Assaltos a carros a subir devido aos metais preciosos nos catalisadores

Preço elevado de platina, paládio e ródio explica crescimento deste crime. Em 2020, a PSP recebeu 839 queixas, neste ano até agosto já foram 3206. Polícia cria equipas especiais.
Publicado a
Atualizado a

Tal como sucedia diariamente nos últimos meses, João estacionou o carro de manhã junto a uma árvore nas traseiras da sua casa, uma opção para proteger o veículo do sol. O que não podia adivinhar é que ao final da tarde quando se preparava para retirar o seu Volkswagen desse local ao ligar o motor o ruído que ia ouvir era diferente. Estranhou e, como mora perto de uma oficina, andou umas centenas de metros e pediu que levantassem o carro. Nesse momento soube a que se devia esse barulho forte e estranho: tinha ficado sem o catalisador. Dois cortes nas pontas do tubo de escape eram a prova de que tinha sido roubado.

Nessa tarde, João tornou-se uma das 3206 pessoas que em oito meses foram surpreendidas pelo desaparecimento desse dispositivo que filtra as emissões tóxicas do motor e as transforma em gases mais limpos como H2O, CO2 ou nitrogénio. Um aumento exponencial quando comparado com as 839 queixas de todo o ano de 2020.

Ficou também a saber que não era o primeiro caso a acontecer na zona onde mora, no Seixal (margem sul do Tejo), e que diariamente estavam a ser conhecidos casos como o seu.

O motivo também lhe foi explicado: o furto era motivado pela tentativa de retirar os metais preciosos que fazem parte do catalisador, platina, paládio e ródio. Todos eles com valores elevados no mercado - por exemplo, ontem, a platina estava cotada a 27,34 euros o grama, o paládio a 39,65 euros e o ródio já chegou a atingir os 50 euros o grama, sendo considerado o metal mais caro do grupo da platina e até com valor superior ao ouro.

São estas as contas que fazem os grupos que se dedicam a estes furtos, atividade que aumentou de tal forma neste ano que a Polícia de Segurança Pública decidiu criar equipas especializadas para investigar este crime (designadas SRICA).

De acordo com as informações disponibilizadas ao DN por fonte oficial desta força de segurança, as Equipas Regionais de Investigação à Criminalidade Automóvel (SRICA) tinham referenciados, até a setembro, 449 suspeitos de participarem nesta atividade. Neste grupo estão incluídas as pessoas que retiraram os catalisadores dos carros, quem recebe esses equipamentos, quem os revende e indivíduos que "dissimulam a proveniência dos lucros (branqueamento de capitais)". Foram ainda recuperados pelas SRICA mil catalisadores furtados.

A atuação de quem procura os catalisadores é reconhecida pela PSP como cada vez mais ousada. "As técnicas utilizadas estão em constante evolução e são cada vez mais audaciosas, havendo registos de casos de tentativa de furto destes componentes em veículos estacionados em locais com assinalável passagem de pessoas e/ou em plena luz do dia."

Foi esta a situação que aconteceu a João que deixou o carro praticamente um dia "à sombra" num sítio onde "passam algumas pessoas", o que não impediu que lhe cortassem o catalisador. E a peça que comprou para substituir a retirada do seu Volkswagen custou-lhe perto de 300 euros.

O valor do equipamento é um dos motivos que levam ao aumento dos furtos. Após os retirarem dos carros negoceiam-nos com vendedores de peças a um preço baixo e estes conseguem assim revender o material a um custo menor do que a aquisição de um novo. O que é aproveitado por quem se depara com este tipo de furtos.

De acordo com a PSP, este tipo de criminalidade tem ocorrido em todo o país, mas com particular incidência na Área Metropolitana de Lisboa, estando referenciados grupos que atuam com "grande mobilidade por todo o território".

Quanto aos alvos, a polícia adiantou que os carros mais atingidos por este tipo de crime são "os registados entre 1998 e 2001".

Com ocorrências denunciadas desde o início do ano, os três meses com mais queixas foram maio, junho e julho, sendo o período entre março e junho aquele com maiores denúncias - neste último registaram-se 726. Agosto foi o segundo mais elevado, mas com uma descida para 591. Em 2020, o mês com maior registo foi o de novembro com 222 queixas, o que só supera dois meses de 2021 - janeiro (138) e fevereiro (145).

A PSP diz estar preocupada também com o impacto que este fenómeno tem no ambiente. Como refere nos dados enviados ao DN "os veículos não podem circular sem este componente [catalisador] e a recolha dos componentes realizada de forma ilegal e sem cumprir as normas de segurança ambiental é suscetível de causar perigo para o ambiente.

Ciente deste grave risco, a PSP tem intensificado a partilha de informação com a Agência Portuguesa do Ambiente".

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt