Discotecas reabrem sexta-feira depois de uma "luta pela sobrevivência" de 18 meses

O Village Underground, em Lisboa, abre as portas da sua sala de dança às 00:01 de sexta-feira, depois de "uma luta" de 18 meses para sobreviver, mas muitas discotecas da capital apenas pretendem encher as pistas mais tarde.

A terceira fase do atual processo de desconfinamento tem início às 00:00 de 01 de outubro, sexta-feira, altura em que os espaços de diversão noturna podem voltar a abrir portas com a apresentação, pelos clientes, do certificado digital de vacinação contra a covid-19 ou teste negativo.

Este foi o único setor de atividade que esteve sempre fechado desde o início da pandemia, em março de 2020.

"A Sala reabre no primeiro minuto de dia 01 de outubro, o primeiro minuto possível para reabrir as salas de espetáculo e da noite, e vai abrir até as seis da manhã, o nosso horário pré-pandemia - e esperamos que assim se mantenha - e vai voltar a existir uma pista de dança que é aquilo que tanto ambicionávamos durante estes últimos 18 meses", disse à Lusa Mariana Duarte, uma das cofundadoras do Village Underground Lisboa.

"Não há reabertura da Sala, mas uma abertura do horário da meia-noite às seis", precisou Gustavo Rodrigues, o DJ residente do espaço, também um dos cofundadores do espaço que chegou a Lisboa em 2014, conhecido por possuir contentores marítimos e dois autocarros de dois andares, onde funciona a restauração.

Desde março de 2020, no Village Underground, e à medida que as restrições foram avançando de fase, a restauração recomeçou a funcionar, assim como as aulas na academia de música ou as performances de teatro e dança até às 20:00.

Quando possível, a esplanada exterior foi palco de concertos.

"Vamos ter de cumprir as regras, esta atividade ainda continua limitada só podemos deixar entrar com certificado, não há autotestes, nada", disse Gustavo Rodrigues, frisando que o espaço irá continuar a "cumprir as regras enquanto tiver de ser".

O responsável lembrou que dentro do setor da cultura os últimos 18 meses foram "uma montanha-russa", com muitas coisas fechadas ou restringidas, com uma paragem abrupta em março de 2020, "um verão limitado", voltando a fechar no primeiro semestre de 2021 e uma abertura agora, no segundo semestre.

"Foi difícil e foi uma luta para sobreviver, mas conseguimos chegar ao lado de cá, tivemos de conseguir chegar ao lado de cá", afirmou.

Para os responsáveis do Village Underground, que mantiveram grande parte da equipa a funcionar por causa da restauração e da programação musical na esplanada, foi agora necessário reativar a equipa de segurança, responsáveis de porta, de bares e de limpeza.

"Está a assentar a poeira e temos de arrancar outra vez", disse com alguma emoção Gustavo Rodrigues.

As portas da Sala -- espaço pelo qual é conhecido o espaço de dança -- abrem às 00:01 de sexta-feira, dia 01 de outubro, e vão estar abertas no fim de semana, na sexta, sábado e segunda-feira, véspera de feriado.

"Vamos ter um fim de semana com uma cereja no bolo", disse Mariana Duarte, salientando o facto de ter em conta que "há pessoas que estão com receio de voltar a uma sala fechada numa pista de dança".

A estas, aconselhou que vão sem medo, garantindo que tudo está a ser feito em segurança, cumprindo todas as regras.

"Situação das discotecas já não era saudável"

José Gouveia, da Associação Discotecas Nacional (ADN), explicou por seu turno à Lusa ter conhecimento que só um espaço de dança irá abrir de 30 de setembro para 01 de outubro, dois ou três na noite de sexta-feira para sábado e no fim de semana e, entre 07, 08 e 09 de outubro, abrem mais um ou dois.

"É grave até porque sabemos que a situação das discotecas já não era saudável antes da pandemia, foi a estocada final, o Estado nunca olhou para isso", disse o responsável.

Apesar de não ter dados exatos sobre o número de discotecas existentes em Lisboa, por não haver um CAE (Classificação da Atividade Económica para as finanças) específico, José Gouveia justificou que parte daqueles espaços que não vão abrir tem a ver com a falta de apoios estatais.

"Havia uma necessidade, por via de ausência de apoios por parte do Estado, de as empresas abrirem, caso contrário iriam fechar e esses apoios ainda não chegaram, essa é a grande preocupação: se hoje estamos a dois dias da abertura e há espaços que não vão abrir é porque não estão devidamente apoiados pelo Estado e não têm dinheiro para abrir as suas portas", alertou.

José Gouveia lembrou que as discotecas que abrirem entre dia 07 e 08 abrem exatamente quando "se comemoram 19 meses de porta fechada, uma comemoração infeliz", frisando que durante esse percurso houve "muitas baixas" e que não foi fácil estar fechado "sem receitas e com custos associados" de 'lay-off' ou de rendas, por exemplo.

José Gouveia mostrou-se ainda cauteloso quanto à reabertura das discotecas, lembrando que a "noite será uma incógnita", mas ao mesmo tempo, lembrou que estes espaços de diversão noturna "controlavam a noite".

"Com as discotecas abertas, esse controlo [dos jovens] será feito e as imagens que tivemos oportunidade de ver em Santos e na rua de São Paulo não se vão repetir", disse, aludindo às enchentes de há cerca de duas semanas naquelas zonas de Lisboa.

"Não sabemos a noite que vamos ter, qual é o estado de espírito, de alma que os utentes da noite têm. Que níveis de confiança têm, será que entram numa discoteca e se sentem bem, estão à vontade, não têm nenhum sentimento claustrofóbico ou hipocondríaco. Temos de perceber", alertou.

Nesse sentido, José Gouveia referiu ter prevenido os operadores desta indústria que "façam as coisas com calma", que não encham os espaços "até não caber mais ninguém, apesar de não haver limitação delineada".

"Temos de ser conscientes, as pessoas precisam de um tempo para recuperar a sua confiança", frisou.

A precisar de obras e em luta contra o tempo e falta de apoios

Os sofás colocados na rua das Galerias de Paris e o cheiro do verniz a ser colocado no chão de madeira do Plano B, perto da Torre dos Clérigos do Porto, não enganam. Há frenéticas obras de manutenção e de limpeza em curso para reabrir o espaço noturno esta sexta-feira, dia que o Governo anunciou para se poder reabrir bares e discotecas com exigência de certificado digital de vacinação contra a covid-19.

"Já esteve um caos. Agora está quase pronto para voltar à quase normalidade e reviver as boas noites que cá tivemos", conta Rúben Santos, gerente do Plano B, clube noturno que reabre esta sexta-feira. Às 22:30 está marcado o concerto com a banda "Throes and The Shine" e a noite continua com DJ's.

"Foi uma notícia inesperada que o Governo anunciou quinta-feira passada. Não estávamos à espera que fosse para já. Pensávamos que iria ser mais tarde", admitiu Rúben Santos. A surpresa pelo anúncio do Governo justifica-se, precisamente, pelas obras que ainda estão a decorrer a poucas horas antes de reabrir.

Os sofás de tecido vão ser ainda retirados para uma melhor higienização e só ficam os de cabedal e a equipa de manutenção da máquinas de cerveja fazia os últimos ajustes.

As obras em curso decorrem também na discoteca Indústria, na avenida do Brasil, na Foz do Porto, onde uma infiltração das águas pluviais durante o inverno obrigou à substituição do chão e pintura das paredes.

"Todos os clubes e discotecas, fechadas há mais de um ano, precisam de obras acentuadas e isso leva algum tempo. Essa foi a dificuldade. Numa semana conseguir equipas de trabalho e de manutenção, que conseguissem dar resposta em qualidade e nos prazos para abrirmos no dia 1. Felizmente, vamos conseguir abrir nessa data, mas está a dar muito trabalho", declarou Rúben Dominguez, diretor artístico e gerente do Indústria Club, avançando à Lusa que o concerto ao vivo do músico britânico Fatboy Slim, reagendado durante o confinamento para esta sexta-feira, voltou a ser recalendarizado, agora para 8 de outubro.

O Indústria vai reabrir sexta-feira, às 23:00, e promete "surpresas" para os clientes com "artistas conceituados".

"Vai ser um voto de confiança e uma surpresa que lhes queremos dar numa noite em que, acima de tudo, queremos festejar a reabertura do clube que está a fazer falta a muita gente", observou Rúben Dominguez, alertando que a falta de apoios do Estado ao setor empresarial da noite é um tema que está a ser "negligenciado", porque é um setor que emprega muito, mas que se viu obrigado a despedir muita gente.

A dificuldade acumulada nestes 18 meses, porque os custos não acabaram, mais a necessidade de investimento para reabrir, é algo que não está a ser visto pela tutela com a "devida dignidade", alerta Rúben Dominguez, sublinhando que agora faz ainda mais falta, com a reabertura e criação de emprego.

A bola de espelhos pendurada por cima da pista do Indústria, que refletiu a vida de milhares de pessoas que ali dançaram nos últimos 34 anos, vai ali continuar suspensa, à espera dos apoios do Governo que teimam em não chegar, mas com a certeza de ir voltar a refletir a alegria de dançar e conviver.

Com a certeza de abrir em grande estilo está o Pérola Negra, um antigo 'cabaret' e bar de 'striptease' do Porto, na sua terceira fase, que agora em formato de clube noturno tem programação cultural regular e que depois de mais dum ano e meio encerrado vai reabrir sexta-feira, dia 01 de outubro, às 23:00.

Depois de tempos "angustiantes" causados pela covid-19, o proprietário, Hélder Leite, conta que se foram prevenindo, com obras de manutenção quase todos os meses para manter a "casa viva" e "apresentável".

A parte elétrica, aparelhagens, robótica, e das luzes foi toda revista, bem como a higienização das máquinas de cerveja, descreve Hélder Leite.

O sistema de ventilação e extrações de ar, saneamento, sistema de frios, a ativação do sistema 'contactless' para os pagamentos, bem como a manutenção dos rádios para a comunicação interna também foi tudo revisto.

O proprietário do Pérola Negra quer que seja um recomeço marcado pela calma necessária para dar de novo vida aos míticos sofás vermelhos, varões e espelhos que decoram o espaço, mas avisa que continuam a ser necessários os apoios do Apoiar e Apoiar Rendas que "ainda não chegaram", nem se há uma previsão de quando vão chegar.

O Programa Apoiar é um instrumento de apoio à tesouraria das empresas, que atuem em setores particularmente afetados pelas medidas de confinamento, assegurando e preservando a sua liquidez no mercado e a continuidade da sua atividade económica durante e após o surto pandémico, financiado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER).

Em entrevista à Lusa, o presidente da Associação de Bares e Discotecas da Movida do Porto, Miguel Camões, denunciou quarta-feira que os apoios de 2021 prometidos pelo Governo continuam sem chegar ao setor e alertou que vai ser "muito duro" reabrir sem liquidez de tesouraria.

A partir de outubro, o país vai evoluir do estado de contingência para estado de alerta, com reabertura de bares e discotecas, com exigência de certificado digital de vacinação.

Mais Notícias

Outros Conteúdos GMG