Protestos substituem cortejos dos blocos de Carnaval em Lisboa
Há dez anos que a comunidade brasileira organiza cortejos de blocos carnavalescos em Lisboa.

Protestos substituem cortejos dos blocos de Carnaval em Lisboa

Os blocos carnavalescos não conseguem pagar o policiamento e os seguros exigidos para os desfiles. Dos 12 cortejos previstos só um irá acontecer. Os foliões vão protestar.
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A comunidade brasileira, a maior presente em Portugal, organiza há dez anos cortejos de blocos carnavalescos na cidade de Lisboa. Só que, se até 2020 estes desfiles eram considerados “manifestações” e bastava serem autorizados pela PSP e pela câmara municipal de Lisboa (CML), desde então  que o entendimento jurídico da polícia enquadra-os como “eventos festivos”. Tudo estaria bem, não fossem os custos que esta mudança acarreta. “Estamos, desde julho, a debater com a CML um projeto para o licenciamento do Carnaval”, começa por explicar Miguel Dores, membro do bloco ‘Baque do Tejo’ e da Associação de Blocos de Carnaval de Lisboa. “Ao longo deste processo juntaram-se várias exigências, sejam seguros de acidentes de responsabilidade civil e acidentes pessoais, além do policiamento de contenção da ordem pública e cortes de estrada. À última hora, também houve a exigência de colocação de casas de banho, pelas juntas de freguesia, e nós não temos qualquer orçamento em mãos. Então, decidimos cancelar quase todos os eventos”, revela este elemento da Associação de Blocos de Carnaval de Lisboa. 


Este ano, o Carnaval será mais pobre na capital. “Dos 12 desfiles que estavam previstos só o do bloco ‘Qui nem Jilo’ está assegurado porque tem o apoio da Junta de Freguesia da Penha de França”. Quanto aos restantes, há quem opte por manifestações de protesto. “O ‘Baque do Tejo’ já entregou um pré-aviso e vai fazer uma manifestação.  O mote  é simples: “Vamos fazer um protesto pela incapacidade de definição de uma política para o Carnaval”. Isto porque os foliões entendem que os cortejos de Carnaval não devem estar sujeitos a custos com seguros e policiamento. “Entendemos que o Carnaval se trata de uma manifestação cultural, de uma comunidade imigrante que tem um caráter político, uma presença no espaço público, de  reivindicação ao direito à cidade e ao uso da cidade por esta comunidade imigrante. O mote do nosso protesto é contra a gentrificação e a privatização do espaço público”.  O ‘Baque do Tejo’ não será o único bloco carnavalesco a protestar. “A Columbina Clandestina vai, também, fazer um protesto no sábado”, informa Miguel Dores.  

Segundo Andrea Freitas, diretora e fundadora do bloco ‘Colombina Clandestina’, considerado o maior da Europa, é o terceiro ano que as licenças são dadas “em cima da hora”. Por isso, no verão  de 2023, os blocos iniciaram o diálogo com a CML para que fosse diferente neste ano. “Mas está até pior. Não temos tido apoio, apesar de fazer tudo da nossa parte”, explica. Conforme a diretora, a situação gera “um stress e desgaste enorme”, porque se trata da responsabilidade com a comunidade. “Se as ruas ficam sujas, parece que é nossa culpa, sendo que temos feito tudo para que tudo corra bem”, argumenta. Andrea diz estar também preocupada com a imagem do bloco, para evitar que os participantes sejam vistos como “arruaceiros” e levem com xenofobia.


Karlla Tavares, fundadora do bloco ‘Viemos do Egyto’, cancelou o cortejo pela demora da PSP e da CML em enviar as licenças. “Não tem como se organizar e sair para a  rua, se três dias antes não aprovam”, pontua. Assim como Andrea, a brasileira fez parte dos diálogo com as autoridades para evitar o atraso, mas em vão. “A ansiedade fica a mil”, resume. E, perante tudo isto, também o bloco ‘Viemos do Egyto’, assim como o ‘Blocu’, irão fazer protestos na terça-feira gorda.


Alguns blocos, por sua vez, “irão fazer eventos em espaços fechados. Desistimos de fazer Carnaval de rua”, adenda Júlio Brechó, do bloco ‘Lisbloco’. Mais um que está a organizar um protesto. “Vamos fazer uma manifestação na semana seguinte ao Carnaval, o pré-aviso será entregue na segunda-feira, dia 12”. Júlio Brechó explica que a comunidade brasileira não quer transformar o Carnaval “num evento comercial, com o recurso a patrocínios. Fizemos tentativas de financiamento junto da embaixada do Brasil e da Casa do Brasil, mas teria de ser feito antes. Em cima da hora, estas instituições indicaram-nos não ter orçamento disponível. O Carnaval está ameaçado embora seja uma importante expressão cultural da nossa comunidade mas também de toda a lusofonia”.


Com AMANDA LIMA

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