O último ano do Tua? Esporão tenta travar avanço da barragem
Apesar do avançado estado das obras da barragem de Foz Tua, os responsáveis pela Herdade do Esporão lançaram uma campanha que pretende evitar o enchimento da albufeira
"A barragem não nos vai trazer nada. [...] Preocupam-me as minhas vinhas, os meus filhos, o nosso futuro." As palavras são do viticultor Pedro Duarte no vídeo "A última vindima", um dos quatro minidocumentários que fazem parte da campanha "O último ano do Tua", produzida pelo grupo Esporão, em parceria com a Plataforma Salvar o Tua (PST). O objetivo é "sensibilizar a opinião pública para os efeitos devastadores e irreversíveis que a conclusão da barragem de Foz Tua [obra no distrito de Vila Real a cargo da EDP] irá provocar na paisagem, na qualidade de vida e no turismo da região".
Realizados por Jorge Pelicano, os documentários foram promovidos pelo grupo Esporão. Mas o que leva uma marca alentejana a defender uma paisagem transmontana? Desde logo porque a empresa é proprietária da Quinta dos Murças, no Alto Douro vinhateiro, desde 2008. Contactada pelo DN, Catarina Santos, responsável de marketing e comunicação do Esporão, explica que, além da sensibilização, a campanha "apela à ação de todos, para que enviem uma carta (via e-mail) aos membros do Comité do Património Mundial - UNESCO, entidade com poder para parar esta destruição". No site (ultimoanodotua.pt) podem ser subscritos três pedidos: "para a UNESCO fazer uma nova visita ao Alto Douro Vinhateiro, classificado como Património Mundial da Humanidade; reunir com todos os afetados pela construção da barragem de Foz Tua e, por último, colocá-lo na lista do Património Mundial em Perigo."
O cancelamento da construção de barragens do Alvito e Girabolhos e suspensão temporária de Fridão trazem novas esperanças aos ativistas "que sejam reequacionadas novas abordagens" em relação ao Tua. A campanha digital é composta por quatro testemunhos, de quem teme que as suas vidas mudem drasticamente com a conclusão da barragem, prevista para o final deste ano. Em "A última colheita", o agricultor Manuel Queiroga assume estar "revoltado", porque tal como outras "15 ou mais pessoas" ficará sem a sua horta. Já Ricardo Inverno, protagonista de "A última descida do rio", refere-se à barragem como "um monstro sem necessidade de ser criado", enquanto o guia Aníbal Gonçalves defende que a linha ferroviária podia ser uma "razão forte para impedir que o vale fosse destruído."
A mais recente campanha é, segundo João Joanaz de Melo, um "grito de alma". "[A barragem] é um crime contra as pessoas que ali vivem e o ambiente. Isto é inadmissível." De acordo com o responsável técnico da plataforma Salvar o Tua, o objetivo da iniciativa é "parar o mais rapidamente possível as obras, porque a barragem é uma fraude sobre os portugueses e um ataque contra a população local".
João Joanaz de Melo diz que, apesar de as obras estarem "bastante avançadas", a barragem é ilegal, uma vez que não estão a ser cumpridos "requisitos" impostos pela UNESCO, nomeadamente "a reposição da mobilidade equivalente à linha do Tua" e o "traçado da linha elétrica de alta tensão que atravessa o Alto Douro".
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Embora possa parecer impossível travar o enchimento da albufeira, o responsável acredita que não é. "Se há alguma coisa que pode salvar o Tua, é termos os cidadãos do mundo a pressionar a UNESCO. Pensamos que ainda é possível, desde que haja vontade." Na opinião de Joanaz de Melo, a UNESCO demitiu-se das suas funções no que diz respeito ao Tua e "fez de conta que acreditou que a barragem era compatível com o Alto Douro Vinhateiro". Catarina Santos esclarece que "o não enchimento da albufeira permitirá ainda ações fulcrais para a preservação da região e deste património nacional e da humanidade".
O grupo Esporão acredita que "o que é único cria valor e deve ser preservado. Destruir o vale do Tua diminui substancialmente a capacidade da região para se desenvolver de forma sustentável, nas dimensões social, ambiental e económica". E foi por isso que em 2013 decidiu associar-se à PST. Para produzir "vinhos e azeites únicos", refere, é essencial "proteger os recursos naturais e humanos que determinam a sua qualidade e continuidade".