Quais são as áreas da Unidade Nacional Contra o Terrorismo? Temos três secções de investigação: uma de combate ao terrorismo e duas dedicadas ao chamado banditismo, que investiga não só as matérias do tráfico humano, auxílio à imigração ilegal, mas também tráfico de armas, assaltos à mão armada, etc. Com a extinção do SEF, não podemos deixar de caminhar no sentido de criar uma unidade específica para estas matérias relacionadas com a imigração..Houve contactos dos responsáveis das duas estruturas? Não..Quantas investigações a PJ tem a decorrer nesta área? Temos 120 investigações a nível nacional sobre tráfico de seres humanos, com centenas de vítimas. Também é verdade que há inquéritos que chegam à polícia como tráfico e que não se concretizam, mas temos de perceber se se confirma ou não..Já sentem no volume de trabalho os reflexos da extinção do SEF? Nota-se um aumento das situações - entraram 37 inquéritos em 2022 [uma média de mais 15 que em anos anteriores], mas a população está mais sensibilizada e as próprias vítimas, que podem fazer a denúncia de forma anónima (https://www.policiajudiciaria.pt/form/denuncia.php). Temos de perceber se este aumento resulta do facto de haver mais denúncias ou se tem a ver com o facto do MP estar a delegar mais na PJ. É um conjunto das duas coisas..Quantos inspetores tem a equipa? 30 inspetores dedicados a estas matérias e as secções regionais..Os inspetores do SEF que vierem, ficarão com estas matérias, uma vez que estão mais habituados? Não é que estejamos menos habituados, porque a PJ sempre investigou estes casos. O SEF tem acesso a outras informações que teremos que ter, que é a base de dados. Precisamos sempre de recorrer ao SEF, sobretudo para as questões do auxílio à imigração. Como o SEF tem a componente de fiscalização, muitas vezes, não faz necessariamente investigação - identifica as situações..A base de dados deverá ficar na nova agência para as migrações? A nova entidade terá que absorver as funções do SEF na emissão de autorização de residência, etc, mas uma coisa não invalida a outra. Essas bases de dados também são importantes para fins de investigação..O que é que falta na investigação? São muitas situações para investigar e, às vezes, uma investigação implicava afetar uma brigada, ou uma secção inteira e, como há muitas ao mesmo tempo, isso é inviável. Cada vez mais, temos de nos especializar nesta matéria, que começa a ser muito diversificada, com muitos intervenientes. O ideal era conseguirmos fazê-lo com outra cadência..Como é que chegam às situações? Muitas vezes são denúncias, não fazemos fiscalização, tudo o que envolva cidadãos estrangeiros, o SEF tem a capacidade de fiscalizar. Denúncias anónimas, até das próprias vítimas que não tiveram coragem de o fazer enquanto lá trabalhavam. São meses de investigação com recurso a meios de obtenção de prova que a lei prevê. Pedimos ao Ministério Público que promova junto do juiz a emissão de mandados de busca domiciliária e de detenção, só no dia em que se cumprem é que é possível avançar para as vítimas. Estamos a falar de cidadãos estrangeiros, o que implica o recurso a tradutores que têm de ser de confiança..Uma mega-operação decorreu em outubro em Beja - 35 detidos, 31 estão em prisão preventiva e mais de 300 vítimas - foi a maior da PJ? Foi das operações mais relevantes nos últimos tempos pela sua dimensão quanto aos atores e em relação às vítimas, e até pelos meios policiais envolvidos, mas ainda decorre a investigação e não posso concretizar. As pessoas vão trabalhar para os campos muito cedo e tivemos que as abordar antes que saíssem de casa. Não podemos ouvir logo toda a gente mas temos de ouvir as suficientes para demonstrar os factos e temos um prazo 48 para apresentar os detidos ao juiz..Costumam colaborar? É complicado falarem, apesar de termos o cuidado de só as ouvir depois da operação, até porque as vítimas estão fisicamente dependentes dos suspeitos, que acabamos por identificar e deter. Depois, querem continuar a trabalhar, precisam de um rendimento, inclusive para enviar para as famílias. A própria vítima muitas vezes não se sente vítima. Vêm de situações tão más, tão críticas, nos seus países de origem, que se sujeitam - não ter uma casa em condições, não ter casas de banho, não é para elas preocupante. Em países como o Paquistão, a Índia, há muita miséria. Receber 200 ou 300 euros por mês, se conseguirem mandar para os seus países 100 euros, se calhar, dá para viver um mês. Não querem nada a ver com a polícia nem com os tribunais..Quem são os exploradores? São angariadores de mão-de-obra subcontratados pelo dono da exploração agrícola, empresas que são criadas na hora, o que é uma facilidade do nosso sistema e há quem se aproveite. Recebem um pagamento que entregam aos trabalhadores. Mas grande parte desse ordenado vai ser consumido no pagamento do alojamento (embora seja miserável na maior parte das vezes) e outras despesas. Depois, os imigrantes têm uma dívida pelo facto de os terem trazido. Às vezes estamos a falar de muitos milhares de euros, pode ir até 10 mil euros ou mais, que é o valor que a organização cobra por cada trabalhador..Os proprietários das explorações agrícolas que recorrem a esses intermediários são penalizadas? Estamos a trabalhar nisso, embora não seja crime. Contratam uma empresa que existe legalmente e dizem: "precisamos de 20 homens para a apanha da azeitona" e a empresa fornece. Agora, em meios pequenos, sobretudo com a publicidade que tem vindo a lume sobre as condições em que estão aqueles trabalhadores, essas empresas têm noção do que se passa. São responsáveis pelas condições daquelas pessoas enquanto trabalham ali..Porque é que são identificadas menos vítimas de exploração sexual? A nossa experiência é que a maior parte das mulheres são perentórias em dizer que estão ali porque querem, ninguém as controla, que não dão dinheiro a ninguém.