Na sua intervenção na conferência deteve-se no tema do sistema público de pensões. Neste particular, olhou para os desafios de novos percursos, para além da linha cronológica que nos leva da educação ao trabalho e, deste, à reforma. Que reformas ou soluções específicas podem ser avaliadas para adaptar o sistema público de pensões a percursos de vida mais flexíveis?Dentro da intenção de permitir percursos de vida mais flexíveis, o sistema de contribuições deverá ter flexibilidade para acomodar períodos de menores contribuições, compensadas com períodos de maiores contribuições. O período de requalificação não deverá ser, por si só, um elemento de penalização do valor da pensão. Numa versão mais ousada, a contribuição para a segurança social poderá conter uma pequena fração destinada a ser usada para rendimento durante períodos de requalificação, como uma conta poupança-formação, como forma de evitar quebras de rendimento excessivas associadas com esse momento. Envolve ter componente de capitalização com a componente de repartição atualmente existente. Ter como ponto de partida estes dois elementos de revisão do atual sistema é a minha sugestão. Uma abordagem que também o deteve prende-se à questão do trabalho após os 70 anos. É possível e desejável trabalhar além desta idade? É claramente possível em muitas profissões continuar a trabalhar depois dos 70 anos, sendo até associado à manutenção de uma vida ativa favorável a melhor saúde. Não será é uma atividade laboral tão intensa como anteriormente, nem obrigatória. Em termos das organizações, empresas e outras entidades, o envolvimento ainda que a tempo parcial de pessoas com mais experiência e conhecimento tem-se revelado um fator positivo, e não são impedimento para o emprego das gerações mais novas. As pessoas de idade mais avançada exercem cargos diferentes, podendo inclusivamente atuar como mentores e transmissores de conhecimento e da ética de cada entidade. Em entrevistas anteriores desmentiu a ideia de que o envelhecimento da população agrava as despesas em saúde. Se assim não é, porque mantemos esta narrativa? Existem interesses ou dinâmicas específicas que a sustentam? De forma mais exata, o que desminto é a ideia de o envelhecimento da população ser o principal fator de agravamento das despesas em saúde. Haver mais pessoas com idade mais avançada levará a mais despesas de saúde. Contudo, o efeito do elemento demográfico é pequeno face a outros efeitos, nomeadamente os efeitos associados à evolução tecnológica. Desenvolver novas terapêuticas, novas intervenções, destinadas à população idosa, crescente em número, é um efeito de crescimento de custos que tem de ser classificado como inovação e não como consequência inevitável de ter uma população mais idosa. A diferença crucial é que o acréscimo de despesas de saúde devido ao envelhecimento da população, usando as opções terapêuticas existentes, é socialmente inevitável. Não se deixará de tratar as pessoas, qualquer que seja a sua idade. Por sua vez, o acréscimo de despesas por inovação pode, e deve, ser discutido nas vantagens terapêuticas que traz e nos preços associados, nomeadamente custos para os pagadores de cuidados de saúde. Pode por isso ser controlado e até decidir-se não se introduzir algumas inovações que tragam pouco ou nenhum valor terapêutico adicional. A capacidade de aturar, e eventualmente controlar, o crescimento das despesas de saúde será maior neste último caso.O aumento da longevidade tenderá a gerar uma maior procura por profissionais de saúde. Que estratégias podem ser implementadas para atrair mais trabalhadores para estas profissões e garantir condições salariais adequadas, mantendo a sustentabilidade do setor?Temos em curso uma transformação importante nos cuidados necessários dispensados a pessoas de idade avançada. Há uma necessidade crescente de cuidados a serem prestados em casa das pessoas e associados com mobilidade ou a falta dela, atividades diárias, questões cognitivas, entre outras. Havendo mais pessoas a precisar de mais cuidados, os cuidadores informais tenderão a ser substituídos. Uma parte do acompanhamento poderá ser passada para tecnologia, nomeadamente na monitorização. Contudo, muitas tarefas desses cuidados continuarão, previsivelmente, a serem prestados por pessoas. Assim, considerações de remuneração serão importantes, e é natural que se venha a pagar mais por estas tarefas, tal como é provável que venham a surgir novas profissões de saúde ou de cuidado social associadas com estas necessidades. O papel dos cuidados sociais promovidos ou organizados por autarquias irá também ser crescente, e terá de ser coordenado com as atividades da Segurança Social e da área da Saúde. Há um novo mosaico de cuidados de apoio social e de saúde a ser construído. Ter uma identificação clara do que será esta procura e oferta de cuidados em idade avançada é o primeiro passo para se definir depois uma estratégia de intervenção. Existem alguns passos nessa direção, como o Plano de Ação do Envelhecimento Ativo e Saudável. Sublinhou na conferência que é necessário “ter organizações flexíveis” e “inovadoras”. Pode deixar-nos exemplos concretos de inovações e formas de flexibilidade organizacional que considera fundamentais para responder às necessidades impostas pela longevidade?Por organizações flexíveis, entendo aquelas que consigam dar apoio diferente a pessoas que, mesmo com necessidades similares, possam ter preferências diferentes sobre o que valorizam mais e menos. Por organizações inovadoras entendo aquelas que consigam introduzir novas formas de apoio, até mesmo uma nova cultura profissional, nas suas atividades. Um exemplo é a utilização de dispositivos de medição e apoio de funcionalidade física conjugados com fisioterapia por autocuidado ou com a presença de fisioterapeuta, consoante a necessidade identificada, e previsão e acompanhamento da evolução dessas necessidades. Ideia similar pode ser apresentada a propósito do acompanhamento do declínio cognitivo.