Estudo revela que a forma como respiramos também é uma impressão digital única
Respirar é um ato tão natural que raramente pensamos sobre ele. No entanto, por trás dessa ação simples está uma complexa rede cerebral que coordena a respiração de cada um com base nas respetivas necessidades fisiológicas e emocionais. Um novo estudo conduzido por cientistas do Instituto de Ciências Weizmann, em Israel, revelou que cada ser humano possui um padrão respiratório nasal único, uma espécie de “impressão digital” respiratória que permanece estável ao longo do tempo.
Publicada na revista Current Biology, a investigação demonstrou que é possível identificar uma pessoa com até 96,8% de precisão apenas analisando a forma como ela respira pelo nariz, e que esse padrão pode refletir indicadores de saúde física e mental, como índice de massa corporal (IMC), níveis de ansiedade, depressão ou traços comportamentais.
Para investigar essa hipótese, os pesquisadores desenvolveram um dispositivo vestível capaz de registrar o fluxo de ar nas narinas separadamente, de forma contínua, por 24 horas. A experiência foi conduzida com 100 voluntários saudáveis entre 18 e 35 anos e, com base nos dados obtidos, os cientistas conseguiram então identificar os indivíduos com uma precisão surpreendente, apenas analisando os padrões de respiração nasal.
Ao usar algoritmos de inteligência artificial treinados com 24 parâmetros respiratórios, como volume de inalação, duração da expiração e variações entre ciclos respiratórios, a equipa conseguiu não apenas identificar as pessoas, mas também demonstrar que esses padrões se mantêm estáveis por longos períodos, inclusive em sessões separadas por quase dois anos, funcionando como “assinaturas biológicas”. Em testes realizados meses depois, os investigadores conseguiram identificar corretamente mais de 95% dos participantes durante o período de vigília e cerca de 71% durante o sono.
“Poderíamos pensar que a respiração já foi medida de todas as formas possíveis. Mas deparámo-nos com uma forma completamente nova de analisá-la. Consideramos a respiração como um marcador da atividade cerebral”, comenta Noam Sobel, autor principal do estudo.
A precisão foi comparável, ou até superior, à de tecnologias de reconhecimento de voz, sublinham. “Achei que seria muito difícil identificar alguém, já que cada um estaria a fazer coisas diferentes, como correr, estudar ou descansar”, afirma Timna Soroka, coautora do estudo. “Mas, surpreendentemente, os padrões respiratórios eram incrivelmente distintos.”
Os dados também revelaram que os padrões respiratórios estão associados a características fisiológicas e psicológicas. O estudo encontrou correlações entre os perfis respiratórios e fatores como índice de massa corporal, níveis de ansiedade e até traços de depressão. Por exemplo, voluntários que apresentaram resultados mais altos em questionários de ansiedade exibiram inalações mais curtas e pausas mais irregulares entre respirações - especialmente durante o sono, onde a respiração nasal se mostrou mais assimétrica. Isso sugere que o “ritmo” a que respiramos pode refletir diretamente o funcionamento do nosso cérebro e até nosso estado emocional.
Estas descobertas abrem novas possibilidades para a monitorização e até intervenção ena área da saúde mental. “Intuitivamente, assumimos que o grau de depressão ou ansiedade altera a nossa respiração. Mas pode ser o contrário: talvez o modo como respiramos contribua para esses transtornos”, sugere Sobel. “Se isso for verdade, poderíamos modificar a respiração para tratar essas condições.”
“O corpo fala – e respira – de maneira única para cada um de nós. Agora conseguimos escutar essa voz silenciosa com alta precisão”, concluem os autores.