O trambolhão significativo deve causar “apreensão e preocupação”, nota ao DN a presidente da Transparência Internacional (TI) Portugal, Margarida Mano. No pior resultado desde que o Índice de Perceção da Corrupção começou a ser publicado no seu formato atual, em 2012, Portugal caiu quatro pontos (para 57) e desceu nove posições (43º) no ranking de países, uma queda abrupta após mais de uma década de quase estagnação. Para a investigadora Susana Coroado, a avaliação reflete “o retrocesso” do País no campo da transparência.Esta descida é “muito significativa” e “sintomática da ineficácia das políticas anticorrupção”, assinala a presidente da TI Portugal, notando que a tendência é comum a outros países europeus, “especialmente em países do sul, como Espanha, Itália e Portugal, mas também na Alemanha, por exemplo.”Em relação a Portugal, Margarida Mano identifica como “causa fundamental” para o mau desempenho “um conjunto de problemas estruturais que não têm vindo a ser corrigidos.” Problemas que não passam por falta de legislação e mecanismos anticoorupção, mas sim pela sua falta de eficácia, sublinha: “Há um impacto e um desgaste ao longo do tempo provocados pela falta de compromisso político e pela baixa eficácia das medidas e mecanismos anticorrupção que têm sido lançados.”Susana Coroado concorda. A investigadora associada do Instituto de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa, especialista em políticas de controlo da corrupção e regulação da ética política, refere que os resultados refletem “um sentimento crescente de desilusão com a ausência de progresso nesta área, apesar dos sucessivos pacotes anticorrupção adotados”. Para a investigadora, “empresas e especialistas começam a perceber que os novos mecanismos têm tido poucos efeitos, como se tem visto com todos os escândalos recentes”. .Marcelo preocupado com evolução negativa de índice de perceção da corrupção. E dá mesmo um exemplo concreto de “um claro retrocesso” neste campo: “Temos assistido a uma regressão séria na questão da transparência dos titulares de cargos políticos. É mais difícil aceder às declarações de interesses hoje, com a entrada em funcionamento da Entidade para a Transparência, do que era anteriormente. Há vários pedidos de acesso bloqueados em nome da privacidade. Houve de facto um retrocesso nesta matéria”. A presidente da Transparência Internacional Portugal também realça que este é “um alerta, com danos reputacionais para o país”, que podem refletir-se “na economia e na captação de investimento estrangeiro”, por exemplo. “Portugal é castigado por não ter um caminho claro contra a corrupção”, reforça Margarida Mano. A economista, que preside à TI Portugal desde 2023, enumera fragilidades nos mecanismos de integridade, nas políticas de contratação pública, na regulamentação do financiamento dos partidos ou na fiscalização dos rendimentos dos titulares de cargos públicos para exemplificar a ineficiência do combate à corrupção no País. E admite: o retrato evidenciado neste Índice ontem divulgado pela Transparência Internacional deixa “claramente visadas” a classe política e a Justiça portuguesas.Margarida Mano lembra que “ainda falta legislar o lobbying” em Portugal, mas reforça que “mais do que criar novos mecanismos contra a corrupção é fundamental dotar de eficácia os já existentes”. Como “implementar a nova estratégia nacional anticorrupção” desenhada por este governo e que, diz, “é fundamental que, ao contrário da anterior, tenha metas, prazos e seja escrutinada de forma a permitir avaliar progressos anuais até 2030, alinhados com recomendações internacionais”.Que Índice é este?Ao contrário do que o nome do índice pode sugerir, “não se trata neste inquérito de medir a perceção da população em geral”, esclarece Margarida Mano. Ou seja, não falamos de perceções eventualmente empoladas por um crescimento de discursos populistas ligados a determinadas forças políticas. Criado pela Transparência Internacional em 1995 e com a metodologia atual desde 2012, “este é um inquérito que se baseia na perceção de especialistas que analisam um conjunto de instituições com base em 13 índices independentes”, explica. Em quatro deles Portugal teve um resultado mau, piorando bastante face a anos anterior: competitividade, governação sustentável, risco do país e democracia. Os dados de cada país são analisados por quatro especialistas, dois da Transparência Internacional e dois externos. .43.º lugar .Portugal obteve 57 pontos e a 43ª posição em 180 países - queda de 4 pontos e perda de 9 lugares no ranking. Espanha (46ª) e Itália (52ª), caíram dez posições cada. .90 pontos.Ranking é liderado pela Dinamarca, que atingiu 90 pontos (0 a 100), com Finlândia (88) e Singapura (84) no pódio. Sudão do Sul (8), Somália (9) e Venezuela (10) têm os piores resultados..64 pontos.A Região da Europa Ocidental e União Europeia continua a ser a mais bem pontuada no ranking, mas regista-se o retrocesso em grandes economias europeias, como França (-4 pontos), Alemanha (-3 pontos), Espanha (-4 pontos) e Itália (-2 pontos).