Um total de 1594 pessoas idosas foram vítimas de crime e de violência no ano passado, o que corresponde a uma média de quatro pessoas por dia. Os dados são da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) e foram disponibilizados a propósito do Dia Internacional da Pessoa Idosa, que se celebrou no início do mês..No que diz respeito ao perfil da vítima, esta é geralmente do sexo feminino (cerca de 75,5%), com idades compreendidas entre os 70 e os 74 anos. Já o autor do crime é, em cerca de 52,3% das situações, do sexo masculino e com uma média de idades (16%) acima dos 65 anos. Em cerca de 29% dos casos, a vítima é pai ou mãe do autor do crime.."Reconhecendo que a violência contra as pessoas idosas constitui um problema social e de Saúde Pública, consideramos que o seu eficaz combate pode contribuir para um futuro mais inclusivo, onde todos sejam respeitados ao longo do ciclo de vida, nomeadamente no contexto de um envelhecimento ativo e saudável", refere a APAV..Os números continuam a revelar aquilo que a pandemia escondeu durante dois anos. Neste caso, é a violência contra os os idosos, mais precisamente daqueles que se encontram em casa, aos cuidados de familiares. Em 2021, o serviço da linha SOS Pessoa Idosa, da Fundação Bissaya Barreto, contabilizou um total de 1812 contactos telefónicos, e-mails e articulações interinstitucionais, o que significa o dobro do que ocorrera no ano anterior..Desde o início de 2022 e até ao final do verão, os pedidos de ajuda recebidos deram origem à abertura de 244 processos internos, "que obrigaram ao acompanhamento frequente e intervenção, bem como a articulações interserviços", refere uma nota que acompanha um relatório daquela instituição, sediada em Coimbra.."As denúncias foram realizadas por e-mail/formulário (52,5%), por telefone (47%) e presencialmente (0,5%)", acrescenta o mesmo documento.."O que verificamos é um aumento de pessoas idosas que são vítimas a residir com familiares - e é uma diferença significativa", confirma ao DN Marta Ferreira, uma das técnicas responsáveis pelo serviço. "Anteriormente o número mais elevado dirigia-se a pessoas a residirem sozinhas. Esta residência partilhada nós cremos que pode ficar a dever-se à pandemia e ao encerramento temporário de alguns serviços, como os Centros de Dia - que fez com que filhos se mobilizassem para casa dos pais ou que contratassem cuidadores para minimizar os danos do contexto pandémico -, e de algum encerramento temporário de serviços de apoio, que são fundamentais para pessoas nestas idades". E aquilo que deveria ter sido benéfico, como a convivência com os familiares, acabou por se revelar o contrário.."Por outro lado, quando as pessoas já estão a iniciar um quadro de demência, os profissionais que realizam todo o apoio - que nem sequer é profissionalizado - muitas vezes notam que temos por trás desta violência situações de cansaço do cuidador, prevalência elevada de dependência física e situações de saúde mental", sublinha Marta Ferreira..A responsável lembra que, em anos anteriores, a linha registava um elevado número de mulheres em situação de viuvez. "Aqui, no caso das mulheres casadas, não se refere propriamente a situação de violência conjugal, mas sim o facto de termos enquadrada a categoria de casal como vítimas.".Secundando Lisboa, Setúbal passou a ser o distrito com mais denúncia de casos, ultrapassando o Distrito do Porto. O serviço da Fundação Bissaya Barreto considera que tal fica a dever-se "ao facto de termos uma comunicação muito fácil com as entidades locais, comparativamente com outras zonas do país. E acreditamos que este passa-a-palavra pode ter tido bons resultados em edições anteriores, e que este aumento do número de casos é também pela facilidade que as pessoas têm em denunciá-los, beneficiando por terem visto ou por terem sabido de outras situações bem resolvidas. Temos um grande apoio por parte da PSP e da GNR (do Apoio 65) que fazem aqui um bom acompanhamento", considera..O serviço existe desde maio de 2014. Marta Ferreira nota o aumento de casos denunciados, paulatinamente, ao longo dos anos. "Temos feito alguma alteração nas estratégias de intervenção, porque estamos no terreno e começamos a perceber o que é que resulta melhor. E no caso das pessoas idosas estes casos têm de ser tratados de forma muito personalizada e muito especial. Temos tentado aprimorar e fazer uma intervenção personalizada a quem precisa de ajuda. É a grande diferença ao longo dos anos", sublinha Marta, que integra uma equipa constituída por psicólogas, assistentes sociais, e uma psicogerontóloga..Muitas situações de violência são continuadas no tempo, "e às vezes por parte de filhos". Não raramente, são famílias "multiproblemáticas, com problemas de saúde mental, alcoolismo ou toxicodependência", lembra a responsável..dnot@dn.pt