Robson Souza trabalhou na Polícia Militar (PM) no Brasil durante 30 anos. Quando ainda era operacional, já se dedicava à investigação académica. Numa destas pesquisas, para a pós-gradução em Inteligência de Estado e Inteligência de Segurança Pública, conseguiu identificar 21 foragidos da Justiça no Brasil - criminosos que, depois, foram presos. Ao passar à reforma, mu- dou-se para Portugal, onde fez mestrado em Direito na Universidade de Lisboa. O ex-polícia identificou falhas de segurança, nomeadamente nos registos criminais de brasileiros, e propôs num documento formas de prevenir e coibir estas falhas. Desde 2020, alega que tenta o contacto com as autoridades portuguesas para mostrar as soluções para o problema. No entanto, relata ao DN que não é dada atenção ao alerta que faz publicamente. .“Eu tentei, mas, infelizmente, não tive nenhum retorno, não tive nenhuma oportunidade no Governo anterior”, sublinha Robson Souza em referência ao Executivo do Partido Socialista (PS). Na atual gestão, afirma que conseguiu “apenas uma conversa reservada” com fonte do Ministério da Justiça, no início de setembro. “Nós conversámos, mandei os arquivos, mostraram muito interesse, tivemos um encontro e, na altura, pude esclarecer todas essas questões. Mas, infelizmente, depois, eu não tive mais retorno. Até porque acredito que essa autoridade também não está no nível decisório”, conta o investigador ao DN..A totalidade do conteúdo, por ser sensível, ficou sob reserva durante três anos. Mesmo assim, Robson falou publicamente sobre as linhas gerais da investigação, sendo entrevistado pelo DN e outros jornais várias vezes. Agora, a tese já é pública, mas, segundo Robson, continua sem a devida atenção..Na visão do ex-polícia, o tema é de “extrema importância” neste momento, em que o Governo sinaliza querer fortalecer as medidas de segurança no país. “Portugal é um país seguro, um dos países mais seguros do mundo. O Governo está empenhado em cumprir o seu programa e proteger os direitos fundamentais dos cidadãos, a tranquilidade pública e o sentimento de segurança”, anunciou esta semana o primeiro-ministro Luís Montenegro..Risco.Segundo Robson Souza, o risco da entrada em Portugal de fugitivos da Justiça brasileira “é real”. Isto porque, a certidãoatestando que “nada consta”, exigida para obtenção de visto ou título de residência em Portugal, não analisa mandados de captura..No entanto, estes dados estão disponíveis no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP) do Conselho Nacional de Justiça (CNE), uma instituição pública do poder judiciário brasileiro. De acordo com o ex-polícia, esta base de dados é “atualizada, muito bem estruturada e confiável”..Ao não se consultar o BNMP, Robson alerta que é possível alguém ter um mandado de captura em aberto e, mesmo assim, conseguir a certidão negativa necessária para o pedido de visto ou título de residência. O próprio investigador realizou simulações e conseguiu obter a declaração “nada consta” de criminosos na lista de foragidos..Para o ex-polícia, a articulação das autoridades portuguesas com as brasileiras é importante para criar o que define como “filtros de segurança”. Na tese, sugere que esta articulação pode ser feita ao abrigo de acordos de cooperação entre os dois países, a exemplo de outros já existentes..Criminalidade x imigração.Segundo Robson Souza, o alerta não tem o objetivo de associar imigração e criminalidade, porque “segundo os dados oficiais, a grande maioria dos nossos compatriotas vem para trabalhar e somar ao país”. Ao mesmo tempo, ressalta que pode existir “uma pequena minoria” que cometa crimes em Portugal..O investigador não descarta ir-se embora de Portugal, por sentir que o país não dá a devida atenção ao assunto, que envolve a segurança interna e até mesmo da União Europeia (UE). Está confirmado oficialmente, por exemplo, por autoridades portuguesas e brasileiras que já estão em território português membros de fações criminosas de grande porte, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV)..“Do lado da minha pesquisa, eu sinto-me muito satisfeito com o resultado. Por outro lado, sinto tristeza por essa falta de interesse em resolver um problema”, explica o brasileiro. Mesmo após a defesa e aprovação da tese, ele continuou a investigar o assunto e a escrever artigos académicos. .Um destes textos foi selecionado para apresentação num evento nos Estados Unidos. Robson não descarta mudar-se para lá, onde acredita que poderá ter mais meios e atenção para a área que investiga. Outra opção em cima da mesa é voltar ao Brasil e dedicar-se à advocacia. amanda.lima@dn.pt