

Os principais motivos das queixas têm a ver com o tempo de espera nas urgências, o tempo de espera para consultas, cirurgias e a degradação das instalações dos serviços. Por outro lado, “os utentes estão mais informados e exigem mais qualidade, um melhor atendimento e mais celeridade nas respostas que são dadas em saúde”. O médico destaca ainda que “apesar de ter havido mais queixas, estas não foram acompanhadas por decisões sancionatórias”, o que comprova que muitas dessas queixas “não são graves” e “não têm diretamente a ver com os médicos, mas mais com o sistema”, afirmou.

Carlos Cortes anunciou que a OM criou um centro de mediação e de arbitragem para resolver as situações consideradas não graves de forma a evitar “demoras e mais custos”, mas também para não sobrecarregar o órgão disciplinar da Ordem que precisa “se dedicar a questões de maior complexidade técnica”. “Há uma aposta grande da Ordem dos Médicos na questão da regulação disciplinar e tenho consciência do papel que a OM tem nessa matéria e eu quero reforçá-lo na perspetiva do médico, mas sobretudo na perspetiva do cidadão”, dando-lhes os plenos direitos que têm em poder ter uma saúde de qualidade e em que o médico possa contribuir.

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