O esplendor do Douro num ambiente de sóbrio luxo
Como suspeitava Ema, a protagonista do romance de Agustina Bessa-Luís, Vale Abraão (adaptado para o cinema por Manoel de Oliveira) a aspiração ao luxo nem sempre se faz acompanhar pela inteligência ou sequer pelo sentido de equilíbrio. Mas não é isso que acontece no Six Senses Spa Douro Valley, resort de cinco estrelas localizado na Quinta do Vale Abraão, a dois passos da Régua, onde se confirma que o verdadeiro luxo não se alimenta da ostentação, nem exibe as marcas de quanto se investiu, para atingir um tão delicado nível de depuração.
Para tal resultado, muito contribui o respeito por aquilo a que os romanos chamavam o espírito do lugar. Este não é apenas o palco de um dos mais marcantes romances de Agustina (protagonizado, na versão cinematográfica, por Leonor Silveira, num dos seus melhores papéis), mas um lugar cuja história remonta ao princípio da Idade Moderna.
Na segunda metade do século XV, João Lourenço de Seara, escudeiro do rei D. Afonso V, arrendou uma vinha junto do chamado “S” do Rio Douro a Abraão Farah, judeu, morador na Judiaria de Lamego. Mas a designação de Vale de Abraão perpetua até hoje o nome do seu ancestral senhor. No final do século XIX, Laura Pereira Leitão, descendente de João Lourenço de Seara, e seu marido, Alfredo Passanha, instalaram-se aqui e procederam a importantes melhoramentos, como a construção de uma torre, de uma capela, jardins, dotados de árvores exóticas. Foi construída mesmo uma pequena barragem hídrica para produzir energia através de um gerador. Por causa disso, a casa de Vale de Abraão foi a primeira, no Vale do Douro, a ter luz elétrica instalada.
Também do século XIX é a floresta existente na quinta, cujas árvores e plantas foram encomendadas em Paris. As espécies predominantes são os carvalhos, medronheiros, áceres, cedros e abetos, acompanhadas por algumas espécies autóctones. Juntas, formam uma notável floresta centenária, como muitas outras que existiram no Vale do Douro e que têm vindo a desaparecer.
Mas o amor à Natureza e a causa da sustentabilidade ambiental neste hotel, dotado de 71 quartos e suites, desenhado pelo arquiteto Luís Rebelo de Andrade, passa por muito mais do que uma bela paisagem. Está bem presente nos vários serviços disponibilizados aos clientes. É o caso do Spa de 2200 metros quadrados, com 10 salas de tratamento (todas com vista para jardins secretos e fontes cristalinas ou vistas amplas sobre o vale do Rio Douro) ou a grande piscina interior munida de jatos de água e som subaquático.
Gastronomia sazonal
Um desafio para o corpo e para a mente é o chamado Alchemy Bar. Decorado ao estilo Harry Potter, cheio de frascos, frasquinhos e almofarizes de pedra, o espaço convida os visitantes a fabricar os seus próprios produtos de beleza recorrendo apenas a produtos naturais - e da região, para evitar deslocações desnecessárias.
Na aula em que se inscreveu, a repórter pôde “cozinhar” um esfoliante em que ao sal marinho se juntou um óleo essencial, raspa de limão e laranja. O resultado, imagina-se, faria corar de inveja as antigas e muito sofisticadas moradoras desta casa.
Os princípios da sustentabilidade e da economia circular aplicam-se ainda aos vários espaços gastronómicos do Six Senses. É o caso do restaurante Vale Abraão, que ocupa dois espaços generosos e um grande terraço. A decoração clássica e contemporânea, com tetos altos e janelas muito amplas, cria uma atmosfera íntima. Há menus de degustação inspirados no mercado sazonal e um menu à la carte em constante mudança com recurso aos fornos a lenha e à churrasqueira. Graças à open kitchen é possível ao chef interagir com os hóspedes num ambiente divertido e informal.
Outro espaço dedicado à gastronomia é a Cozinha do Douro, onde a oferta é constituída por pratos como Escabeche de peixe do rio, Posta Mirandesa, Terrina de carnes ou Polvo com cebola, salsa e vinagre de vinho tinto, tudo acompanhado por pão de azeitona e broa de milho, tremoço ou azeitonas.
Nas atividades disponibilizadas constam ainda provas de vinhos, ateliers de artes e passeios de barco nesta zona especialmente bonita do Douro.
Em tão idílico lugar, o difícil é mesmo não nos pormos na pele de Ema, a protagonista imaginada por Agustina: “E depois, quando Carlos voltou e lhe disse que vivia em Vale Abraão, o coração dela bateu, como se o amasse (…). Era um mundo que a chamava e desde a infância a enchia de avidez, como a duma bailarina que não pisou o palco e ainda espera a sua noite de estreia.”
Em tão idílico lugar, o difícil é mesmo não nos pormos na pele de Ema, a protagonista imaginada por Agustina: “E depois, quando Carlos voltou e lhe disse que vivia em Vale Abraão, o coração dela bateu, como se o amasse (…). Era um mundo que a chamava e desde a infância a enchia de avidez, como a duma bailarina que não pisou o palco e ainda espera a sua noite de estreia.”