Curry Cabral faz transplante hepático com recurso a robô. É o primeiro na Europa
É o primeiro na Europa e apenas o segundo a nível mundial. Depois de Saint Louis, nos Estados Unidos, foi agora a vez do Curry Cabral, em Lisboa, fazer um transplante de fígado inteiro com recurso exclusivo a um robô.
O procedimento - realizado a 5 de fevereiro - durou nove horas e o doente, um homem de 51 anos com cirrose hepática, “já está em casa, em recuperação”, explicou ao DN Hugo Pinto Marques, diretor da Cirurgia Geral e da Unidade Hepato-Bilio-Pancreática. Quando comparado com o mesmo transplante, feito através do método mais comum, o uso de um robô traz vantagens: “A operação feita de forma normal envolve uma grande incisão na parte direita do abdómen. Neste caso, isso muda. Na cirurgia robótica, o corte é bastante mais pequeno, tem entre sete e 10 centímetros de comprimento e acaba por ser um procedimento menos invasivo. É bastante menos agressivo. Além disso, utilizar o robô permite uma maior capacidade para analisar estruturas ao pormenor, ou, ainda, utilizar contrastes que permitam ver detalhes que, de outra forma, não seriam visíveis ou possíveis de analisar. No fundo, é isto que a cirurgia robótica permite: maior profundidade e capacidade de estudo. Isto, claro, além de ser um processo menos invasivo.”
De acordo com o cirurgião, os cuidados com o fígado transplantado foram “os normais” numa intervenção deste género, não havendo distinção relativamente a uma cirurgia comum.
Ainda assim, nem todos os pacientes são elegíveis para esta operação. Conforme explicou o cirurgião (que comandou o robô), “um doente que tenha, por exemplo, riscos de fazer maior coagulação e com perturbações na função hepática, não estará no topo das prioridades. Em sentido contrário, alguém que tenha um tumor no fígado será um bom paciente para este procedimento, porque é alguém que, à partida, terá a função hepática mais preservada”.
As cirurgias com recurso a robô são cada vez mais comuns em Portugal. Além da Unidade Local de Saúde (ULS) de São José (a que pertence o hospital Curry Cabral), também há unidades de cirurgia robótica nos hospitais de Coimbra, São João (Porto) e no Santo António (Lisboa). “O Serviço Nacional de Saúde (SNS) tem um programa estruturado para que isto comece a tornar-se mais comum. Não é apenas algo que sirva só para abanar uma bandeira”, acrescenta Hugo Pinto Marques, concluindo: “O processo de transplantes com robô pode efetivamente trazer grandes benefícios para os doentes.”
Em conferência de imprensa, a presidente da ULS de São José, Rosário Valente de Matos, anunciou que o centro de robótica já realizou 1500 cirurgias em diferentes áreas. Em 2023, foram feitos 533 transplantes. Desde 1992, já foram feitos 2700 transplantes de fígado - 118 dos quais em 2023.
Operação à tiroide já foi feita com o mesmo robô
O centro de robótica da ULS de São José é também pioneiro. Ao nível do SNS, a cirurgia robótica foi iniciada no final de 2019. Em 2023, a ULS passou a ter o primeiro Centro de Cirurgia Robótica em Portugal.
Operando um sistema chamado daVinci, o Curry Cabral tem feito várias cirurgias deste tipo. Em janeiro, por exemplo, foi realizada primeira cirurgia à tiróide com recurso a um robô. Neste caso, os médicos fizeram uma pequena incisão na axila da doente, e inseriram o robô, o que permitiu analisar as estruturas anatómicas mais ao pormenor. Tal como o DN noticiou na altura, foi necessário um ano de formação -- com posterior certificação -- para se poder operar o daVinci, e a equipa foi auxiliada por duas médicas italianas, especialistas neste tipo de cirurgias.
No caso do transplante, a cirurgia foi feita de forma autónoma, sem equipas externas a darem apoio. E, segundo a presidente da ULS de São José, há já algumas dezenas de outros profissionais (não só nacionais) a receberem formação neste centro.