Ganhou um milhão a seduzir empresários, bancários e um polícia
Convenceu nove homens a comprarem-lhe terrenos. Eles deram dinheiro por títulos de propriedade falsos
Bonita, sedutora, bem-falante e, sobretudo, demonstrando uma atitude convincente e de segurança quando o tema de conversa era negócios. Estes eram os atributos com que Elisabeth Saraiva, conhecida como "burlona do amor", convencia as suas vítimas, segundo denunciaram os nove homens a quem esta mulher terá convencido a dar-lhe mais de um milhão de euros durante 11 anos.
A maior parte deles envolveu-se em relacionamentos amorosos com a suspeita até que a investigação da Polícia Judiciária pôs fim aos esquemas de Elisabeth, constituindo-a arguida. No julgamento que decorre no Tribunal de Setúbal manteve-se em silêncio. Conhece hoje a sentença, mas os lesados já sabem que ela não tem como lhe devolver o dinheiro.
Elisabeth Saraiva, hoje com 47 anos, está indiciada por vários crimes: nove burlas, quinze falsificações e dois furtos. Tem estado sempre em liberdade, sendo acusada de ter burlado vários empresários, um gerente bancário e até um agente da Polícia Marítima, propondo bons negócios e garantindo ser a proprietária de terrenos que estaria disponível para vender a preços aliciantes. Depois de seduzir os homens, falsificava documentos de títulos de propriedade pedindo às vítimas que sinalizassem os negócios com verbas sempre avultadas.
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Foi assim que o queixoso mais lesado no processo diz ter perdido meio milhão de euros entre 2007 e 2010. Carlos fora apresentado a Elisabeth por um gerente bancário como sendo dona de vários imóveis, tendo esta proposto a este diretor comercial a compra das quintas dos Picheleiros e do Mocho (ambas na zona de Setúbal). A vítima viria a pagar o meio milhão de euros, mas não recebeu qualquer terreno.
Elisabeth garantiu-lhe que iria devolver o montante investido assim que recebesse os 15 milhões de euros que lhe seriam devidos pelo governo da África do Sul (onde viveu com a família até 1980), relativos a supostas patentes de invenções da autoria do pai, Angelino Saraiva, hoje com 80 anos, e que também é arguido por alegada conivência com a filha em alguns dos crimes de que está acusada. A arguida dizia que o pai era o autor de rodas de camiões, desentupidores de esgotos e comedouros para aves.
Já um empresário da construção civil de Palmela, que chegou a viver com Elisabeth durante mais de um ano, após a conhecer em 2009 num concerto dos AC/DC em Lisboa, queixa-se de ter sido burlado em 140 mil euros, verba que se destinaria à construção de uma urbanização na mesma Quinta do Mocho e uma casa em Troia. E nem o facto de o Plano Diretor Municipal de Setúbal impor restrições na Quinta do Mocho seria problema, já que a suspeita garantia conhecer pessoas influentes na autarquia que iriam alterar o PDM para viabilizar a construção.
O empresário acreditou e avançou com o dinheiro, até porque Elisabeth dava garantias sobre uns supostos 21 milhões de euros que a família detinha sobre propriedades e maquinaria na África do Sul. Versão confirmada pelo pai da arguida, da qual o empresário só começou a desconfiar quando o negócio não avançou e a mulher deixou de dormir na sua casa, além de não atender o telefone. Entre as vítimas está ainda um gerente bancário que lhe emprestou cerca de 20 mil euros.
Elisabeth, a quem não era conhecido emprego, residiu até há algum tempo em Setúbal, na casa da família, junto ao Parque do Bonfim, mas fonte próxima do processo revela que a mulher viajou para o Algarve e que a casa de Setúbal estará arrendada. Contactado pelo DN, o advogado de defesa limita-se a dizer que tem instruções para não prestar declarações sobre o processo, preferindo aguardar pela leitura do acórdão.
Mas apesar do silêncio a que se remeteu no julgamento - iniciado em dezembro de 2015, em que foram ouvidas 26 testemunhas - Elisabeth Saraiva negou os crimes que lhe são imputados pelo Ministério Público quando saiu a acusação, tendo requerido a abertura de instrução, garantindo que tinha sido vítima das suas necessidades económicas. O juiz de instrução concluiu que "a postura da arguida foi pouco convincente, apresentando um discurso falacioso e uma postura de vitimização", por ter alegado que os queixosos lhe emprestaram quantias avultadas e que se terão aproveitado das suas fragilidades para o fazer a juros altíssimos e ilegais.
Em 2006, Elisabeth Saraiva e o pai tinham um negócio de produção e distribuição de flores, plantas, sementes para importação e exportação. Mas correu mal, o que deixou a mulher no desemprego.
A algumas das vítimas apresentava-se como empresária, mas também se fez passar por advogada, segundo os queixosos. Quando em 2012 começaram a circular notícias sobre as suspeitas que recaiam sobre si, Elisabeth apresentou queixa na Entidade Reguladora da Comunicação para evitar que saíssem mais notícias, garantindo que não era alvo de qualquer investigação policial. A PJ disse o contrário.