Dados do GPS são válidos para despedir empregado
Funcionário usou carro da empresa fora dos dias de trabalho e a firma utilizou esse argumento para rescindir o contrato. Ex-empregado contestou, mas perdeu em vários tribunais e agora no TEDH.
Fernando Augusto trabalhava numa farmacêutica como representante médico desde 1994. Dez anos depois foi demitido porque a empresa detetou um uso abusivo do carro que lhe tinha sido atribuído ao analisar os dados do GPS (Global Positioning System) da viatura, tendo percebido que este funcionário usava a viatura em viagens de lazer e depois, nos relatórios que fazia sobre os quilómetros percorridos em trabalho, inflacionava esses dados para "cobrir" os percursos extra. Com este estratagema Fernando evitava reembolsar a empresa nas verbas que gastava sem ser em trabalho.
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Antes do despedimento, este trabalhador já tinha interposto uma queixa contra a empresa na Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) -- em 2013 --, alegando que este controlo violava os seus direitos. Na altura a decisão foi de arquivamento pois a CNPD considerou que não existia infração das regras de proteção de dados.
Este foi um dos processos que Fernando perdeu nos tribunais, sendo a mais recente conhecida na terça-feira, quando quatro juízes do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH) votaram pela não-existência de violação da vida privada e consideraram também que teve direito a um julgamento imparcial.
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De acordo com o acórdão divulgado pelo TEDH a empresa implementou em 2002 um sistema de gestão de pedidos de reembolso de despesas com deslocações dos colaboradores por intermédio de uma aplicação "onde estes registavam as atividades diárias, semanais e mensais, visitas realizadas, faltas, despesas e cronogramas de próximas visitas". Mais tarde, em 2011, a firma instalou sistemas GPS nos carros dos "representantes médicos", recordando o Tribunal que os "trabalhadores em causa foram informados sobre a instalação e os motivos da medida, que visava sobretudo monitorizar as distâncias percorridas pelos trabalhadores no exercício das suas atividades".
Três anos depois, Fernando é demitido, depois de a empresa fazer um cruzamento de dados entre o registo do GPS e o que ele tinha colocado nos seus relatórios.
Segundo o Tribunal, constatou-se que aumentou as distâncias percorridas a título profissional, de forma a reduzir a proporção de quilómetros que aparentemente fez em viagens privadas aos fins de semana e feriados e evitar o reembolso de despesas já recebidas. Além disso o GPS terá mostrado que Fernando "não tinha trabalhado as oito horas diárias exigidas".
Depois das decisões dos tribunais, incluindo da Relação de Guimarães, o antigo funcionário da empresa farmacêutica apresentou o seu caso ao TEDH, alegando que tinha sido violado o seu direito à privacidade e que não tinha tido julgamentos imparciais.
Perdeu sempre, tendo o Tribunal da Relação feito uma alteração à primeira sentença: teve apenas em consideração os dados de geolocalização referentes às distâncias percorridas "considerando inválidos os dados de acompanhamento da sua atividade profissional".
Perante todos os argumentos apresentados e analisados, os juízes do Tribunal decidiram - 4 contra 3 - pela não-existência de violações dos dois princípios alegados pela defesa de Fernando Augusto.
cferro@dn.pt