60 mil novos casos e 28 mil mortes por ano. Autoridades apelam a estilos de vida saudáveis

A doença oncológica continua a ser a principal causa de morte prematura. E é nesse sentido que vão ser lançados três novos rastreios, para tentar reduzir mortalidade.

Ana Mafalda Inácio
Rastreio do cancro da mama superou objetivos europeus. 98% das mulheres foram chamadas.© José Carmo Global Imagens

No Dia Mundial da Luta Contra o Cancro, que hoje se assinala, há uma mensagem prioritária das autoridades de saúde para a população: "É preciso apostar em estilos de vida saudáveis". O subdiretor-geral da Saúde, Rui Portugal, na cerimónia que ontem iniciou as celebrações sobre este dia, deixou um dado muito claro: "Os cerca de 60 mil novos casos de cancros que surgem anualmente em Portugal correspondem a cerca de dois terços dos nascimentos". Mas Rui Portugal foi mais longe e deu outra imagem ao sublinhar que os cerca de 60 mil novos casos correspondem "à dimensão da população dos concelhos de Portimão ou da Figueira da Foz".

Uma dimensão que, disse, tem significado, fazendo ainda um apelo à população para que "adote estilos de vida saudáveis". O argumento é igualmente forte: "A maior esperança de vida dos portugueses, a exposição a carcinogéneos e os estilos de vida menos saudáveis justificam o aumento progressivo do número de novos casos". Pelo que, defendeu, "conhecer, vigiar e intervir na doença oncológica é uma prioridade em saúde em Portugal". Até porque, "as doenças oncológicas são a principal causa de morte prematura no país e responsáveis por mais 100 mil anos de vida potencialmente perdidos".

De acordo com os dados referidos ontem pelo subdiretor-geral, todos os anos existem cerca de 28 mil mortes por doença oncológica. Um número para o qual Rui Portugal também fez questão de dar nova imagem: "É o equivalente [à população] do concelho de Santiago do Cacém, Anadia ou Tavira", enfatizando que o número de mortes é equivalente ao facto de estas populações poderem desaparecer todos os anos. E, assumiu, estes números e estas informações têm que preocupar a sociedade portuguesa e as autoridades de saúde". "Os anos de vida potencialmente perdidos por cancro são oito vezes mais do que os atribuídos à infeção por VIH e uma vez e meia mais do que os atribuídos por doenças cardiovasculares", acrescentou.

Por tudo isto, este ano, a Direção-Geral da Saúde reforçou a sua mensagem no sentido de que "o cumprimento do Plano Contra o Cancro exige uma aposta clara na prevenção". O objetivo "é reduzir a incidência de cancros potencialmente evitáveis, mas também reforçar as medidas de promoção da deteção e diagnóstico precoce", para o qual irá contribuir, acreditam, "a universalidade de acesso aos rastreios, derrubando barreiras e combatendo desigualdades".

Neste momento, existem três programas de rastreio no terreno - cancro da mama, colo do útero e colorretal -, mas vai começar a ser trabalhado um novo plano para mais três rastreios, como o DN noticiou ontem, dirigidos ao cancro da próstata, pulmão e gástrico.

O próprio ministro da Saúde, Manuel Pizarro, prometeu ontem, na sessão de inauguração das novas instalações do Centro da Mama do Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto, que Portugal irá "antecipar a meta europeia de rastreios de cancro". A meta aponta para que os três novos rastreios aos cancros da próstata, pulmão e gástrico comecem a ser realizados até 2025, mas Manuel Pizarro diz que, estes, deverão começar a ser feitos no nosso país durante 2024.

"O objetivo é avançar com projetos-piloto com acompanhamento técnico-científico particular. Não posso garantir que avancem este ano, mas entre este ano e o próximo, vamos antecipar-nos às metas europeias. Em Portugal, seguramente até final de 2024 estarão organizados", afirmou o governante.

Ao DN, o diretor do Programa Nacional para as Doenças Oncológicas, José Dinis, lembrou no dia anterior que, no último ano, Portugal conseguiu atingir os objetivos europeus no que toca aos rastreios implementados, mas ainda há um caminho a fazer para que estes cheguem a todos os utentes da mesma forma. E para isso é necessário uniformizar as regras, sobretudo no que toca aos rastreios do cancro do colo do útero e do colorretal. Mesmo assim, os dados provisórios de 2022 revelam ter havido, e em relação a 2019, "uma recuperação e expansão nos rastreios de base populacional (mama, colo do útero e colorretal), com um reforço muito expressivo no número de utentes convidados a participar nos programas de rastreio".

De acordo com os mesmos dados, em 2022, foram convidadas 773 360 mulheres a fazer rastreio do cancro da mama (mais do que em 2021, que foram 655 040), das quais 390 767 realizaram mamografia de rastreio, um acréscimo de 10% face a 2021 (mais 35 488 rastreios), tendo-se apurado uma taxa de adesão de 50,5%. Relativamente ao rastreio do cancro do útero, em 2022 foram convidadas 342 223 mulheres (255 772 em 2021), das quais 321 888 foram rastreadas, um aumento de 32,2% face a 2021 (mais 78 340 rastreios), o que reflete uma taxa de adesão ao rastreio de 94,1%.

Quanto ao rastreio do cancro do cólon e reto, em 2021 foram convidados 486 140 utentes (376 706 em 2021), dos quais 177 203 foram rastreados com pesquisa de sangue oculto nas fezes (PSOF). Neste caso particular regista-se uma quebra de 6,1%, com menos 11 519 rastreios realizados. A taxa de adesão a este rastreio é de 36,5%. Em relação à taxa de cobertura por ACeS nos três rastreios oncológicos, os dados indicam que já é de 100% em todo o país.

O subdiretor-geral da Saúde assumiu ainda ontem que "temos de ter orgulho" nas taxas de sobrevivência a cinco anos relativamente à doença oncológica da próstata, da mama, do cancro cervical e mesmo colo do útero que "foram melhores do que a média da União Europeia nos últimos relatórios".

Mas o caminho, como disse ao DN José Dinis, tem de ser o de se "acompanhar cada vez melhor os doentes oncológicos, diminuindo a mortalidade associada à doença e aumentando a qualidade de vida dos doentes e dos sobreviventes".

Por agora, fica também a mensagem do Governo que assumiu "estar profundamente comprometido com o investimento necessário para cumprir os objetivos preconizados na Estratégia Nacional de combate à doença oncológica, nomeadamente investindo em recursos humanos e respetiva formação, instalações e equipamento pesado, novos tratamentos e tecnologias de saúde inovadoras".

Em relação a 2022, fica também a marca como sendo o ano em que se registou o maior número de doentes oncológicos operados. Segundo a DGS, 64 030, mais 15 354 doentes (31,5%) face a 2019, ano pré-pandemia. Um resultado que foi obtido quando o SNS registou também o maior número de pessoas inscritas para cirurgia, 72 258 (em 2021, havia 66 744). Mas em relação ao número de consultas a tendência também é de crescimento: passaram de 527 820, em 2019, para 600 035 em 2021.

anamafaldainacio@dn.pt