Falta de médicos em Loures deixa 30 camas vazias nas enfermarias e enche urgências
Há dois dias que o tempo médio de espera na urgência geral do Hospital Beatriz Ângelo, em Loures, ultrapassa todos os limites adequados para um doente urgente, pulseira amarela. Ontem, às 13h50, havia uma espera de 17 horas para 55 pessoas e no dia anterior esta tinha ultrapassado as 18 horas, quando o tempo adequado é apenas uma hora. Pelas 17h00, os doentes urgentes ainda esperavam 9h26, havendo 62 pessoas nesta situação, e os doentes muito urgentes mais de duas horas, quando nem deviam esperar tempo algum para serem observados.
Os dados estão disponibilizados numa plataforma do SNS, que os atualiza ao minuto, e neste período de tempo o Hospital de Loures é o que está sob maior pressão na região de Lisboa e Vale do Tejo, mas também no resto do país.
Para a presidente da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), Joana Bordalo e Sá, “isto é a consequência da falta de médicos”, sublinhando mesmo que esta “é das áreas com mais falta de médicos de família, o que faz também com que, muitas vezes, o afluxo à urgência aumente, porque as pessoas necessitam de respostas para os seus problemas de saúde”, mas, ao mesmo tempo, é também das áreas com mais falta de especialistas hospitalares.
De tal forma que, afirma Joana Bordalo: “Neste momento, sabemos que há 30 camas para internamento nas enfermarias vazias, porque não há médicos suficientes para assegurarem os cuidados.” Ou seja, a falta de médicos ora deixa as urgências cheias, como deixa camas vazias no internamento. “A situação não é de agora. Há muito que vimos a alertar para esta situação em Loures”, sublinha ao DN.
No início de março, e como noticiou o DN, esta estrutura sindical alertava para as situações que se estavam a viver nas unidades de Loures e de Leiria, com cada vez mais médicos a entregar escusas de responsabilidade pelas condições em que estavam a trabalhar. Neste momento, Joana e Bordalo e Sá refere não saber ao certo o número de escusas entregues, “mas sabemos pelos colegas que são várias, provavelmente já na ordem das dezenas.”
A perceção é de que há cada vez mais, precisamente, porque “os médicos estão muito sobrecarregados, trabalham a 120%, já nem é a 100%, e entendem que não estão a conseguir dar resposta e prestar o ato médico em segurança”.
Portanto, “se por algum motivo há um fator, mesmo que nós não o consigamos identificar, que leve mais afluência à urgência, todo o serviço acaba por falhar. Há mais doentes, alguns, certamente, em estado mais grave, que acabam por ficar ali por não poderem ser internados nas enfermarias, onde também não há médicos para assegurar cuidados”, diz, reforçando que “a unidade tem 30 camas vagas nas áreas médicas e mais 30 camas ocupadas com casos sociais, que não têm para onde ir”.
Em declarações à Agência Lusa, o hospital, que agora integra a Unidade Local de Saúde (ULS) Loures/Odivelas, informou que o tempo excessivo de espera “se deve à afluência de doentes ao Serviço de Urgência Geral se manter “muito elevada” e o internamento estar sobrelotado, “o que dificulta a circulação de doentes da urgência com necessidade de permanência no hospital”.
Ao final da tarde, Loures continuava a ser o hospital com maior pressão na urgência em Lisboa e Vale do Tejo, podendo os tempos médios de esperar piorarem durante o turno da noite por haver menos médicos a funcionar.
Às 18h00, o site do SNS indicava que o tempo de espera tinha passado para 14h35, quando havia 55 doentes urgentes a aguardar. Mas o tempo de espera para cinco doentes muito urgentes tinha reduzido para 1h35.
À mesma hora, o Hospital Amadora-Sintra, uma unidade similar à de Loures, registava 05h35 de espera para 55 doentes urgentes e mais de 06h00 para 26 doentes menos urgentes.
A presidente da FNAM diz ao DN que “não houve vontade política para resolver estas situações” e promete “continuar a lutar para que o sejam junto do próximo Governo”.
Desde o início do ano, que a FNAM tem vindo a receber declarações de escusas de responsabilidade médico-legal de vários hospitais de norte a sul do país. Pelo menos, de médicos de sete unidades, nomeadamente Mirandela, Bragança, Viseu/Lamego, Barreiro, Cascais, Loures e Leiria.
Em Cascais, por exemplo, logo em janeiro demitiram-se todos os chefes de equipa de medicina interna do balcão das urgências. E as outras unidades já tiveram de de encerrar temporariamente urgências de cirurgia geral, obstetrícia e pediatria.