Número de mulheres vítimas de violência apoiadas pela APAV aumentou 8,7% de 2022 para 2023
A Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) apoiou no ano passado 12.398 mulheres, um aumento de 8,7% face a 2022, quando foram apoiadas 11.400, segundo dados divulgados esta segunda-feira pela APAV.
Em entrevista à Lusa no âmbito do Dia Internacional da Eliminação da Violência Contra Mulheres, que se assinala esta segunda-feira, Daniel Cotrim, responsável pelo setor da violência doméstica e violência de género na APAV, considerou que 8,7% "é um aumento considerável".
Além do aumento dos pedidos de apoio de mulheres pelo crime de violência doméstica, houve aumento de pedidos de apoio para meninas e raparigas vítimas de crimes sexuais, do número de situações de assédio laboral e de crimes de ameaça e coação, designadamente através do 'sextortion' (extorquir, fazer chantagem com alguém através de conteúdo sexual).
"A grande maioria das vítimas que faz o seu pedido de apoio à APAV continua a ser a mulher e, na grande maioria das situações, estamos a falar de violência doméstica", explicou Daniel Cotrim, referindo que a violência doméstica chega com um outro conjunto de crimes em simultâneo, como o abuso sexual, violação, 'sextortion' e outros como importunação sexual, coação e difamação.
No total, os dados revelam também que entre os principais crimes cometidos em 2022 e 2023 estão os de violência doméstica (37.157), crimes sexuais contra crianças e jovens (1.556), crimes de ameaça ou coação (1.243), crimes de ofensas à integridade física (81.018), crimes de injúria e difamação (988) e crimes sexuais contra adultos (791).
Crimes contra meninas e raparigas com idades entre os zero e os 17 anos foram registados 3.434 (14,4%).
Crimes de violência contra mulheres acima dos 65 anos de idade foram registados 2.446 (10,3%).
A maioria das vítimas (75,3%) são de nacionalidade portuguesa e há 15,8% de nacionalidade estrangeira e 8,9% das vítimas que se desconhece a nacionalidade.
Uma mulher morre a cada 10 minutos no mundo vítima de violência doméstica
Todos os dias a nível mundial morrem 140 mulheres ou raparigas às mãos dos seus companheiros ou de familiares mais próximos, o que representa uma morte a cada 10 minutos, avança esta segunda-feira um relatório da ONU.
Segundo os dados da organização internacional, no ano passado foram mortas intencionalmente 85 mil mulheres e raparigas em todo o mundo, das quais 51 mil (ou seja, 60%) foram assassinadas pelos seus parceiros ou por outros membros da família.
O relatório divulgado esta segunda-feira, a propósito do Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres, conclui que a violência contra as mulheres continua generalizada e que a sua manifestação mais extrema, o femicídio, é universal, transcendendo fronteiras, estatutos socioeconómicos e grupos etários.
Dados que indignam a diretora-executiva da ONU Mulheres, o órgão das Nações Unidas dedicado à igualdade de género e à defesa do fortalecimento do poder das mulheres.
"A violência contra as mulheres e raparigas é passível de ser prevenida e sabemos como fazê-lo", garante Sima Bahous, citada no relatório.
Para isso, defende a representante, "precisamos de legislação sólida, de uma melhor recolha de dados, de mais responsabilização governamental, de uma cultura de tolerância zero e de um maior financiamento para as organizações e organismos institucionais que defendem os direitos das mulheres".
Os números referentes a 2023 mostram um aparente crescimento deste fenómeno face ao ano anterior, já que em 2022, as estimativas apontavam para 48 mil vítimas.
No entanto, como a disponibilização de dados a nível nacional foi muito diferente de país para país, a organização avisa que a alteração não é indicativa de um aumento real.
No ano passado, África registou as taxas mais elevadas de femicídios causados por parceiros íntimos e familiares próximos relativamente ao tamanho da sua população (2,9 vítimas por 100.000 mulheres em 2023).
Na Europa e nas Américas, a maioria das mulheres foram mortas no contexto doméstico (64% e 58%, respetivamente), vítimas dos respetivos parceiros, sendo nestas duas regiões geográficas que esta tendência é mais pronunciada.
Noutros locais, os familiares são normalmente os principais perpetradores.
"No resto do mundo (com base nos dados disponíveis), as mulheres e as raparigas têm maior probabilidade de serem mortas por membros da família (59%) do que pelos seus parceiros (41%)", indicam os dados divulgados pela ONU.
Segundo os analistas, a situação "sublinha a necessidade de garantir que a prevenção da violência doméstica aborda as relações íntimas, mas também os contextos familiares onde as mulheres correm maior risco".
Por outro lado, além do assassinato de mulheres e raparigas pelos seus companheiros (maridos, namorados) ou por outros membros da família, existem outras formas de femicídio.
Nos últimos anos, avança o relatório da ONU, alguns países começaram a quantificar outras formas de femicídio, dando como exemplo o caso de França.
Neste país europeu, durante o período de 2019-2022, quase 80% de todos os homicídios de mulheres foram realmente cometidos por parceiros íntimos ou outros membros da família, mas outras formas de femicídio representaram mais de 5% de todos os casos, menciona o relatório.
Outro caso referenciado é o da África do Sul, onde os femicídios fora da esfera doméstica representaram 9% do total de homicídios femininos em 2020--2021.
Relativamente à evolução dos crimes de femicídio, a ONU refere que a falta de dados suficientes só permite identificar as tendências temporais do femicídio relacionado com parceiros íntimos/família nas Américas e na Europa.
No primeiro caso, essa taxa tem-se mantido relativamente estável desde 2010, mas, no caso da Europa, foi detetada uma diminuição (menos 20%) entre 2010 e 2023, sobretudo pelo declínio destes atos nos países do norte, ocidente e sul da Europa.
A menos de um ano de ser assinalado o 30.º aniversário da Plataforma de Ação de Pequim, documento assinado na IV Conferência Mundial das Nações Unidas sobre as Mulheres, no qual os governos se comprometeram a garantir que a perspetiva de igualdade entre mulheres e homens é refletida em todas as suas políticas e programas, a diretora da ONU Mulheres defende ser tempo de os líderes mundiais se unirem.
Para Sima Bahous, é preciso que os líderes da comunidade internacional tomem "medidas ousadas" e "deem prioridade ao compromisso, à responsabilização e aos recursos para pôr fim a esta crise".
Marcelo pede "ação vigorosa" no combate à violência doméstica
O Presidente da República pede "ação vigorosa" no combate à violência doméstica, no Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres, em que o Palácio de Belém ficará, uma vez mais, simbolicamente, iluminado de laranja.
Marcelo Rebelo de Sousa assinala este dia internacional com uma mensagem publicada no sítio oficial da Presidência da República na Internet e volta a associar-se à campanha "Orange Day" das Nações Unidas.
"O Presidente da República apela à ação vigorosa de todos no combate ao flagelo da violência doméstica, profundamente grave em Portugal", lê-se na mensagem.
Na mesma nota, é anunciado que neste dia o Palácio de Belém ficará iluminado "de cor de laranja de forma de dar visibilidade a esta causa".
Em anos anteriores, 2020, 2021 e 2023, neste dia internacional, o Palácio de Belém também foi iluminado de cor laranja, para dar visibilidade à causa do combate à violência contra as mulheres.
Em 2022, a Presidência da República decidiu que não fazer a habitual iluminação de Natal nem "outras simbólicas iluminações especiais", para poupança de energia.
Montenegro afirma que violência doméstica diz respeito a todos e deve ser denunciada |
O primeiro-ministro apelou esta segunda-feira à consciencialização de que o crime de violência doméstica é um crime público, que deve ser denunciado, e garantiu que o Governo está empenhado na luta contra esse fenómeno, estando a reforçar os seus meios.
"Estamos empenhados [na luta contra a violência doméstica] e o nosso compromisso vai no sentido de lutar por uma sociedade onde todas as mulheres vivam em liberdade, sem medo e com pleno acesso a todos os seus direitos", afirmou Luís Montenegro em declarações à Antena 1 no Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres.
O chefe do executivo considerou que a violência contra as mulheres é "uma das violações mais graves dos direitos humanos" e frisou que, para a combater, são necessárias políticas que garantam a sua diminuição e apoiem as vítimas".
"Isso pressupõe recursos financeiros e, por isso, nós reforçámos a parte orçamental para a prevenção e para o combate à violência doméstica", afirmou, frisando que isso vai permitir "duplicar o apoio à autonomização das mulheres" e reforçar serviços como a teleassistência ou o transporte das vítimas.
Interrogado se acredita que, com essas medidas, se poderão inverter os atuais números de violência doméstica, Montenegro defendeu que é importante que a sociedade perceba que o crime de violência doméstica "não é um problema do âmbito privado apenas, das pessoas que são afetadas".
"O crime de violência doméstica é um crime público, que deve ser denunciado", disse, considerando que, para que se reduzam as suas ocorrências, "é preciso que toda a sociedade seja corresponsabilizada e não entenda, como aconteceu durante muitos anos, que este fenómeno era visto como um fenómeno dos próprios".
"A maior mensagem que podemos passar é que, quando há violência sobre uma mulher, no fundo somos todos nós que estamos a sofrer essa violação de um direito humano", afirmou.
Atendimento a vítimas já aumentou para o dobro face a 2023 na AMLisboa
O acompanhamento de vítimas de violência doméstica pelo Gabinete de Informação e Atendimento à Vítima (GIAV) na Área Metropolitana de Lisboa (AML) já aumentou este ano para o dobro em relação a 2023, foi hoje anunciado.
No âmbito do Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, o GIAV revelou que este ano já realizou mais de 600 intervenções, quando no ano passado registou mais de 300, o que significa "um aumento significativo no acompanhamento de vítimas de violência doméstica em relação ao período homólogo".
Segundo o GIAV, desde janeiro foram realizados 603 acompanhamentos em sede de Declarações para Memória Futura, que inclui uma entrevista preparatória, a redação de um relatório, acompanhamento da vítima a tribunal e uma sessão subsequente.
Realizou também 22 intervenções em crise, 12 atendimentos presenciais, 16 encaminhamentos, 24 acompanhamentos a julgamento, 32 acompanhamentos a inquirição presidida por magistrado e 84 atendimentos telefónicos, além de duas ações formativas a magistrados e funcionários judiciais.
O Gabinete, que assinala este mês 13 anos de atividade, realizou nestes anos pelo menos 3.925 intervenções em processos-crime, incluindo 2.917 acompanhamentos na diligência judicial de Declarações para Memória Futura, 347 avaliações de risco de violência doméstica e 167 atendimentos a vítimas, entre outras atividades.
O GIAV foi criado há 13 anos através de uma parceria entre a Egas Moniz School of Health & Science e o Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa, em articulação com o Ministério Público.
Atua no contexto de crimes de violência doméstica, maus-tratos a crianças, jovens e idosos, abuso sexual de crianças e jovens, e outros crimes sexuais, realizando o acompanhamento de vítimas em diligências judiciais (incluindo audiências de julgamento), intervenções em crise, encaminhamento para instituições competentes, formação e investigação, consultoria científica e divulgação institucional.