Ivo Ivanov: “Portugal está hoje no centro do mundo da conectividade”
Com 33 data centres ao todo, sendo o da Covilhã um dos maiores do género no mundo e 20 só na Região de Lisboa, ligações submarinas de dados de alta velocidade transatlânticas de ponta - com mais uma prestes a ser “amarrada” pela Google nos Açores e em Sines -, uma taxa de penetração de internet de alta velocidade nacional (fibra) das mais altas da União Europeia (71,1%), Portugal “é um formidável ponto de convergência para todos os continentes banhados pelo Oceano Atlântico”.
Quem o diz é Ivo Ivanov, CEO da DE-CIX - um dos principais operadores mundiais de Internet Exchange -, empresa que de 1 a 3 de outubro promete trazer a Lisboa “cerca de 600 participantes de mais de 300 empresas e de mais de 50 países diferentes”, no Pátio da Galé, para a Conferência Global Atlantic Convergence, onde se vai discutir o futuro de uma infraestrutura digital pan-Atlântica e o futuro da internet.
“Portugal já alcançou uma posição central no panorama global contemporâneo da internet e está hoje no centro do mundo da conectividade”, garante Ivo Ivanov. “O desafio passa agora por desenvolver ainda mais o tráfego internacional, e um elemento determinante na escolha do destino do tráfego internacional é a disponibilidade dos conteúdos e serviços pretendido.”
Uma das principais questões da atualidade é como reduzir o tempo de resposta (tecnicamente, a latência) entre o pedido feito pelo utilizador e a resposta obtida. “As aplicações digitais atuais ainda podem oferecer uma experiência de utilizador aceitável, com uma latência não superior a um piscar de olhos (100 milissegundos)”, afirma o CEO da DE-CIX, “mas não é certamente uma experiência excelente”.
Isto porque “o cérebro humano demora apenas 20 milissegundos a percecionar a informação tátil, 13 milissegundos a processar sinais visuais e ainda menos - menos de um único milissegundo - a percecionar os atrasos auditivos. Assim, criar um ambiente imersivo autêntico e fiável exigirá a replicação da velocidade mais rápida, para que as reações e interações possam parecer naturais”. Só com este tipo de velocidades será possível termos experiências virtuais realistas satisfatórias e, por exemplo, cumprir verdadeiramente o sonho do Metaverso.
“O que é necessário para fazer face a essas exigências? Grandes canais e a computação de alto desempenho devem aproximar-se o mais possível dos utilizadores e dos dispositivos inteligentes.” E Portugal, com a infraestrutura já existente e aquelas que se preveem construir, está na linha da frente para a construção deste futuro.
Por exemplo, só em cabos submarinos de dados “prevê-se iniciativas que amarram em Portugal se estendam a 115 estações de amarração de cabos em todo o mundo até 2026, estabelecendo ligações diretas por cabo com nada menos que 60 países nos cinco continentes e estendendo-se até à Austrália”, avança Ivo Ivanov.
Assim, “vejo Lisboa e Portugal como um novo centro de interligação que permite fluxos de dados eficientes entre as Américas, África e Europa, e mais além, para a Ásia. E veremos surgir oportunidades de negócio transatlânticas e até pan-Atlânticas crescentes, com base nisto: Lisboa liga os outros continentes atlânticos à Europa com a latência mais baixa. Já não se trata apenas de ligar a Europa e a América do Norte - trata-se também de garantir a melhor conectividade a África e à América do Sul”, afirma ao DN o especialista, numa entrevista concedida por e-mail.
África: desafio e oportunidade
O continente africano é aquele em que os desafios de fazer chegar a internet de forma eficiente são maiores, mas simultaneamente onde o potencial de negócio e crescimento é maior. “A questão é: até que ponto África já é digital? Numa perspetiva global, o continente está certamente a crescer em termos de acesso à internet, está a fazer grandes progressos em termos de disponibilidade e qualidade de serviço e tem um enorme potencial económico”, afirma Ivanov. “Há um número crescente de unicórnios tecnológicos em África e o financiamento de startups cresceu seis vezes nos últimos cinco anos”.
“Apesar da conectividade móvel na zona subsariana estar entre as mais caras do mundo, 64% dos africanos da região subsaariana possuíam um smartphone no final de 2021”, refere este responsável, “demonstrando a verdadeira fome de comunicação digital, conteúdos e aplicações de comunicação digital e recursos baseados na cloud”.
A conclusão? “A velocidade da digitalização em África será mais rápida do que já vimos anteriormente noutras regiões digitais emergentes.”
Mas para o conseguir é necessário fazer com que a maior parte do tráfego de internet em África deixe de estar “concentrado na África Austral e Ocidental”. “Não é conveniente concentrar todos os fluxos de tráfego em duas pequenas áreas de um grande continente”, lembra Ivanov.
E neste aspeto o sul da Europa - e como tal Portugal - também terá uma palavra a dizer. “Na DE-CIX estamos a desenvolver parceria com fornecedores africanos de infraestruturas como a UNITED em Quinxassa (RDC), LITC em Trípoli (Líbia), e Rack Center em Lagos (Nigéria) para lançar as bases para os ecossistemas digitais através da construção de plataformas de interligação e Cloud Exchanges. Cada uma destas plataformas terá também conectividade direta e dedicada no sul da Europa, como as nossas Internet Exchanges (IX) em Marselha, Lisboa e Barcelona.”
Desta forma, promete o CEO da DE-CIX, ir-se-á conseguir que “os utilizadores africanos [tenham] acesso a conteúdos, aplicações e serviços digitais com a qualidade que merecem e a um preço acessível.”
E mais uma vez, Portugal abrirá assim novos mundos ao resto do mundo.