Qual o perfil do incendário em Portugal?Os incendiários têm-se dividido em dois tipos, que são os incendiários do tipo urbano e os incendiários do tipo florestal. Têm motivações diferentes, mas uma grande parte do perfil de ambos tem características que são completamente transversais. O perfil dos incendiários é, sobretudo, do sexo masculino. Há uma prevalência enorme face ao sexo feminino. Normalmente estão na faixa etária entre os 32 anos e os 49. E têm fatores associados, como baixas habilitações literárias. Isso em relação aos incendiários florestais. Já os incendiários urbanos são pessoas mais estruturadas, com mais estudos, e é isso que os diferencia a esse nível. Depois, outro fator é a existência de antecedentes criminais. Ou seja, os incendiários que praticam esse tipo de crime já praticaram outros. Seja da mesma tipologia ou outro tipo de crime completamente diferente. Mas é um dos fatores para ambos os tipos [de incendiários]. Depois, normalmente na fase de vida em que cometem o crime, estão a passar por algum tipo de dificuldade económica - muitos estão em situação de desemprego. Outro ponto é o facto de reportarem que vêm de famílias disfuncionais e com historial de doença mental. Ou seja, os outros familiares também já sofrem algum tipo de doença. Uma coisa não implica a outra, mas há essa informação. E também o facto de relatarem que cresceram num ambiente em que ocorreu violência doméstica. Para além disso, e este aqui é um ponto-chave, e que parece que acontece com cada um deles, é o facto de serem dependentes. Os homens também normalmente são divorciados, ou solteiros, que vivem em casa dos pais, ou sozinhos, e não parecem, ou não mostram, ser autónomos..E quais são as motivações para o crime, no caso dos florestais?Às vezes eles não apresentam qualquer tipo de motivo aparente, pelo menos que saibam verbalizar, ou então muitos deles têm o prazer de ver o fogo, o prazer de ver aquela claridade, tudo aquilo que nós temos observado nos últimos dias. Aquilo causa-lhes prazer, tal como todos os outros tipos de perturbações de vício. Os incêndios, e o facto de provocarem todas aquelas consequências nos dias seguintes, causa-lhes prazer e ativa o sistema de recompensa a nível cerebral. E, normalmente, também não conhecem o dono [dos terrenos], ou seja, não há uma associação com um ato de vingança. Eles simplesmente ateiam fogo..Qual é a melhor forma de combater este tipo de crime?Na minha opinião, que parte da minha experiência, as respostas que temos neste momento são punitivas, que podem controlar o comportamento no caso de prisão ou de tornozeleira eletrónica. A meu ver, é completamente inválido, porque estas pessoas têm, na sua maioria, um problema de saúde mental. E a falta de investimento na saúde mental resulta naquilo que se vê. Os incendiários ficam retidos na prisão e, passado esse tempo, voltam para a rua e voltam a ser incendiários, porque não rece- beram tratamento, não tiveram a devida intervenção psicológica, ou devido acompanhamento, o que resulta em absolutamente nada. É preciso que percebam que aquilo é errado. Apesar da revolta toda que isto gera nas pessoas, e que também me cria a mim, e do estigma todo que se gera em volta disto, eles precisam de ter tratamento e isso devia ser-lhes oferecido dentro do Sistema Judicial. Neste momento, na prática, isso não acontece..E isso acontece porquê?A resposta é sempre a mesma, a de que não há recursos para isso. Não há respostas aos serviços. E as pessoas vão-se contentando com aquilo que têm, vão trabalhando com aquilo que têm e não conseguem oferecer mais. Neste momento, acho que o sistema devia ser reformulado. Fazer uma reestruturação não só ao nível do apoio mental, mas também ao nível educacional e ao nível social, porque só assim é que conseguiríamos ter os resultados que desejamos..amanda.lima@dn.pt