“Hoje basta ter 18 anos e seis meses de formação para poder ser polícia com uma arma de 9 mm na mão”
O presidente da Associação Sindical dos Profissionais da Polícia (ASPP/PSP), maior sindicato da Polícia de Segurança Pública, reagiu esta sexta-feira ao relatório anual da Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), que revelou ter recebido 1.511 queixas contra forças de segurança em 2024, o valor mais alto da última década. Destes, 742 visaram agentes da PSP, o maior número entre todas as forças.
Em declarações ao DN, Paulo Jorge Santos, presidente da ASPP, refere que é necessário ir além da leitura imediata dos número de queixas: “Temos dito várias vezes, sempre que saem estes relatórios, que as pessoas valorizam o número de queixas ou processos, mas esquecem muitas vezes da conclusão desses processos”, afirmou. “O número de agentes efetivamente punidos é muito reduzido face às queixas que as pessoas, legitimamente, apresentam, e isso quer dizer algo.”
Segundo o relatório da IGAI, apesar das centenas de queixas, apenas nove agentes da PSP foram suspensos em 2024, e nenhum foi expulso. Para Paulo Santos, este dado reforça que “a maior parte dos polícias, se não todos, atuam nos princípios éticos e da boa fé.”
O líder sindical reconhece, no entanto, que a PSP, “tal como todas as profissões, terá os seus problemas”, mas considera que é necessário compreender os contextos que se escondem por detrás das estatísticas.
“Além dos números, temos de perceber os contextos sociais que vivemos e as dinâmicas sociais da profissão, assim como o trabalho que as polícias fazem junto das pessoas e das comunidades, além da falta de meios de que a PSP tem vindo a sofrer há muito tempo”, aponta, reforçando que “temos de perceber que o serviço policial é exigente, complexo e requer muitas intervenções de proximidade em contextos cada vez mais sensíveis”.
Exemplificando, apontou que a polícia é colocada na linha da frente da aplicação de normas que não define. “Vou-lhe dar um exemplo”, diz o presidente da ASPP/PSP: “Ontem foi aprovado um novo código de conduta no município Albufeira [que visa proibir excessos comportamentais e nudez parcial nas ruas]. Quem vai zelar pelo cumprimento desse código de conduta? As polícias. E quem vai levar com as queixas dos cidadãos descontentes com o código de conduta? As polícias. Não é a entidade administrativa.”
Sobre a formação ética e comportamental dos agentes, Paulo Santos defende que é essencial reforçá-la, mas alerta para a falta de efetivos: “Apostar na formação é importante, mas para isso é preciso ter polícias. E nós estamos no limite em termos de recursos, humanos e não só.”
O dirigente sindical recusa uma alegada "cultura de impunidade" nas forças de segurança e realça a importância de estes relatórios não servirem para desacreditar as forças policias junto da população. “Isso depende, lá está, da leitura que se faz destes relatórios, que eu quero acreditar que sejam justos, equilibrados, transparentes e com o propósito de melhorar a profissão. O que quero transmitir à população, e temo-lo feito sempre, é que não olhemos para os polícias como alguém que quer prejudicar os cidadãos. Pelo contrário. A nossa missão é protegê-los e colocamos todos os dias a nossa vida em risco para o fazer”, diz.
Lembrando que “a ASPP foi, já há 40 e tal anos, a principal responsável pela criação de um código deontológico e ético para a PSP”, Paulo Santos garante que o sindicato está sempre disponível para colaborar com o Ministério da Administração Interna na definição de políticas que melhorem o setor. E as quais, diz, têm vindo a ser defendidas pelos sindicatos desde há muito: “Passam sobretudo por melhores condições de trabalho e dignificação das carreiras, até para reforçar a legitimidade para esse escrutínio da atividade policial . Temos insistido na importância da formação e de maior exigência nas condições de acesso à profissão. Hoje basta ter 18 anos e seis ou sete meses de formação para se ser enviado para o policiamento de áreas sensíveis com uma arma de 9 mm na mão. Isto é correto?”