Aprender a salvar vidas para um part-time nas férias de verão

Os candidatos são, na maioria, estudantes universitários à procura de uma carreira sem um compromisso temporal longo. Mas ser nadador-salvador é também uma grande responsabilidade. Para aprenderem a estar à altura existem cursos obrigatórios.
Publicado a
Atualizado a

Ainda nadam na piscina e os fatos de banho não são laranja e amarelos, mas, dentro de um mês, os 20 jovens que aqui treinam estarão aptos para vigiar as praias nacionais. Ao fim de duas semanas de aulas já aprenderam a fazer salvamentos e como atuar se a vítima estiver inconsciente. Além das provas físicas - que são exigentes, mas não impossíveis, garantem os responsáveis - os futuros nadadores-salvadores têm de passar ainda testes teóricos sobre suporte básico de vida e outras regras de atuação.

Estão a decorrer neste momento, por todo o país, os últimos cursos de nadadores-salvadores antes do arranque da época balnear. Há um ano que esta formação foi entregue a escolas privadas, ficando o Instituto dos Socorros a Náufragos (ISN) com a responsabilidade de certificar os formadores e avaliar e certificar os futuros nadadores-salvadores no final dos cursos. É também da sua responsabilidade aprovar o manual usado nos cursos. No prazo de um ano foram certificadas dez escolas privadas.

Na piscina do ginásio Mega Craque, em Telheiras, treinam os alunos da escola 4 Emes, uma das primeiras a ter certificação. "No ano passado, fizemos 32 ações, formando cerca de 640 nadadores-salvadores. Este ano está a correr dentro dos mesmos moldes, temos cerca de 20 ações já ministradas em todo o país", aponta António Coelho, coordenador de projetos de formação da 4 Emes.

Entre os 20 formandos que estão a fazer exercícios de aquecimento antes de entrarem na piscina contam-se apenas seis raparigas: "Esta continua a ser uma profissão mais masculina", refere António Coelho. Alguns dos candidatos têm já uma ligação à natação, outros têm "gosto por mar, praia e atividades em meio aquático".

Alguns, como Gonçalo Florindo, até já foram nadadores-salvadores e estão no curso para renovar a certificação - que tem a validade de três anos. "Exerci durante dois anos, depois fui ajudante, e agora vim porque acabou a licença, e como a minha namorada veio fazer o curso, aproveitei." Aos 27 anos e com um emprego fixo na hotelaria, Gonçalo não pensa exercer como nadador-salvador. "Não vou ter tempo, só se for como ajudante quando estiver na praia", conta.

Quem também não sabe se vai trabalhar a tempo inteiro é Francisco Fraga. O jovem "estava mesmo à espera de fazer 18 anos" para se inscrever no curso de nadador-salvador, mas ainda não sabe se vai ter disponibilidade para trabalhar os três meses de verão. Natural da Ericeira, o estudante que terminou o 12.º ano e quer entrar em Medicina tem vários amigos nadadores-salvadores e até a mãe já exerceu esta profissão, "há dez anos".

"Ser nadador-salvador é um objetivo desde sempre. Estar na praia é uma das coisas que me cativa, tal como ajudar as pessoas", descreve Francisco Fraga, numa breve pausa do treino. Recorda ainda quando fez o seu primeiro salvamento: "Era uma família que estava numa praia ao lado da Ericeira aflita na zona de rebentação. Fui ajudar os nadadores-salvadores e ainda tirei uma pessoa ao mar. Senti-me bem."

Na sua carreira de nadador-salvador, Gonçalo também já fez dois salvamentos, mas "nada de grave". Um foi em terra - "um jogador de voleibol embateu contra um idoso que ia a passar e este caiu e foi preciso ver se estava consciente e chamar o INEM" - e o outro foi no mar - "em Armação de Pera, uma pessoa ficou retida numa zona rochosa depois de a maré baixar e estava um bocadinho em pânico para sair de lá". São normalmente esses momentos que "marcam a vida de um nadador-salvador", sublinha António Ferreira, o formador desta turma, também nadador-salvador.

Para fazerem este trabalho que normalmente ocupa apenas os meses de verão, os salários são variados. "Depende dos concessionários. Há uns, no Algarve, que oferecem 1200 euros, mais alojamento e refeições", exemplifica António Coelho. No outro extremo estarão os "35 euros pagos por dia na Linha de Cascais, com um trabalho das 09.00 às 19.00 e com muita responsabilidade", acrescenta António Ferreira. Outro problema é o facto de este trabalho ser a recibos verdes.

A questão da postura profissional e da responsabilidade é uma das mais sublinhadas durante a formação. "Apesar das condições, tentamos mostrar-lhes como serem profissionais e a ter uma atitude profissional sempre", defende António Ferreira. Já que a maioria "é gente muito nova, com 18, 19, 20 anos, e temos de lhes mostrar que isto não é a brincar".

Durante o treino de duas horas de piscina - entre as 21.00 e as 23.00 -, a que já se tinham somado mais duas de aulas teóricas, os aspirantes a nadadores-salvadores não mostraram o menor sinal de distração. Sérios e concentrados fizeram piscinas vezes sem conta, num aquecimento que durou dez minutos, mergulharam ao estilo bomba, socorram vítimas conscientes e inconscientes, voltaram a nadar, percorrendo todas as pistas da piscina e de cada vez que saíam do outro lado da piscina tinham de fazer flexões, pranchas e outros exercícios. Em momento algum se ouviu uma queixa ou menor sinal de desconcentração.

António Ferreira garante que em duas semanas "já se vê uma evolução na capacidade física", mas a intensidade vai diminuir quando aprenderem o suporte básico de vida.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt