Estrume de elefantes e vacas pode servir para fazer papel
Ideia veio de Alexander Bismarck que, ao passar férias numa pequena aldeia, reparou que as cabras comiam ervas secas e que na substância já decomposta "devia haver celulose"
O estrume de animais, como elefantes ou vacas, pode ser uma excelente fonte para fazer produtos de papel, mais baratos e uma forma ambientalmente limpa de acabar com os detritos.
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Os resultados de uma investigação nesse sentido são apresentados hoje no 255.º Encontro Nacional e Exposição da Sociedade Americana de Química (American Chemistry Society, ACS na sigla original), a maior sociedade científica do mundo que se reúne até esta quinta-feira com 13 mil apresentações científicas na agenda.
A ideia de aproveitar o estrume surgiu na ilha grega de Creta, onde Alexander Bismarck passou férias numa pequena aldeia e reparou que as cabras mascavam ervas secas. "Percebi que o que saía no final era matéria da planta parcialmente digerida, pelo que devia haver celulose", disse Bismarck, da Universidade de Viena, Áustria.
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"Os animais comem biomassa de baixa qualidade contendo celulose, mastigam-na e expõem-na a enzimas e ácidos no seu estômago, e depois produzem estrume. Dependendo do animal, até 40% do estrume é celulose, que é então facilmente acessível", disse o investigador, acrescentando que é preciso muito menos energia e tratamentos químicos, comparando com a madeira crua, para transformar o material parcialmente digerido em nanofibras de celulose.
Depois de trabalhar com estrume de cabra, Bismarck e Andreas Mautner, ajudados por estudantes de pós-graduação, fizeram experiências com estrume de cavalos, de vacas e até de elefantes.
No caso dos elefantes o fornecimento de matéria prima é substancial nos parques de África, onde centenas de elefantes produzem diariamente toneladas de estrume, e, lembrou Mautner, as grandes explorações pecuárias nos Estados Unidos e Europa produzem autenticas montanhas de estrume.
Os investigadores trataram o estrume com uma solução de hidróxido de sódio (soda cáustica), que remove parcialmente a lignina (macromolécula das plantas, que pode depois ser usada como fertilizante ou combustível) e outras impurezas, incluindo proteínas e células mortas.
Para remover completamente a lignina e fazer a polpa branca para o papel o material tem de ser branqueado com hipoclorito de sódio (um desinfetante, conhecido por água sanitária). E praticamente não é necessária moagem para criar as nanofibras para o papel.
"É necessária muita energia para moer a madeira e fazer a nanocelulose", salientou Mautner, acrescentando que com o estrume se reduzem as etapas para fazer a pasta de papel, porque o animal já mastigou a planta e a atacou com vários enzimas.
"Produz-se nanocelulose mais barata com as mesmas ou melhores propriedades que a nanocelulose da madeira e com menos consumo de energia e de produtos químicos", disse o investigador.
O produto derivado do estrume pode ter aplicações como o reforço para compósitos de polímeros ou filtros para águas residuais, ou para fazer papel para escrever.
Os investigadores procuram agora perceber se o processo pode ser ainda mais sustentável, produzindo-se primeiro biogás a partir do estrume e depois extraindo as fibras de celulose.