A sigla CS5CEP recebe-nos à entrada e está espalhada por todo o lado. As duas primeiras letras correspondem ao símbolo de Portugal em aeronáutica. O número é o determinado pela ANACOM para estações de rádio partilhadas. Já os três últimos carateres proclamam toda a ambição do local: "Centro Espacial Português"..À primeira vista, a designação parece pomposa, considerando que estamos a entrar num espaço da dimensão de um gabinete. Mas torna-se perfeitamente aceitável tendo em conta o que ali se está a tentar fazer - construir integralmente, garantir o lançamento e depois monitorizar um satélite 100% português: o ISTSAT-1..A pequena sala - no polo do Tagus Parque do Instituto Superior Técnico - está repleta de equipamentos, a maioria dos quais rádios de diferentes frequências (HF, VHF, UHF) mas também controladores de antena, destinados a seguir a par e passo os movimentos do futuro satélite artificial e, claro, computadores e monitores. A mesa de reuniões, a um canto, também está repleta naquela tarde: professores e investigadores, estudantes, antigos alunos hoje com ligações à indústria. E há outros cientistas a acompanhar a discussão por videoconferência. Discutem os avanços alcançados e os muitos e variados desafios ainda pela frente..O primeiro, mais caro e mais difícil objetivo da missão já foi alcançado: garantir o "bilhete" da Agência Espacial Europeia (ESA). Após uma competitiva seleção de projetos de todo o continente, o satélite do IST foi escolhido para integrar o próximo lote de CubeSats a enviar para o espaço, onde serão colocados em órbita pelos astronautas da Estação Espacial Internacional (ISS)..Além deste importante apoio, que representa a maior fatia do orçamento (entre 500 mil e um milhão de euros) do projeto, a ESA fornece apoio técnico e o CubeSat - o esqueleto, de medidas standardizadas - daquele que será o satélite. Mas tudo o resto será assumido pela equipa portuguesa..Apesar de estar em causa um cubo com dez centímetros de lado, o design é um trabalho multidisciplinar, que exige o melhor de cada um. "Olhando para as dimensões, parece fácil. Mas não é", garante Rui Rocha, professor e investigador do IST e líder da equipa de 15 elementos - aos quais se somam cinco coordenadores, dois colaboradores e 12 alunos - envolvidos nas várias componentes do projeto. Na realidade, diz, em termos de trabalho não há grandes diferenças para a conceção de um satélite de grandes dimensões. "Tudo isto tem de ser projetado para suportar as condições a que o satélite estará sujeito em órbita", explica..Existe um grupo responsável pelo design de todo o hardware, incluindo os controladores, rádios, sensores, fonte de alimentação e até a mecânica, à base de imanes, que permitirá ao equipamento posicionar-se para captar energia solar e comunicar. Outro grupo desenvolve todo o software, incluindo os sistemas de processamento e comunicação digital. "O nosso objetivo foi sermos nós a fazer os subsistemas todos. E esse foi um dos aspetos que a ESA valorizou", conta Gonçalo Tavares, coordenador dos sistemas de comunicação..Um dos motivos para esta opção é o facto de o objetivo fundamental do projeto ser dar formação às atuais e futuras gerações de alunos do IST. Mas, mesmo sabendo que este será um projeto de duração limitada - uma vez no espaço, o satélite terá uma esperança de vida da ordem dos seis meses -, a missão tem uma finalidade concreta: testar um sistema, igualmente concebido pela equipa, que permitiria colocar os satélites ao serviço do controlo de tráfego aéreo, monitorizando aviões em locais, a meio do Atlântico, onde o controlo terrestre é menos eficiente..Um passo à frente do POSAT-1.Na realidade, o que esta equipa de professores e investigadores, alunos e ex-alunos do IST têm em mãos é a vários níveis inédito em Portugal..O POSAT-1, lançado em 1993, envolveu um consórcio de empresas e universidades portuguesas, teve o projeto liderado pelo cientista Fernando Carvalho Rodrigues e é assumido como o primeiro satélite português. Mas, na realidade, o equipamento foi construído na Universidade de Surrey, em Inglaterra, e boa parte da tecnologia que o manteve em funcionamento, até deixar de comunicar em 2006, tinha origem estrangeira. Nesse sentido, defende Rui Rocha, este será "o primeiro satélite construído por uma universidade portuguesa"..Há outras diferenças para o POSAT-1. Se esse satélite custou cerca de cinco milhões de euros (em valores da época), com o governo de então a assumir três milhões e os privados o remanescente, o orçamento projetado pela equipa do IST - já considerando o fundamental apoio da ESA - varia entre os 500 mil e o milhão de euros, dependendo dos apoios conseguidos..Atualmente existem parcerias com a Associação Portuguesa de Amadores de Rádio para Investigação, Educação e Desenvolvimento (AMRAD) - à qual estão associados vários elementos da equipa -, o Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (INESC) e o Instituto de Telecomunicações. Mas ainda faltam mecenas - nomeadamente no setor privado - para que o projeto, já em fase avançada, se concretize em pleno..Combinação de competências.O projeto do satélite do Instituto Superior Técnico está a ser desenvolvido por alunos, professores e investigadores com formações variadas. Entre as diferentes áreas de competência inclui-se, naturalmente, a Engenharia Aeronáutica. Um sinal de que este desafio junta algumas das mais promissoras cabeças do país. No ano passado, este curso do Técnico teve a nota de entrada mais alta do país, suplantando a Medicina no topo da exigência no acesso ao superior.