Clima do futuro aumenta o risco de incêndios florestais

Especialistas dizem que o ordenamento da floresta, com a limpeza regular de matos, é uma das medidas essenciais
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Não é possível dizer que as condições meteorológicas, com temperaturas acima da média para fim de primavera, potenciadoras da dimensão e violência do incêndio nos concelhos de Pedrógão Grande, Castanheira de Pera e Figueiró dos Vinhos, são já uma manifestação das alterações climáticas.

"É muito difícil medir isso de forma definitiva", esclarece Filipe Duarte Santos, professor e investigador da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e especialista em alterações climáticas. "O que se pode dizer, e os modelos indicam, é que no contexto das alterações climáticas, o risco de incêndios florestais vai aumentar em toda a bacia mediterrânica e também em Portugal", sublinha.

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No mundo globalmente mais quente que aí vem, as condições meteorológicas vão tornar-se mais adversas em Portugal com mais ondas de calor, maior número de dias com temperaturas extremas, com diminuição da precipitação no inverno e na primavera, e com antecipação e prolongamento da época de incêndios. Na verdade, essas tendências começam a ser visíveis e é nesse contexto que a floresta portuguesa, já de si "explosiva" nas regiões Norte e Centro, como diz Filipe Duarte Santos, se tornará mais vulnerável nesse futuro talvez já não tão distante.

Das maiores manchas verdes da Europa

Constituída essencialmente por pinheiro-bravo e eucaliptal, nomeadamente na região Norte e Centro - a sul predomina o sobreiro, resistente ao fogo -, a floresta ocupa 35,4% da área continental do país, mas tem diminuído de dimensão, sobretudo devido aos incêndios florestais. Entre 1990 e 2015, ano dos últimos dados, a mancha florestal bruta perdeu no continente 7,39% do seu total e o pinheiro-bravo, que na década de 1990, representava a maior mancha florestal no país, perdeu terreno para o eucaliptal que o suplantou e é agora a espécie predominante, com mais de 800 mil hectares (dados de 2010), contra 710 mil hectares de pinheiro-bravo.

Na região Centro do país, são estas as duas espécies predominantes e é também aí, e no Norte do país, que o flagelo dos incêndios florestais se repete, ano após ano, sobretudo desde há três décadas, agravado pela desertificação crescente dos territórios e o abandono da agricultura. Os terrenos agrícolas, que funcionavam como tampão entre as zonas florestadas, encheram-se de matos, ligando agora a floresta numa só mancha contínua - e perigosa.

"Com o abandono e a saída das populações, a floresta da região Centro tornou-se numa das maiores manchas contínuas de pinhal bravo da Europa que teve, no seu auge, muitas centenas de milhares de hectares, mas que tem ardido ano após ano em incêndios de grande dimensão", diz José Cardoso Pereira, professor e investigador do Instituto Superior de Agronomia e especialista em cartografia de área florestal queimada e de risco de incêndio.

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Porque arde, afinal, a floresta desta forma em Portugal? São vários os motivos, nota o especialista. "Arde porque está pouco tratada, porque é plantada e depois não é limpa do mato que ali se acumula e que depois funciona como combustível", explica José Cardoso Pereira, sublinhando que no caso da região Centro, o clima particular também dá uma ajuda. "A região recebe influência do clima atlântico, e por isso durante o inverno chove, o que promove o crescimento da vegetação. Mas também está suficientemente a sul para ter verões quentes e secos, tornando-a vulnerável a incêndios. Sem a gestão adequada, e com muita vege-tação acumulada, a floresta arde", refere. Por isso, diz, "é urgente" pensar a floresta a longo prazo. "Tem-se posto a ênfase nos meios de combate aos incêndios, mas essa é uma atuação de última linha, a primeira tem de passar por uma gestão adequada de prevenção", sublinha. Em dias de calor extremo como foi sábado e numa zona de terrenos acidentados, como a dos concelhos afetados, com relevos e vales acentuados que promovem a formação de ventos cruzados e propagação rápida das chamas, "os meios de última linha nunca são suficientes".

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