Os rótulos vão mudar outra vez, mas não chega. Nutricionistas pedem semáforos

Especialistas em nutrição defendem a utilização do vermelho, amarelo e verde para indicar se os alimentos têm concentrações elevadas, médias ou saudáveis de nutrientes como o sal, a gordura ou o açúcar

Se lhe perguntassem se um pacote de batatas fritas tem mais ou menos sal do que um pacote de tortitas de milho (bolachas com aspeto semelhante ao esferovite), o que responderia? Ao ler um rótulo dos que hoje passam a ser obrigatórios para quase todos os alimentos embalados descobre que um pacote de 170 gramas de batatas fritas tem 1,97 gramas de sal, enquanto um pacote de 130 gramas de tortitas tem 2,86 gramas de sal. Mas sabe se isso é muito ou pouco? Apesar de a declaração nutricional ser útil para os consumidores, os nutricionistas consideram que o ideal seria todos os alimentos terem um semáforo nutricional, que já é usado por algumas marcas e que, através de cores, indica se a concentração de nutrientes é ou não adequada.

A declaração nutricional inclui o valor energético dos alimentos, a quantidade de lípidos, ácidos gordos saturados, hidratos de carbono, açúcares, proteínas e sal e só não é obrigatória para suplementos alimentares, águas minerais naturais e bebidas com teor alcoólico superior a 1,2%. Vem indicada por 100 ml ou 100 g e, em alguns casos, os fabricantes expressam o valor por dose. Embora só seja exigida a partir de hoje, um grande número de produtos, como os que o DN analisou ontem (um pacote de batatas fritas da marca Pingo Doce e tortitas Biocentury), já tinha essas informações.

No exemplo dado, as tortitas têm mais de metade da quantidade máxima de sal recomendada por dia (cinco gramas), mas, se for analisado o valor energético e a quantidade de gordura, são uma opção mais saudável do que as batatas fritas, que têm 923 kcal, ou seja, quase metade do recomendado por dia para um adulto. "Isto revela a importância que tem a leitura dos rótulos", diz Nuno Borges, membro da direção da Associação Portuguesa de Nutricionistas. Embora aplauda a obrigatoriedade de incluir declarações nutricionais em todos os alimentos, o nutricionista considera que não é suficiente.

"A rotulagem é um passo fundamental para fazer melhores escolhas, mas não é suficiente. A literacia nutricional das pessoas não é suficiente para interpretar a informação. Tem de haver educação", destaca Nuno Borges. Para o nutricionista, seria importante qualificar os perfis dos alimentos com semáforos, o que já é feito por algumas empresas. De acordo com um estudo feito pela Deco, os consumidores preferem a apresentação dos nutrientes em forma de semáforo para os classificar. Os verdes são os mais saudáveis, os amarelos são uma opção saudável e os vermelhos devem ser consumidos ocasionalmente ou em quantidades reduzidas.

Na opinião da nutricionista Lillian Barros, a alteração dos rótulos introduzida em dezembro de 2014 (letra maior, apresentação obrigatória de alergénios, origem das carnes) veio "uniformizar" e tornar mais fácil a leitura dos rótulos. "Mas estes ainda causam confusão." Apesar de considerar a declaração nutricional "bastante útil", a nutricionista defende que o semáforo "seria mais útil e mais percetível". "A pessoa sabe que, se o alimento tiver muitos vermelhos, não é bom." Contudo, adianta, com as informações que agora são obrigatórias "os consumidores já podem comparar as quantidades de sal, açúcar e gorduras dos alimentos".

Custos para a indústria

Contactado pelo DN, Manuel Tarré, presidente da Associação Nacional de Comerciantes e Industriais de Produtos Alimentares (ANCIPA), adianta que "foram muitas as empresas que adotaram este regulamento de uma forma voluntária, com o objetivo de se adaptarem a normas que se iriam tornar obrigatórias". Segundo o representante, "a grande implicação desta obrigatoriedade são os custos no imediato associados à alteração da rotulagem". Embora reconheça a "pertinência de um consumidor esclarecido", considera que "há todo um trabalho ainda por fazer, nomeadamente ao nível da pedagogia e sensibilização do comportamento alimentar", até porque "a informação a constar nos rótulos é tão abundante e complexa que na maioria dos casos é indecifrável para o consumidor-padrão".

Paulo Leite, da Associação Nacional dos Industriais de Laticínios, destaca que, no caso do leite e dos iogurtes, os custos são bastante elevados, pois é necessário refazer embalagens. "São alterações que custam centenas de milhares de euros para as empresas." Numa altura de "crise no setor", Paulo Leite diz que as empresas estão "constantemente a responder a legislações de diversos lados" e fala em "insensibilidade" por parte do legislador. "Se for implementado o semáforo, é mais um custo."

Já Graça Calisto, secretária-geral da Associação do Comércio e da Indústria de Panificação, acredita que nem todos os produtos à venda hoje estão de acordo com a nova legislação: "Tenho a certeza de que muitas empresas não estão preparadas." Segundo a mesma, estas alterações têm "custos adicionais brutais" para os empresários, uma vez que para cada produto é necessária uma análise. "Cada uma custa entre 70 e cem euros."

Ao DN, fonte do Lidl adiantou que a cadeia "pauta-se pelo estrito cumprimento da lei e este caso não será exceção".

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