Em 2001 - Odisseia no Espaço, a obra-prima do cinema de Stanley Kubrick, de 1968, há dois momentos em que o realizador, só pela imagem, demonstra como os astronautas que encontram na Lua o monólito extraterrestre são de facto descendentes dos primatas que, quatro milhões de anos antes, são visitados por um objeto idêntico, no Paleolítico: ambos (homo sapiens e australopithecus) tocam no paralelepípedo negro à sua frente, instintivamente, como forma de se assegurarem que de facto o ser estranho existe..Esta necessidade muito humana (e não só...) de, pelo toque, asseverar a realidade - e o valor - do objeto está como que inscrita no nosso ADN. É sem dúvida uma das razões de a música em discos de vinil ter regressado, por exemplo; e de aconselharmos sempre os nossos leitores a pegarem nos smartphones e wearables que testamos, mesmo que os recomendemos..Particularmente, é o que sugerimos que faça com o novo Xiaomi 14, o topo de gama compacto do maior fabricante chinês de smartphones, que tem tudo para ser um aparelho fantástico - com algumas pequenas exceções que podem (ou não) fazer-lhe, a si, impressão..Comecemos assim pelo que é, para nós, o menos bom: a cobertura traseira e - apesar de estar melhor - o sistema operativo..Para um telefone de (números redondos) 1100 euros era de esperar que o toque (lá está...) do corpo do telefone não se sentisse tão “plástico”. A título de exemplo, e sem sair da marca, o excelente Redmi Note 13 Pro+ (5G), que testámos há pouco tempo, tem um tato mais premium e custa metade do preço. O resultado deste acabamento é que, quando se dá uns toques nas “costas” do telefone, sente-se oco....Parece um pouco incompreensível esta decisão do fabricante chinês, até que nos lembramos que, na realidade, este não é o verdadeiro topo de gama da marca: existe acima dele o 14 Ultra. Torna-se assim um pouco difícil não ficarmos a sonhar com ele....Quanto ao sistema operativo, há que elogiar o novo HyperOS, criado pela Xiaomi, mas - segundo o fabricante - baseado em Android 14, porquanto é um pouco mais simplificado do que o anterior MIUI. No entanto, continua a ter muitas influências iOS (iPhone) - como as definições serem acessíveis puxando do cimo direito e as notificações puxando do cimo esquerdo - que para um utilizador Android pode confundir (ou irritar...)..Além disso, a Xiaomi teima em incluir nos seus aparelhos imensas apps terceiras (bloatware) desnecessárias que, ainda que desinstaláveis, são mais tempo de configuração evitável..Uma fantástica câmara compacta.Dito tudo isto, se está à procura de um telemóvel nesta gama de preços sugerimos mesmo que vá até uma loja e pegue nele. Irá, com certeza, impressionar-se com o imponente módulo de objetivas Leica, que ocupam quase um quarto da traseira do aparelho..É aqui que está um dos grandes trunfos do modelo. Já para não falar no impressionante que é a quantidade de tecnologia que a Xiaomi conseguiu enfiar numa espessura de apenas 8,2 mm - incluindo um processador (e respetivo dissipador de calor) Qualcomm Snapdragon 8 Gen 3, bem como uma bateria de 4610 mAh (que, pela nossa experiência, aguenta perfeitamente o dia todo) e tecnologia de hipercarregamento rápido de 90 watts..O ecrã AMOLED de 6,36 polegadas é só muito ligeiramente superior aos do Google Pixel 8 e Samsung Galaxy S24 (os três telefones são praticamente todos do mesmo tamanho), semelhante ao que equipava o Xiaomi 13, mas agora com refrescamento adaptativo de 1 a 120 Hz..Deixámos o melhor para o fim: a câmara tripla de 50 megapíxeis com objetivas e software da casa de fotografia alemã Leica capta imagens com um aspeto natural difíceis de bater..Em vídeo, grava até 8K a 24 frames por segundo (fps) e a 4K a 40 ou 60 fps, em Dolby Vision HDR, com uma qualidade fabulosa..Mas é em fotografia que todo o seu potencial se mostra. Como vem sendo habitual nestes Xiaomi, o utilizador tem à escolha, com um simples toque, fazer o equivalente a trocar objetivas numa câmara profissional (de uma 35 mm para uma de 50, 75 ou 90 mm)..Depois, pode usar os filtros Leica Authentic - o nosso favorito - e Leica Vibrant, algoritmos criados pelos laboratórios alemães. Com isto, é possível captar fotos de uma qualidade que, de certeza agradaria, e muito, ao fotógrafo que também era Stanley Kubrick.