Prémio Gulbenkian distingue trabalho científico sobre clima e biodiversidade

Vencedores do Prémio Gulbenkian para a Humanidade foram anunciados na manhã desta quinta-feira pela ex-chanceler alemã Angela Merkel. Galardão foi atribuído a duas organizações intergovernamentais.
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A Plataforma Intergovernamental Ciência-Política sobre Biodiversidade e Serviços do Ecossistema (IPBES) e o Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC) são os vencedores ex-aequo da terceira edição do Prémio Gulbenkian para a Humanidade, no valor de um milhão de euros. Um reconhecimento ao trabalho científico sobre a crise climática e a destruição de ecossistemas, o cerne da atividade das duas instituições.

O anúncio foi feito na manhã desta quinta-feira pela ex-chanceler alemã Angela Merkel, presidente do júri, em conferência de imprensa na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.

A IPBES foi criada em 2012 e dedica-se às questões da biodiversidade e proteção dos ecossistemas. É um organismo intergovernamental independente criado com o objetivo de melhorar a comunicação entre o conhecimento científico e os decisores, fortalecendo o conhecimento para promover decisões políticas mais informadas.

Já o IPCC - organização que foi galardoada em 2007 com o prémio Nobel da Paz, a par de Al Gore - é o organismo das Nações Unidas que promove a criação de conhecimento científico na área do clima e que tem acompanhado de perto, com relatórios regulares, os impactos climáticos da ação humana e a implementação de medidas de combate à crise climática.

Duas organizações que, para o júri, se têm destacado na "promoção da relação entre ciência, clima, biodiversidade e sociedade, representando o melhor que se faz nesta área, em todo o mundo".

Na conferência de imprensa de anúncio dos vencedores, Angela Merkel destacou a importância do conhecimento científico para as decisões políticas e a necessidade de "agir em conjunto", com uma "ação que tem de ser palpável".

A ex-chanceler, que dirigiu os destinos da Alemanha durante 16 anos, destacou a urgência de agir nos dois planos que foram hoje distinguidos - "Temos de lutar contra as alterações climáticas, temos de proteger os animais e as plantas. Fazemos parte deste ecossistema, não estamos acima".

Se a guerra na Ucrânia veio dominar as atenções mundiais, e se a ajuda aos ucranianos deve ser uma prioridade, Merkel defende que "não podemos perder de vista outras prioridades, todos os outros temas não desapareceram, antes pelo contrário" - e "todos os países do mundo têm de prestar o seu contributo".

Questionada sobre as decisões que tomou enquanto chanceler, nomeadamente quanto à dependência alemã do gás russo, Angela Merkel disse não querer intervir nas questões atuais, mas acrescentou também que não lamenta as suas decisões. "Agimos sempre no tempo em que estamos, para nós na altura foi claro que haveria uma transformação em todo o abastecimento da energia" - o recurso ao gás natural fez parte de um caminho para "chegar a fontes de energia livres" de carbono, e o gás russo surgiu como a opção natural. "Desde a Guerra Fria que a Rússia era um fornecedor confiável de energia", disse Merkel, acrescentando que o "assalto brutal" da à Ucrânia mudou este cenário, com o qual o novo governo alemão tem agora de lidar.

Na conferência de imprensa estiveram também representantes das duas instituições premiadas. Hoesung Lee, presidente do IPCC, sustentou que o mundo está num "momento crítico" para atingir os objetivos estabelecidos em 2015 no Acordo de Paris e precisa de "trabalhar muito depressa" para travar as alterações climáticas e o aquecimento global: "Precisamos de agir".

Também Anne Larigauderie, secretária executiva do IPBES, defendeu que a janela de oportunidade é agora. "Quanto tempo temos? Até quando, até tudo colapsar?", questionou. E deu a resposta: "Não temos nenhum tempo, já estamos numa situação em que não devíamos estar". "Já estamos a ter muitos impactos negativos que estão a afetar a nossa vida", sublinhou a responsável da organização premiada, defendendo que o norte global tem de ajudar os países em desenvolvimento, dado que são estes que ainda concentram a maior parte da biodiversidade mundial.

Com este galardão, o IPBES e o IPCC - que foram selecionados de um grupo inicial de 116 nomeações de 41 nacionalidades - juntam-se a Greta Thunberg, vencedora da primeira edição do Prémio Gulbenkian para a Humanidade, em 2020, e que então anunciou a entrega do montante de um milhão de euros a projetos de combate à crise climática e ecológica, particularmente a sul do globo, por forma a ajudar os que enfrentam os piores impactos da crise climática.

Na segunda edição, em 2021, o prémio foi entregue ao Pacto de Autarcas para o Clima e a Energia, a maior aliança global para a liderança climática das cidades, constituída por mais de 10 600 cidades e governos locais de 140 países, incluindo Portugal. O prémio foi destinado ao financiamento de projetos em cinco cidades no Senegal (fornecimento de água potável) e numa cidade nos Camarões (desenvolvimento de soluções de eficiência energética), escolhidas por acordo entre a fundação e a entidade premiada.

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