Pré-publicação. Saúde pública em Portugal, o novo livro de Francisco George

Saúde pública em Portugal - Do século XIX ao novo millennium até ao futuro é o novo livro de Francisco George.

Apontamento sobre Ricardo Jorge

Ricardo Almeida Jorge nasce no Porto em 1858 e morre em Lisboa em 1939. É, reconhecidamente, uma personalidade multifacetada. Médico, professor, pedagogo, cientista, investigador, ensaísta, historiador, prosador e poeta. Universalista em oposição a provinciano. Homem de Ciências e de Letras. Polemista temido. Cultiva a cultura e interessa-se por Arte e Linguística. Admirado por amigos e respeitado por adversários.

Ficou célebre a polémica de Ricardo Jorge com Teófilo Braga. Bem ao seu estilo de polemista, Ricardo, em 1917, acusa Teófilo de plágio, considerando os seus trabalhos "escritos sem forma, pedantices mesquinhas, redes de contradições, suposições fantasistas, castelos de cartas, estilo de pomposa inanidade, álbum de retalhos, cesto de papéis velhos, etc. Que mais dizer?"

Uma biografia completa ainda não apareceu. Muitos, porém, têm escrito sobre a sua vida e personalidade. O médico e ensaísta Eduardo Coelho considera-o "homem culto, de espírito crítico penetrante, manejando conhecimentos vastíssimos com uma liberdade de pensamento notável".

Formado pela Escola Médico-Cirúrgica do Porto, a partir de 1892 funda e dirige o Laboratório Municipal que assinala a sua dedicação à investigação.

Ricardo Jorge representou, desde 1912, Portugal no Office Internacional de Higiene Pública (OIHP), com sede em Paris, mesmo depois de aposentado e até à sua morte. Neste contexto, foi membro e presidente do Comité de Higiene da Sociedade das Nações. Sabedor, competente e fluente na língua francesa, a sua presença nos meios internacionais é muito apreciada.

Ao longo da sua vida, eleva a Higiene e a Saúde Pública a patamares muito altos, quer ao nível nacional quer internacional.

Primeiro como médico municipal do Porto, depois, já em Lisboa, como inspetor-geral dos Serviços Sanitários e, a partir de 1911, como diretor-geral de Saúde, nomeado pelo Governo Provisório da República por proposta de António José de Almeida.

A ele se deve o desenho e a construção da Reforma da Saúde Pública, numa perspetiva de modernidade.

A Escola Ricardina, multidimensional, marca o tempo da Modernização da Saúde Pública em Portugal.

Ricardo Jorge morre em 1939, no tempo do final da Guerra Civil de Espanha e nas vésperas das atrocidades da II Guerra. Nesse ano, Salazar coloca Portugal neutral e governa em regime ditatorial, apesar de a Constituição de 1933 instituir a Assembleia Nacional.

Antecipar, preparar e construir o futuro

O futuro, para proteger a saúde das novas gerações, impõe, antes de mais, o desenvolvimento interdisciplinar da Saúde Pública, quer ao nível do Estado quer de outros setores, incluindo a sociedade civil. Pressupõe uma agenda ambiciosa, fundamentada em novos conhecimentos científicos e tecnologias inovadoras, que assentam nos progressos evolutivos, tanto da medicina preventiva e da medicina baseada na comprovação científica, como da medicina preditiva e, ainda, da medicina de translação. Progressos traduzidos pela modernização permanente da produção farmacêutica e, também, em resultado de métodos fundamentados em informações genómicas (medicina preditiva), bem como na utilização de Inteligência Artificial.

Naturalmente, este contexto contempla a organização e gestão do Sistema de Saúde, que tem como núcleo central o Serviço Nacional de Saúde, como componente financiada pelo Orçamento do Estado, nos termos constitucionais. Sublinha-se que o financiamento público do SNS tem crescido nos últimos cinco anos: para 2018 era 9 mil milhões de euros e para 2023 eleva-se a 15 mil milhões.

A monitorização remota de marcadores possibilita tratar doentes com condições crónicas fora dos hospitais.

A aplicação de Inteligência Artificial para o benefício do bem comum e da Saúde Pública, em particular, exige, ainda, a consideração de fatores específicos da saúde e a observação de princípios de ética: não-discriminação, centralidade no cidadão e corresponsabilidade.

A antecipação de riscos associados a decisões apoiadas por sistemas com diferentes tipos de autonomia só pode ser conseguida com laboratórios reais para demonstração de valor quanto à sua robustez técnica, mas, também, adequação social.

Importa que este desafio seja considerado pelos governantes como um domínio de direito próprio, quer na política quer no planeamento, na perspetiva da preparação do ecossistema apropriado para incorporar a Inteligência Artificial no Serviço Nacional de Saúde.

Neste "novo mundo" são as unidades de Saúde Pública do Serviço Nacional de Saúde, particularmente os médicos especialistas em Saúde Pública, a participarem no processo de monitorização remota de marcadores digitais referentes a pessoas aparentemente saudáveis ou de doentes, no âmbito das ações de prevenção secundária que desenvolvem.

Erros antropogénicos, como os cometidos no passado recente, a partir de 1850, não podem voltar a acontecer como no passado recente, nomeadamente: as indústrias poluentes que estão na origem do aquecimento global ou a produção descontrolada de poluentes químicos, ou, ainda, a urbanização sem regras, mas também os conflitos devastadores como a I Guerra Mundial de 1914-1918, Espanha 1936-1939, a II Mundial 1939-1945 (com duas bombas atómicas), Coreia, Israel, Palestina, Vietname, África, Balcãs, Iraque, Síria, Líbia, Afeganistão ou Rússia-Ucrânia.

Para assegurar o futuro, é agora que interessa fazer certo. Repete-se que é agora. As políticas, como as medidas tomadas por cada setor, devem, previamente, equacionar a eventualidade de serem geradoras de riscos para o futuro, mesmo que beneficiem o presente.

Para tal, há que observar, antes de tudo, como princípio maior: nada fazer, hoje, se prejudicar a saúde de quem vem a seguir.

Só assim aqueles que irão nascer a partir de 2023 poderão ter uma vida prolongada, com qualidade e saúde.

É uma questão de herança que os de hoje deixam aos de amanhã. Legado que depende, sobretudo, das opções tomadas pelos cidadãos e pelos governantes que os representam.

Por outro lado, há que agir a pensar global, a todos os níveis. Os países pobres contam, tanto no que respeita à compensação de medidas de adaptação da redução do carbono, como no processo de imunização da população, para esta ou aquela pandemia.

À semelhança dos gases poluentes que fazem efeito em todo o planeta, também um foco de doença transmissível, em aldeia remota de qualquer país, pode assumir característica pandémica.

Naturalmente, a herança a transmitir aos filhos e netos dos cidadãos de hoje não pode prejudicar a situação ambiental no futuro.

Por isso, há que agir a pensar no planeta Terra. Só há um.

Saúde Pública em Portugal
Francisco George
Almedina
188 páginas

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