Hospital Santa Maria iniciou estes cuidados em 2020. Profisisonais e doentes diziam ser “o cocktail perfeito”.
Hospital Santa Maria iniciou estes cuidados em 2020. Profisisonais e doentes diziam ser “o cocktail perfeito”.Global Imagens Leonardo Negrão

Doentes tratados em casa já equivalem a um hospital de média dimensão. E vão aumentar

O número de doentes internados no domicílio bateu recordes em 2023 (10 037), mais 12,3% que em 2022, gerando uma poupança de 97 513 dias de internamento nos hospitais. O presidente da Associação dos Administradores Hospitalares diz que a organização de cuidados terá de passar por aqui no futuro.
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Pela primeira vez, em 2023, o número de doentes tratados em casa ultrapassou a barreira dos dez mil, mas o objetivo é chegar aos 30 mil, em 2026. O que significa que, “no futuro, a hospitalização terá de passar obrigatoriamente por este tipo de cuidado, não só pelas vantagens que tem para o doente, como pela poupança que gera aos hospitais”, argumenta ao DN o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares (APAH), Xavier Barreto. 


De acordo com os dados do Ministério da Saúde (MS), em 2023, a capacidade instalada em termos de camas libertadas nos hospitais foi de 352, mais 4,1% face a 2022, o que já “é equivalente a um hospital de média dimensão”.

Ou seja, a resposta no domicílio, assegurada por equipas multidisciplinares (médicos e enfermeiros) de hospitalização domiciliária, existentes em 36 unidades do país, permitiram reduzir “a demora média de internamento de 9,9 para 9,7 dias, estimando-se uma poupança de 97 513 dias de internamento nos hospitais, com ganhos para os doentes em conforto, segurança e autonomia e vantagens na organização do internamento hospitalar”, destaca o MS. 


Ao todo, foram realizadas 130 136 visitas a casa dos doentes, um aumento de 14% face a 2022, tendo sido registada, uma taxa de eficiência de 49,73% com este tipo de internamento, e apenas com metade dos encargos médios que seriam necessários em contexto hospitalar.

Estes resultados levaram a equipa do ministro Manuel Pizarro, em vésperas da sua saída, a publicar um diploma, no dia 14 de março, que permitirá às equipas de hospitalização domiciliária organizarem-se em Centros de Responsabilidade Integrada (CRI), um mecanismo de gestão dentro dos hospitais que permite “às equipas funcionarem mais autonomamente e ganharem mais”. 


 Por outro lado, o diploma estabelece ainda a criação de um “grupo de trabalho que, será liderado pelo administrador aposentado, Delfim Rodrigues, que terá como missão desenvolver “o modelo de avaliação de desempenho das equipas dedicadas às unidades de hospitalização domiciliária”. O objetivo é “consolidar o trabalho destas equipas”.


Para o presidente da APAH, a criação de Centros de Responsabilidade Integrada “é uma boa solução para esta e outras áreas”, mas, neste caso, ainda mais. “O internamento domiciliário, como forma de organização dos cuidados, é algo que está muito desenvolvido nalguns países europeus, mas também tem vindo a ter avanços significativos em Portugal, e muito por conta do esforço de todas as equipas que trabalham nesta área”.


Recorde-se que a hospitalização domiciliária foi introduzida no nosso país como uma forma de cuidado no Serviço Nacional de Saúde, em 2018, pelo despacho n.º 9323-A de 3 outubro, e, ao fim de cinco anos, já está a bater recordes. Isto porque, nalgumas situações, “o ambiente de casa é o melhor para um doente convalescer. É mais confortável, mais amigável e onde se corre muito menos riscos - num hospital há maior risco de quedas e até de se contrair infeções graves, que são cada vez mais prevalentes no meio hospitalar”, defende Xavier Barreto. 

Libertar uma cama é bom para o hospital e é bom para o doente

No entanto, “não são todos os doentes que reúnem os requisitos necessários para poderem ser internados em casa - tem de ter uma casa com condições para o receber na sua convalescença, um cuidador a tempo inteiro e contactável”. Portanto, há algumas patologias, como convalescença pós-cirúrgica e tratamentos no âmbito do hospital de dia, que integram os cuidados que podem levar ao internamento no domicílio, mas “as patologias graves, essas, continuam a necessitar de resposta dentro dos hospitais”, explica. E é neste aspeto que a hospitalização domiciliária se apresenta como uma mais valia, já que no ano passado os internamentos equivaleram a 352 camas libertadas - ou seja, um hospital de média dimensão, assume o MS.

“Uma das vantagens é este tipo de internamento, libertar, à partida, uma cama. E há inúmeras situações em que isto pode acontecer, porque o doente está em condições de continuar o resto do seu internamento no domicílio com o apoio das equipas hospitalares que integram médicos e enfermeiros. A única diferença de um internamento é que o doente está em casa”, reforça Xavier Barreto.

Para o administrador este tipo de cuidado é tanto mais importante quanto mais se olha para a realidade que se tem vivido nos últimos anos nos serviços de urgência durante o inverno. “Temos dezenas de doentes vários dias à espera de serem internados numa cama hospitalar. Uma cama hospitalar é um bem escasso. Tem um custo elevadíssimo, que pode ir das centenas até aos milhares de euros, tudo depende dos recursos usados. Portanto, libertar uma cama para poder internar mais doentes e reduzir tempos de espera é muito importante para as unidades, mas também para os doentes. É bom para todos”, diz.


A criação dos CRI nesta área poderá levar a um maior interesse dos próprios profissionais para este tipo de cuidado, e, consequentemente, a um aumento de equipas nas unidades do SNS espalhadas pelo país, como as que existem nas Unidades Locais de Saúde Lisboa Central, Lisboa Norte e de São João, no Porto. Um dos objetivos dos CRI é, precisamente, fazer com que “seja mais fácil recrutar e reter profissionais”.

Por agora, só algumas patologias integram os requisitos para o internamento domiciliário, mas, no futuro, Xavier Barreto espera que estas “possam ser alargadas à medida que as equipas também vão crescendo”. E já há alguns exemplos com bons resultados

“Em Guimarães temos um projeto que ganhou, no ano passado, o prémio da APAH, e que assenta na realização de tratamentos de quimioterapia em casa do doente, não tendo este de sair para ir ao hospital fazer a perfusão de um fármaco endovenoso. Este tipo de cuidado pode e deve crescer tanto para patologias de convalescença como no âmbito da atividade do hospital de dia”, conclui. 

O Governo do PS determinou também como “áreas prioritárias para a criação de CRI os Serviços de Urgência, Saúde Mental, Medicina Interna, Pediatria, Dermatovenereologia, Gastroenterologia. Nestas unidades, além da remuneração base, os profissionais auferem de incentivos ao desempenho que podem ir até 40% da remuneração mais elevada da carreira correspondente”.

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