Prevenção Rodoviária estuda risco de acidentes por uso de auriculares
Caso das duas raparigas colhidas por comboio quando iam a ouvir música foi o último de vários acidentes do género
A Prevenção Rodoviária Portuguesa (PRP) vai divulgar em breve um estudo que está a fazer sobre o atravessamento das vias pelos peões quando vão com auriculares a ouvir música ou rádio ou simplesmente a falar ou a enviar mensagens pelo telemóvel. Segundo adiantou o presidente da PRP ao DN, o estudo incide num conjunto de observações que serão também estendidas aos condutores. "Concluímos que as pessoas ao volante usam muito mais o telemóvel e outros meios quando vão sozinhas do que acompanhadas", exemplifica José Miguel Trigoso.
O caso das duas adolescentes, com 13 e 14 anos, que morreram esta semana colhidas por um comboio na Linha do Norte quando iam, alegadamente, com os auriculares a ouvir música, é o último de uma sucessão de acidentes do género nos últimos anos. Ou seja, de peões colhidos pelo comboio ou pelo metro porque vão distráidos com auscultadores ou telemóveis.
O uso dos telemóveis pelos condutores é uma contraordenação grave. Mas o mesmo comportamento pelos peões que atravessam as ruas ainda não é punido com multa. "A distração dos peões é auditiva e visual, quando estão com auriculares ou a olhar para o telemóvel. É um problema particularmente grave, também nos condutores. Mas não me parece que se deva legislar sobre isto. Os peões têm de se convencer de que este comportamento representa um grande risco", refere José Miguel Trigoso.
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Ainda não houve uma campanha de prevenção em Portugal a alertar para o perigo de acidente que representa ter peões distraídos com meios tecnológicos.Mas o risco é bem real. Um estudo do Metro do Porto revelou que metade dos atropelados pelas composições em 2011 levava auscultadores ou falava ao telemóvel. E as vítimas foram sobretudo jovens ou adolescentes. Nos conselhos que a GNR costuma divulgar aos peregrinos que se deslocam a pé a Fátima consta sempre a recomendação de "não usar auscultadores de rádio nem o telemóvel enquanto se caminha na estrada".
Nos últimos anos houve mais acidentes causados por distração como o que vitimou as duas adolescentes. Para referir apenas alguns casos, em 2012, um jovem de 17 anos vinha da praia a ouvir música com os auriculares nos ouvidos quando foi colhido por um comboio quando atravessava a linha, na estação da Cruz Quebrada (Oeiras). Já este ano, a 1 de setembro, uma rapariga de 16 anos, ia distraída ao telemóvel quando foi atropelada mortalmente por um comboio, em Portimão, no Algarve.
João Dias, do Núcleo de Investigação de Acidentes do Instituto Superior Técnico, lembra que "o Código da Estrada aplica-se a condutores ou a peões no atravessamento das vias", o que exclui as linhas férreas ou o Metro, por exemplo. "Há muito mais peões atropelados por condutores a usarem telemóveis do que por irem distraídos com esses aparelhos a atravessar a via. Mas é sem dúvida um grande risco para os dois e as campanhas de prevenção são muito importantes". O investigador também não vê vantagens na classificação desta conduta dos peões como contraordenação.
José Miguel Trigoso sublinha outro aspeto relevante: o uso do telemóvel em alta voz pelos condutores nem sequer é infração. "Mas o risco é igual e todos os estudos provam isso". João Dias acrescenta, a este propósito, que "há estudos que demonstram que o uso do kit mãos livres é mais perigoso do que estar a segurar o telemóvel e a conduzir. O problema não é a ocupação das mãos mas do cérebro. Quando os condutores usam o kit mãos livres fazem mais chamadas e estas duram mais tempo".