Sociedade
18 maio 2022 às 22h12

Dezenas de casos suspeitos lançam alerta sobre varíola-dos-macacos

DGS revelou a existência de 14 casos oficiais na zona de Lisboa, mas há mais suspeitos. Doença está a provocar surtos em países europeus. Não está relacionada com orientações sexuais.

Rui Frias

Catorze casos confirmados e, pelos menos, outros dois em análise com forte probabilidade de se tratarem também de infeções por varíola-dos-macacos, uma doença rara endémica de zonas selvagens de África que agora chega pela primeira vez a Portugal, numa altura em que têm sido também reportados surtos noutros países europeus, como Reino Unido e Espanha.

A revelação foi feita ontem ao início da noite através de comunicado da Direção-Geral da Saúde. Algumas horas antes a DGS tinha informado que "foram identificados, neste mês de maio, mais de 20 casos suspeitos de infeção pelo vírus Monkeypox [varíola-dos-macacos], todos na região de Lisboa e Vale do Tejo". Fonte hospitalar já tinha avançado à CNN Portugal que o Centro Hospitalar Lisboa Central (CHULC) tinha realizado análises aos vários casos suspeitos, que horas mais tarde foram confirmados pelo Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge (INSA) com a presença do vírus.

Apesar de, nos três países europeus em que foi detetada neste último mês, a doença ter sido diagnosticada sobretudo entre homens com relações homossexuais, esta não é uma doença relacionada com orientações sexuais, esclarece ao DN o infeciologista Jaime Nina, professor do Instituto de Higiene e Medicina Tropical.

Mas de que doença falamos, afinal? Descoberta em 1958 no Congo (onde em 1970 se registou o primeiro caso humano), a varíola-dos-macacos "entra numa família muito grande de vírus [Ortopoxvírus], conhecida há muito tempo, e da qual o mais conhecido é o vírus da varíola humana", conta o infeciologista. Ora, se a varíola humana foi "considerada erradicada em 1976", e as pessoas deixaram de ser vacinadas, reportando-se apenas "casos esporádicos", este vírus que agora chegou a Portugal também "não apresenta historial de transmissão comunitária", diz Jaime Nina.

DestaquedestaqueOs 14 doentes confirmados até agora são todos do sexo masculino, jovens, e estão estáveis, apresentando lesões ulcerativas.esquerda

Como vírus zoonótico que é, "a transmissão faz-se por contacto direto com um animal infetado [geralmente roedores ou macacos] ou então por contacto direto com pessoas que estiveram em contacto com um animal infetado", refere o especialista, sublinhando que os casos conhecidos até hoje "são esporádicos". De resto, sublinha, o R0 desta doença - número médio de contágios causado por cada pessoa infetada - "é inferior a um".

Os contágios, esclarece, acontecem sobretudo por "contacto direto de pele", através de lesões de pessoas infetadas ou fluidos corporais - daí poder ter sido espalhada por contacto sexual, mas não é provocada pelos hábitos sexuais. "[Os casos] foram identificados em contexto de atendimento numa clínica de doenças sexualmente transmissíveis porque apresentavam lesões genitais. É verdade que são casos de homens que têm sexo com homens, mas essa pode só ter sido a forma como foi dado o alerta. Não está descrita, classicamente, a via de transmissão sexual [como passível de causar esta infeção]", esclareceu ontem, também, Margarida Tavares, diretora do Programa Nacional para as Infeções Sexualmente Transmissíveis e VIH.

Os primeiros cinco doentes confirmados eram todos do sexo masculino, jovens, e estavam estáveis, apresentando lesões ulcerativas. Quanto aos restantes nove a DGS não divulgou informações.

"São situações muito ligeiras do ponto de vista clínico, embora ainda estejamos a acompanhar a evolução", apontou Margarida Tavares, dizendo que ainda não foi identificada a origem do surto, mas que, dos que se sabe, os doentes "não viajaram do continente africano", nem terão "relação com os casos reportados no Reino Unido" - onde o primeiro caso confirmado foi de um homem que viajou da Nigéria.

Para já, nenhum dos doentes estará internado e estão todos a ser acompanhados, desde casa, por médicos do Centro Hospitalar Lisboa Central. "É uma doença relativamente benigna para os seres humanos", diz Jaime Nina.

rui.frias@dn.pt