Das margens do Tejo para a mesa
As vinhas crescem todas à beira-rio, mas a diversidade de perfis é a maior característica da região vitivinícola Vinhos do Tejo, hoje composta por um total de 17 mil hectares que produzem anualmente cerca de 650 mil hectolitros, que é como quem diz perto de 10% da produção nacional. Quase a terminar a época de vindimas (começam cada vez mais cedo, em meados de Agosto) esta região mostrou algumas das suas novidades da casta Castelão, numa quinta multissecular (e multigeracional) da Região de Tomar, também ela produtora de vinho, o Casal das Freiras.
Com esta designação oficial Castelão (já foi Castelão Francês e é ainda conhecida pelos nomes João de Santarém, no Tejo, Trincadeira ou Trincadeiro, ou ainda Periquita, como se popularizou), esta é uma casta muito versátil e hoje está na lista das mais plantadas em Portugal: é a 5.ª, a nível global, e a 4.ª, no que se refere a variedades de uvas tintas. No Tejo mantém o estatuto da casta tinta mais plantada e, por conseguinte, a mais expressiva nos vinhos, com 80% dos tintos a tê-la na sua composição.
A diversidade da casta ficou bem demonstrada na prova de apresentação, que deu a conhecer alguns estreantes entre brancos, tintos e rosé: Quinta da Ribeirinha (Contracena Blanc de Noirs Colheita Selecionada Castelão branco 2022 • IG Tejo, PVP: €9,00€), Agro-Batoréu (Bathoreu rosé 2021 • IG Tejo , PVP: 6,00€); Quinta da Atela (Casa da Atela Castelão rosé 2021 • IG Tejo, PVP: 11,50€); Alveirão (Chícharo rosé 2022 • DOC do Tejo, PVP: 12,00€); Casal das Freiras Vidal x Niepoort Castelão tinto 2022, PVP: 15,00€), Companhia das Lezírias Séries Singulares Castelão tinto 2021 (PVP: 25,00€); Espargal de D. Luís Reserva tinto 2021 (IG Tejo:€13,00€); Reserva das Pedras tinto 2017 (Quinta da Alorna, DOC do Tejo, PVP: 19,90€); Anunciada Velha tinto 2021 (IG Tejo PVP: 41,90€); e Casal Branco Monge Espumante Bruto branco 2015 (DOC do Tejo: 18,50€).
Com o vinho no copo, comprova-se que, conforme dizem os guias, a Castelão dá origem a vinhos estruturados, frutados, com particular incidência na groselha e frutos silvestres. Com a evolução, surgem notas de compota ou ameixa em calda. São vinhos agradáveis e macios, com frescura, acidez e taninos fortes. A região vitivinícola assegura que podem ser consumidos normalmente cedo, mas se estagiados em madeira, têm boa aptidão para o envelhecimento.
Como refere João Silvestre, diretor da Vinhos do Tejo, "a Região de Tomar tem vindo a ganhar novos produtores e novos projetos nos últimos anos. Para além disso, há vinhas centenárias que estão a ser descobertas por uma nova geração, que sabe tirar partido da riqueza destes terrenos e está já a produzir vinhos muito interessantes, com grande diversidade de perfis: temos desde vinhos frisantes a licorosos." Estas qualidades, assegura, fazem com que a procura cresça dentro e fora de Portugal, com Polónia, Suécia e Brasil a destacarem-se enquanto principais mercados importadores.
Na produção anual desta região vitivinícola, 90% são vinhos com Indicação Geográfica Protegida (IGP) e 10% com Denominação de Origem Controlada (DOC). A importância do setor nesta zona do Tejo parece remontar aos tempos pré-romanos e, nos primórdios da nacionalidade, já D. Afonso Henriques fazia referência aos vinhos da região no Foral de Santarém, datado de 1170. Pela mesma época, o Cartaxo terá enchido 500 navios com tonéis de vinho que, em apenas um ano, terão atingido o valor de 12 000 reis. Assim terá acontecido, com anos melhores e outros piores, até 1765, altura em que se deu o desaparecimento da vinha nos campos do Tejo, como consequência de uma ordem imposta por Marquês de Pombal.
Em 1989, foram fundadas seis Indicações de Proveniência Regulamentada para vinhos da Região do Ribatejo e, em 1997, foi criada a Comissão Vitivinícola Regional do Ribatejo, a que sucedeu a constituição por lei da Comissão Vitivinícola Regional do Tejo, em 2009.
A quinta Casal das Freiras, que acolheu esta apresentação, é uma das produtoras mais ativas da região. Na mesma família desde o século XIX, deve a designação aos tempos em que o local era habitado por religiosas, que decerto se alumiavam com o azeite das oliveiras centenárias que ali encontramos. Vestígio desses tempos é também a imagem medieval de Santa Catarina que, de acordo com a lenda familiar, terá sido encontrada num tronco de árvore, muito provavelmente porque, durante as invasões francesas, as populações terão ocultado como puderam os seus bens mais preciosos.
Esta propriedade, que associa a modernidade dos métodos ao carinho pelo passado (aqui as uvas ainda são pisadas como antigamente), pode ser visitada e apreciada, no âmbito dos vários programas de enoturismo que a região dos vinhos do Tejo já disponibiliza.
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