"A UE tem de continuar a apostar na ciência, e aumentar os apoios"

Gonçalo Bernardes desdobra-se entre Lisboa e Cambridge. Chega a fazer 70 voos por ano, para poder coordenar o trabalho do seu grupo de investigação, que está dividido entre as duas cidades. Mas compensa, e muito, diz.
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Coordenar uma equipa dividida entre dois países não é banal.

Não, embora já haja outros exemplos. É bastante complicado porque tenho de viajar muito, mas faz sentido porque são dois ambientes diferentes. Num é sobretudo a química, no outro mais biologia e medicina e o que fazemos é transversal, desde a síntese de moléculas aos estudos pré-clínicos.

Como surgiu essa oportunidade?

Foi em 2013. Vim apresentar o meu trabalho no IMM e depois de uma série de conversas com a Carmo Fonseca [então diretora do IMM] foi muito rápido. Tive um apoio muito forte do IMM, ao qual estou muito grato. Aqui há valências que não tenho em Cambridge, onde estou num departamento de química e onde teria mais dificuldades em estabelecer a parte terapêutica. Tenho sorte de ter um grupo de pessoas fabuloso, tanto aqui como em Cambridge, com diferentes backgrounds, em química, física, diferentes áreas da biologia, o que nos permite ter estratégias multidisciplinares para perceber a doença a nível molecular e intervir nela com mais conhecimento.

As terapias no cancro já são hoje mais eficazes?

Sim. Nos últimos cinco anos houve avanços, tanto na entrega seletiva de drogas, como no tipo de drogas, e nos mecanismos de ação que podemos ativar para combater o cancro. Uma estratégia e classe de moléculas inovadoras têm a ver com a ativação do sistema imunitário, para ser ele a fazer esse combate. Também trabalhamos nisso, e estamos muito próximos de obter o licenciamento para essa tecnologia e de, em conjunto com uma empresa de biotecnologia norte-americana e a Universidade de Cambridge, conseguirmos fundos para uma nova empresa que vai explorar esse caminho.

Quando é que estas coisas novas poderão chegar aos doentes?

Muitas já vão chegando. Já há três anticorpos conjugados com drogas aprovados para uso na clínica pela Food and Drug Administration [FAD, dos Estados Unidos], e existe uma série de outros candidatos que estão avançados em ensaios clínicos e investigações que nos permitirão desenhar estas drogas de modo mais eficaz no futuro.

Investigações como as suas estão na fronteira do conhecimento?

Sim. Isto é investigação básica para desenhar estratégias na investigação mais aplicada.

Como são financiados?

Cerca de 70% das verbas vêm da UE, do programa-quadro Horizonte 2020 e do anterior, o FP7; 20% vêm da indústria, e 10% dos financiadores nacionais, em Inglaterra e Portugal. Cá, é a FCT, mas nunca há datas definidas para os projetos, as regras mudam constantemente e os financiamentos são demasiado curtos, o que é um problema. A UE é essencial para a ciência.

O comissário Carlos Moedas defende que é preciso aumentar as verbas do sucessor do Horizonte 2020. Concorda?

Sim, é necessário continuar a apostar na ciência na UE, aumentando esse apoio. Tem sido essa a tendência a cada novo programa-quadro, e isso vê-se nos resultados da ciência que se faz na Europa, e que antes não se via tanto, em áreas como o espaço, a medicina ou a física, com imenso conhecimento novo gerado no CERN e noutros institutos de topo, que não existiriam sem a União Europeia.

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